Vida e Saúde

Cientistas estimulam as 'usinas de energia' das células a queimarem mais calorias

Descobertas podem abrir caminho para novos tratamentos contra a obesidade e melhorar a saúde metabólica

Agência O Globo - 25/12/2025
Cientistas estimulam as 'usinas de energia' das células a queimarem mais calorias
Imagem ilustrativa gerada por inteligência artificial - Foto: Nano Banana (Google Imagen)

Pesquisadores desenvolveram medicamentos experimentais capazes de estimular as mitocôndrias das células a trabalharem mais e queimarem mais calorias. As descobertas abrem perspectivas para novos tratamentos contra a obesidade e para a melhora da saúde metabólica.

A obesidade é considerada uma epidemia global e fator de risco para diversas doenças, como diabetes e câncer. Os medicamentos atualmente disponíveis para o tratamento da obesidade costumam exigir injeções e podem causar efeitos colaterais. Por isso, encontrar uma forma segura de potencializar a perda de peso pode trazer benefícios significativos à saúde pública.

A equipe de pesquisa, liderada pelo professor associado Tristan Rawling, da Universidade de Tecnologia de Sydney (UTS), na Austrália, em parceria com a Universidade Memorial de Terra Nova, no Canadá, concentrou-se nos chamados "desacopladores mitocondriais". Essas moléculas induzem as células a queimarem energia de forma menos eficiente, liberando parte do combustível como calor, em vez de convertê-lo totalmente em energia utilizável pelo organismo.

"As mitocôndrias são frequentemente chamadas de usinas de energia das células, pois transformam os alimentos ingeridos em energia química, conhecida como ATP (adenosina trifosfato). Os desacopladores mitocondriais interrompem esse processo, levando as células a consumir mais gorduras para suprir suas necessidades energéticas", explicou Rawling em comunicado. "É como uma barragem hidrelétrica: normalmente, a água passa pelas turbinas para gerar eletricidade. Os desacopladores funcionam como um vazamento na barragem, permitindo que parte da energia escape em forma de calor, em vez de ser convertida em energia útil."

Compostos capazes de induzir o desacoplamento mitocondrial são conhecidos há cerca de um século, mas os primeiros medicamentos do tipo eram altamente tóxicos, causando superaquecimento e até morte.

"Durante a Primeira Guerra Mundial, trabalhadores de uma fábrica de munições na França perderam peso, apresentaram febre alta e alguns morreram. Posteriormente, descobriu-se que o responsável era um produto químico utilizado na fábrica, o 2,4-dinitrofenol (DNP)", conta Rawling. "O DNP interrompe a produção de energia mitocondrial e acelera o metabolismo. Chegou a ser comercializado nos anos 1930 como um dos primeiros remédios para emagrecimento, mas foi proibido devido à sua toxicidade: a dose eficaz e a dose letal estavam perigosamente próximas."

No novo estudo, publicado na revista científica Chemical Science, os pesquisadores criaram desacopladores mitocondriais "leves", mais seguros, ajustando com precisão a estrutura química das moléculas experimentais. Isso permitiu controlar a intensidade do aumento do uso de energia celular.

Alguns dos medicamentos experimentais conseguiram aumentar a atividade mitocondrial sem prejudicar as células ou comprometer a produção de ATP, enquanto outros ainda provocaram o mesmo desacoplamento arriscado dos compostos antigos e tóxicos.

Essas descobertas ajudaram os cientistas a compreender por que as moléculas mais seguras se comportam de maneira diferente. Os desacopladores mitocondriais leves reduzem o processo a um nível tolerável para as células, protegendo contra efeitos adversos.

Outra vantagem desses compostos é a redução do estresse oxidativo nas células, o que pode melhorar a saúde metabólica, proporcionar efeitos antienvelhecimento e oferecer proteção contra doenças neurodegenerativas, como a demência.

Embora a pesquisa ainda esteja em estágio inicial, o estudo oferece uma base promissora para o desenvolvimento de uma nova geração de medicamentos capazes de induzir um desacoplamento mitocondrial leve e aproveitar os benefícios sem os riscos associados aos compostos mais antigos.