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O gol da lua

17/07/2016
O gol da lua

Praia bonita extensa, areia nivelada pela água que nem a praia da Avenida da Paz não existe, a areia dura se presta ao esporte mais amado no mundo, o futebol; a bola quica como se estivesse no gramado do Trapichão. Todo homem dessa cidade, quando jovem, jogou futebol nessa praia, antes de mergulhar na água límpida e tépida do mar da Avenida da Paz.

Nos anos 50/60 havia um “praieiro” organizado pelos Perrelli, filhos de italiano, moradores da Avenida. Fernando, Betinho e Rafael, preparavam com carinho as traves, a bola, os jogos de camisa, sempre azul e encarnado. O praieiro tornou-se famoso e disputado, conseguiram manter por mais de 20 anos a pelada dominical, fazia parte da cultura esportiva de Maceió. Muitas gerações fizeram filas para desfrutar uma vaga no jogo. Os irmãos, Júlio, Zeca e Henrique Normande, não perdiam um domingo; Zezé, barbeiro, ainda hoje corta cabelo na Barão de Penedo, outros mais jovens como Mano Gomes de Barros, Roberto Mendes, Lelé, foram peladeiros assíduos dos Perrelli.

Como a procura para uma vaga no praieiro dos Perrelli era grande, a turma mais jovem organizava um futebol de praia paralelo.

Nossa organização não era tão organizada, porém, durante as férias, todo o dia jogávamos, havia campeonatos semanais. Meninos, adolescentes, ficávamos com um olho na bola e outro nas meninas que apareciam a caminho do mar, bronzear-se, queimar as pernas, o corpo, tornar a pele amorenada, como o diabo e nós gostávamos.

Nada melhor depois de uma pelada de praia que tirar o suor num mergulho junto com a namorada. O mar da Avenida, tranquilo, pequenas ondas, água morna é apropriado para namoro. Na época da virgindade vigiada e defendida entre as moças casadoiras, a juventude apelava por soluções alternativas por baixo d’água.

Quando podíamos jogávamos futebol, iniciando com uma zorra, hoje chamada de linha de passe, pela manhã, pela tarde, às vezes pela noite, em nosso romantismo juvenil inventamos o Gol da Lua, nos dia de Lua Cheia, a pelada só acabava com o gol da Lua; o primeiro gol depois da Lua aparecer. Muito romântico, entretanto, durante o jogo as coisas não eram tão pacíficas, a porrada comia, depois do jogo fazíamos as pazes.

Certa vez eu jogava no time com os irmãos, Fernando e Cacá, alagoanos, moravam no Rio. No jogo final do campeonato semanal, faltava um minuto, 1 x 1, o placar; quem ganhasse seria campeão da semana. Mário, um santo amigo, era o grande goleiro do time adversário, pegava tudo, contudo, quando o chamavam de “Mário Doido”, enlouquecia, brigava na hora. No último minuto dei um passe maravilhoso a Fernando, fez o gol. Muita comemoração, a euforia da vitória é inebriante, abraços e gritos, é campeão! é campeão. O goleiro Mário ficou estatelado no chão, Fernando ao passar pelo amigo deitado, tocou-lhe a cabeça e gozou: “Mário Doido, frangueiro”. Nosso valoroso goleiro levantou-se vermelho gritando, “Vou matá-lo!”. Arrancou uma trave, e, com a parte pontiaguda para frente, lançou como de fosse um campeão de arremesso de dardo, em direção a Fernando. O caibro pontiagudo passou zunindo entre os dois irmãos. Fincou-se na areia 10 metros depois. Quase que o Brasil perde um grande Almirante da Marinha (Fernando) ou um de seus maiores cineastas (Cacá).

Assim eram os praieiros dos jovens adolescentes, os abraços, as brigas, o romantismo no tempo do Gol da Lua.