Poder e Governo

Planalto recomenda veto a trecho que reativa R$ 1,9 bi em emendas, apesar de acordo de governistas

Artigo polêmico foi incluído pelo relator Aguinaldo Ribeiro no projeto que reduz renúncias fiscais em 10%

Agência O Globo - 22/12/2025
Planalto recomenda veto a trecho que reativa R$ 1,9 bi em emendas, apesar de acordo de governistas

Mesmo com a participação de governistas no acordo que "ressuscitou" R$ 1,9 bilhão em emendas parlamentares, o Palácio do Planalto vai recomendar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que vete o trecho da lei aprovada na semana passada pelo Congresso.

O artigo em questão foi incluído pelo relator na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), no projeto do governo que prevê a redução de 10% nas renúncias fiscais. Por não ter relação direta com a proposta original, o dispositivo foi classificado como "jabuti". Técnicos do Senado estimam que, por meio dessa manobra, seria possível reaver R$ 1,9 bilhão em emendas parlamentares não pagas entre 2019 e 2023, inclusive aquelas já canceladas.

Segundo Ribeiro, a inclusão do artigo atendeu a um pedido do Executivo, com o objetivo de preservar restos a pagar, especialmente de obras em andamento ou paralisadas. "Eu atendi a uma demanda do governo que foi pedida ao Congresso ao inserir esse dispositivo, para não se perder esse espaço orçamentário", afirmou o relator.

No Senado, o texto teve como relator o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), que também manteve o dispositivo. Apesar disso, o Planalto tenta se desvincular do acordo. Como se trata de matéria tributária, Lula terá de sancionar ou vetar o projeto ainda em 2025.

Este episódio não é inédito: na semana passada, houve atrito entre a presidente do PT, Gleisi Hoffmann, e o ministro Jaques Wagner em razão da dosimetria das emendas, evidenciando as divergências internas sobre o tema.

Para o ministro do STF Flávio Dino, o "jabuti" busca reabrir espaço para a execução de recursos do antigo orçamento secreto, já considerado inconstitucional pela Corte por falta de transparência e critérios objetivos. Entre parlamentares, a decisão de Dino foi recebida com surpresa e interpretada como um movimento que contraria articulações do próprio Executivo.

Em decisão liminar, Dino sustentou que restos a pagar regularmente cancelados deixam de existir juridicamente, e sua revalidação equivale, na prática, à criação de nova autorização de gasto sem respaldo em lei orçamentária vigente.

Dino também apontou possível vício formal de iniciativa, já que o dispositivo trata de execução orçamentária e gestão financeira, matérias cuja iniciativa cabe ao chefe do Poder Executivo. O ministro destacou ainda que o STF conduz um plano de trabalho para corrigir distorções herdadas do orçamento secreto, sem previsão para a "ressuscitação" de restos a pagar, o que evidencia o descompasso do projeto com parâmetros pactuados entre os três Poderes.

A decisão de Dino é mais um capítulo do embate entre STF e Congresso, que se arrasta há pelo menos dois anos, envolvendo o controle do Orçamento da União. Além de declarar o orçamento secreto inconstitucional, a Corte tem exigido mais transparência e intensificado a fiscalização sobre as emendas parlamentares, inclusive com autorização de operações da Polícia Federal (PF).