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Governo venezuelano promete resposta à petrolífera após anúncio de perfuração de poços no litoral de Essequibo

Região é palco de uma disputa secular entre Venezuela e Guiana; anúncio da empresa americana ExxonMobil ocorre após diminuição das tensões entre os dois países

Agência O Globo - 08/02/2024
Governo venezuelano promete resposta à petrolífera após anúncio de perfuração de poços no litoral de Essequibo
Governo venezuelano promete resposta à petrolífera após anúncio de perfuração de poços no litoral de Essequibo - Foto: Reprodução

O governo venezuelano prometeu na quarta-feira uma "resposta proporcional, enérgica e legal" caso seja iniciada a perfuração de poços de extração de petróleo junto ao litoral de Essequibo, região disputada há mais de um século com a Guiana. A declaração ocorre após o anúncio, na terça-feira, da petrolífera americana ExxonMobil de perfurar ainda este ano dois poços de exploratórios no local.

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"Se a ExxonMobil tiver uma empresa de segurança privada representada pelo Comando Sul e uma pequena filial no governo da Guiana, bom para eles, mas no espaço marítimo que pertence legitimamente à Venezuela, eles receberão uma resposta proporcional, enérgica e legal", escreveu o ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino, em sua conta no X (antigo Twitter).

Em uma entrevista coletiva na terça-feira, o presidente da ExxonMobil na Guiana, Alistair Routledge, anunciou que a petrolífera planeja perfurar dois poços exploratórios ainda este ano na costa de Essequibo. O anúncio ocorreu após a diminuição das tensões entre a Guiana e Venezuela, exacerbadas no fim do ano passado depois que Georgetown abriu uma licitação de poços petrolíferos na região.

"Essa transnacional energética não apenas sub-roga a soberania da Guiana, governa as altas autoridades desse país [...], mas também pretende proteger suas operações ilícitas em um mar pendente de delimitação sob o manto belicista dos Estados Unidos em cumplicidade com a Guiana", escreveu a vice-presidente venezuelana, Delcy Rodríguez, na quarta-feira.

Empresa 'está tranquila'

Na terça-feira, Routledge disse que a crise bilateral havia "deixado muita gente nervosa", mas enfatizou que a empresa "está tranquila", pois o contrato com a Guiana "é válido de acordo com as leis locais" e "internacionais". Ele também elogiou a "colaboração (...) com outros países na frente militar", um comentário que irritou Caracas.

A disputa secular sobre o Essequibo, que remonta ao século XIX, se intensificou em 2015, quando a Exxon Mobil encontrou depósitos de petróleo na costa da região, o que equivale a dois terços da Guiana. Mas, novos capítulos foram adicionados quando o presidente venezuelano, Nicolás Maduro, organizou um referendo consultivo em 3 de dezembro sobre a anexação do território, aprovado por mais de 95% da população.

O "sim" em massa apoiava a criação na região de uma província venezuelana, a "Guiana Essequiba", e a concessão da nacionalidade a seus habitantes — em meio à escalada da tensão, a Venezuela chegou a abrir um escritório do serviço de identificação e migração (Saime), em Tumeremo, na fronteira com Essequibo.

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Desde o início, a Guiana considerou a consulta uma "ameaça direta", e o presidente guianês, Irfaan Ali, chegou a levar a questão ao Conselho de Segurança da ONU, que terminou sem declaração final. Dias antes, a Guiana anunciou que estava em contato com "aliados" militares e deu sinal verde guianês para uma possível presença do Comando Sul dos Estados Unidos em seu país, ato classificado como "imprudente" pela Chancelaria da Venezuela.

O Brasil, que defende uma solução pacífica, também reforçou a presença militar na fronteira e intensificou seus contatos diplomáticos para mediar a disputa pela região, tentando exercer um papel de liderança regional.

Entenda a disputa

De um lado, a Guiana se atém ao Laudo Arbitral de Paris, de 1899, no qual foram estabelecidas as fronteiras atuais. Do outro, a Venezuela se apoia em sua interpretação do Acordo de Genebra, firmado em 1966 com o Reino Unido, antes da independência guianesa, em que Londres e Caracas concordam em estabelecer uma comissão mista "para buscar uma solução satisfatória", já que o governo venezuelano considerou o laudo de 1899 "nulo e vazio".

Sem solução, a questão foi parar nas mãos da CIJ em 2017, por definição do secretário-geral da ONU, António Guterres, que se valeu da prerrogativa estabelecida pelo próprio Acordo de Genebra no caso de as partes não chegarem a um entendimento.

A briga ganhou novos capítulos após descoberta, em 2015, de grandes reservas de petróleo na região. A Guiana iniciou licitações para explorar campos petrolíferos em águas rasas e profundas em 2022, o que Caracas rejeitou, considerando-as ilegais. (Com AFP.)