Internacional
Expansão do Mercosul, crise no Equador e eleições: o agitado ano de 2024 na América Latina
Ao longo do ano, a região também chegou a registrar uma tentativa de golpe de Estado na Bolívia, quando militares ameaçaram invadir a sede do governo na praça Murillo, em La Paz. Especialistas analisam os principais acontecimentos no podcast Mundioka, da
Um ano de acontecimentos importantes na América Latina. Assim resume a cientista política, mestre em estudos latino-americanos e diretora-geral do Centro de Integração e Cooperação da Rússia e América Latina (CICRAL), Luiza Calvette, ao podcast Mundioka.
Ao todo ocorreram seis eleições presidenciais nos países e, entre as mais marcantes, a especialista cita o pleito no México, onde foi eleita a primeira mulher na história a ocupar o cargo: a presidente Claudia Sheinbaum.
"Também representou a continuidade do projeto do Morena [partido também do ex-presidente Andrés Manuel López Obrador], uma coisa bem atípica na história no México. Já no Uruguai, ocorreu a volta da Frente Ampla, com Yamandú Orsi, que é uma vitória muito importante para a região. E ainda houve a reeleição do presidente Nicolás Maduro [na Venezuela], apesar de várias tentativas de desestabilização, mas que foram vencidas. E também tivemos vitórias não tão boas, como em El Salvador, onde ganharam os aliados de Donald Trump [presidente eleito dos Estados Unidos]", pontua.
G20 no Brasil e defesa do mundo multipolar
Pela primeira vez na história, o Brasil também foi palco da Cúpula do G20, em novembro, no Rio de Janeiro, momento em que ocorreram avanços importantes, como a aprovação da declaração final, com um consenso que não havia ocorrido no evento do ano anterior, na Índia.
Entre os pontos estão o apoio à criação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, com a participação de mais de 80 países, além da taxação de grandes fortunas e a defesa do cessar-fogo na Faixa de Gaza.
"Eu acho também que foi muito importante o papel do Brasil este ano. O presidente Luiz Inácio da Lula da Silva alçou, de fato, o nosso país de novo no mundo, então acho que o G20 foi importante para isso, assim como vai ser com a Cúpula do BRICS do ano que vem. Também foi publicado pelo IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] que atingimos o menor índice de pobreza e miséria desde 2012, uma coisa que também é muito importante", explica.
Impactos do governo Milei na Argentina
Era dezembro de 2023 quando o então presidente eleito, Javier Milei, assumia a Casa Rosada, em meio às tensões e expectativas geradas pelas propostas apresentadas durante a campanha, como a total dolarização da economia e até o fechamento do Banco Central. Para a cientista política, o primeiro ano de mandato no país foi de "estrago" e intensas dificuldades.
"Primeiro porque metade da população na Argentina hoje vive na pobreza, com quase 20% na extrema pobreza […]. Mas o Milei também enfrenta dificuldades, inclusive para aprovar o novo pacote de política econômica, fora algumas privatizações que ficaram de fora, como a da empresa estatal de rádio e televisão, a dos correios, a das Aerolíneas Argentinas, o que também é fruto da mobilização da população nas ruas. Inclusive, o Milei ainda tenta se alçar como um símbolo da extrema-direita mundial. Ele segue com esse personagem extremista que se coloca como um outsider", pontua, ao lembrar ainda que a Argentina chegou a ser convidada para entrar no BRICS, mas por decisão de Milei houve recusa.
Conforme a especialista, a presença de Milei no país também traz muitas perdas, principalmente para a América do Sul, já que a Argentina é o segundo país mais importante da região.
"A Argentina tem um papel histórico na integração latino-americana. Mas, por outro lado, vejo que isso ainda não alcançou uma forma muito concreta, em termos de tarifas [de importação] ou até no rompimento de relações. Ainda tem ficado muito no âmbito provocativo […]. Acho que o Lula e o López Obrador conseguiram ignorar um pouco as provocações", diz.
Futuro governo Trump e tensões sob a América Latina
Apesar de ainda não ter assumido o poder, diversas falas do republicano Donald Trump já têm gerado tensões em toda a América Latina. Entre os exemplos estão as ameaças de tomar o controle do canal do Panamá e até de classificar como terroristas grupos de narcotráfico no México.
"De fato, desde antes de vencer as eleições, Trump já vinha fazendo uma série de provocações ao México. […] já ameaçou taxar em 25% os produtos do país e também do Canadá, enquanto a presidente Claudia Sheinbaum afirmou que responderia à mesma altura", afirma.
A especialista lembra que os EUA vivem um contexto de desindustrialização, aumento da inflação e condições de trabalho cada vez piores. Medidas como as anunciadas por Trump podem ser vistas pela população como uma resposta à crise interna. A expectativa para o ano também é de crescimento econômico de 2,8%, considerado pequeno para os padrões norte-americanos.
"Desde o primeiro mandato de Trump, os imigrantes também foram colocados como um grande bode expiatório. Mas acredito que todas essas provocações vêm muito para tentar tirar algum proveito das relações bilaterais a favor dos Estados Unidos."
Tentativas de golpe de Estado e desestabilização
Típicas ao longo dos últimos séculos na América Latina, tentativas de golpe de Estado na Colômbia e na Bolívia foram a contribuição de 2024 para esse histórico. A coordenadora da Pós-Graduação em Relações Internacionais da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP), Flavia Loss, acrescenta que, no caso boliviano, a situação sequer foi totalmente esclarecida, apesar de o presidente Luis Arce ter conseguido "se livrar" dos impactos.
"Soubemos depois pela imprensa que foram os militares [os responsáveis pela tentativa de golpe], mas ficou uma situação muito estranha. E na Bolívia segue essa divisão dentro do MAS [Movimento ao Socialismo], que é o partido do presidente, mas que foi na verdade fundado por Evo Morales. Os dois continuam disputando internamente dentro do partido, o que deixa uma situação bem delicada no país andino. Tivemos, inclusive, uma tentativa de assassinato do Evo Morales. Então foi um ano complicado para a Bolívia e que traz sombras do que será a próxima eleição presidencial", argumenta.
Apesar disso, o país também teve fatos a comemorar: após mais de dez anos, a Bolívia enfim conseguiu entrar oficialmente no Mercosul em 2024, o que deve trazer ganhos econômicos e maior integração do país na América do Sul.
Crise de segurança no Equador
Uma emissora de TV foi tomada por uma facção armada em Guayaquil, gerando terror nas ruas e explosão nos índices de criminalidade. A crise de segurança vivida no Equador atingiu o seu pior momento da história em 2024 e chegou a obrigar o presidente Daniel Noboa a decretar estado de calamidade. Para Loss, a situação ocorre por conta da consolidação do país como rota para o narcotráfico de toda a região, inclusive do México.
"Com isso, virou um hub logístico para a exportação de drogas para a Europa e os Estados Unidos, principalmente, e ainda há dificuldades do país de acabar com essa onda de violência", finaliza.
Por Sputinik Brasil
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