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Nas árvores de Natal do Rio, o trabalho não para, mas a ceia está garantida

São 16 trabalhadores escalados para virar a meia-noite a postos nas atrações flutuantes da Lagoa e de Botafogo

Agência O Globo - 24/12/2025
Nas árvores de Natal do Rio, o trabalho não para, mas a ceia está garantida
Imagem ilustrativa gerada por inteligência artificial - Foto: Nano Banana (Google Imagen)

A cena é um clássico natalino: famílias e amigos reunidos perto de árvores decoradas com pisca-piscas, bolinhas coloridas e o que mais o gosto do anfitrião pedir. Mas em dois cartões-postais do Rio, as comemorações que se iniciam hoje à noite vão transgredir o comum. A ceia será, literalmente, dentro das árvores de Natal, no caso, as gigantes cenográficas que, até o Dia de Reis (6 de janeiro), iluminarão a paisagem da Enseada de Botafogo e da Lagoa Rodrigo de Freitas, na Zona Sul da cidade. Ao todo, entre técnicos de iluminação, seguranças e brigadistas, 16 trabalhadores estão escalados para virar a meia-noite a postos nas duas atrações exaustivamente admiradas e fotografadas por cariocas e turistas. Será uma celebração longe de casa, no entanto, com comes e bebes garantidos.

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Sem álcool qualquer

Em Botafogo, no interior da estrutura de 80 metros de altura, o equivalente a um prédio de 30 andares, e decorada com dois milhões de lâmpadas de LED, serão dez pessoas. Ali, a mesa será posta mais cedo do que o normal, às 19h30 deste dia 24. No cardápio tem peru, presunto e arroz de amêndoas.

Na Lagoa, por sua vez, seis profissionais cuidarão esta noite de manter o brilho da belezura de 60 metros de altura e 20 quilômetros de lâmpadas de LED. Nela, o jantar será servido às 22h, e o menu incluirá sucos naturais de manga e goiaba, arroz, farofa, salada de batata com ovos, chester fatiado ao molho de ervas, frutas e rabanadas.

Para as duas turmas, no entanto, o protocolo impede bebida alcoólica. Então, não vai ter vinho e nem sequer uma cervejinha.

— Nunca na minha profissão imaginaria passar o Natal à deriva numa árvore — diz Sérgio da Silva, de 45 anos, técnico eletricista na grandona da Lagoa, ao revelar que, quando chegar em casa, dará continuidade às celebrações. — Faço questão de fazer uma ceia completa no fim da madrugada, em casa com a família. Vamos ter frango, peru, frutas e rabanadas.

Até o sol nascer

Para ele e para a maioria dos que baterão ponto nas duas concorridas árvores de Natal do Rio, a hora de ir embora será à 1h de amanhã, pouco depois de as luzes serem apagadas — o que, em ambos os casos, acontece à meia-noite. Mas os símbolos natalinos precisam da atenção de brigadistas de incêndio 24 horas por dia, em turnos de 12 horas. E, pelas escalas, para esses profissionais, a comemoração mais íntima, com parentes e amigos, só será possível após o amanhecer.

— Meu turno vai terminar às 8h do dia de Natal. A gente se sacrifica, mas a emoção das pessoas ao apreciar a árvore é gratificante todos os dias — diz o brigadista e salva-vidas civil Igor Magalhães, de 38 anos. — Quando eu chegar em casa, no Méier, na Zona Norte, só minha esposa estará acordada. Às 9h, claro, vou tomar o café da manhã. Mas minha ceia em família, na realidade, será no almoço — continua ele, que estará de plantão na estrutura da Lagoa.

Na de Botafogo, frequentemente boa parte da equipe — que conta ainda com um 11º integrante, um barqueiro que transporta os colegas nas idas e vindas do continente — passa o Natal em compromissos profissionais. Nunca nenhum deles, porém, tinha vivido essa experiência dentro de um ícone natalino.

— Quem trabalha com eventos corporativos se acostuma. Mas a rotina em uma árvore de Natal é completamente diferente, um pouco mágico até, porque causa admiração nas pessoas — conta o produtor técnico Fabiano Bastos, que já sabe que deve encontrar a esposa dormindo quando chegar ao Cachambi, na Zona Norte, onde mora, mas tem certeza de que terá um panetone e duas rabanadas a sua espera na mesa de jantar.

No grupo, outro veterano em ficar distante da família é o diretor técnico Rodrigo Rodrigues, de 47 anos. No réveillon, por exemplo, ele trabalha desde 2008 em Copacabana. Mas estar em serviço no Natal é uma novidade para ele.

— Uma das coisas que me motiva é o orgulho que tenho do projeto, que acompanho desde que a estrutura começou a ser montada, em Niterói — conta Rodrigues.

Uma prece a Noel

A mesma satisfação é demonstrada pelo eletricista Márcio Roger, de 43 anos, também do grupo de Botafogo. Ele admite que vai sentir saudades da mãe, dos três irmãos e da filha de 12 anos, que geralmente ceiam juntos na casa da família, em Irajá. Ele quer falar com todos quando o relógio marcar meia-noite. E se pode fazer um pedido ao Papai Noel hoje, é para que nada o atrapalhe nesse momento que espera ser de muita emoção.

— Tomara que as redes telefônicas não estejam congestionadas, como é comum nas noites de Natal e Ano Novo. O que compensa um pouco é que esse trabalho ajuda a alegrar as pessoas — diz ele.

Já o calouro da turma da enseada é o técnico Junio Vital, de 35 anos, que pela primeira vez não estará entre os seus numa data tão importante. O novato, contudo, tratou de montar uma estratégia para logo festejar o Natal com seus parentes. Ele já decidiu ir e voltar do trabalho de moto, para chegar mais rapidamente à casa da sogra, em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, após a jornada na Zona Sul.

— A família gosta de festa. Estarão todos despertos. Se bobear, vamos celebrar o Natal até a madrugada do dia 26 — brinca ele.

Um presente no fim

Na árvore da Lagoa, o técnico eletricista Sérgio da Silva não tem moto nem carro. E acredita que deve levar pelo menos duas horas para chegar em casa quando deixar o trabalho. Ele mora na comunidade da Grota, no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio. A distância de sua casa para a Lagoa nem é o problema: são só 18 quilômetros. A questão é a previsão de que enfrentará dificuldades com o transporte na hora em que todos estiverem comemorando. A sorte é que, no fim, ele terá um presente a seu aguardo: os abraços da família.

— A corrida (de carro de aplicativo) não vai ficar por menos de R$ 95 a R$ 100. Além da dificuldade de encontrar motoristas que estejam trabalhando na madrugada do Natal, nem todo mundo aceita a corrida, porque moro na Grota. Mas a família vai estar toda me esperando — afirma ele.