Cidades

Quilombolas de Olho d’Água das Flores temem perda de terras com avanço do Canal do Sertão

Redação 22/08/2025
Quilombolas de Olho d’Água das Flores temem perda de terras com avanço do Canal do Sertão

A comunidade quilombola Guarani, em Olho d’Água das Flores, no Médio Sertão de Alagoas, vive um clima de apreensão diante da possibilidade de o Canal do Sertão atravessar seu território. A preocupação foi destacada durante visita da Fiscalização Preventiva Integrada (FPI) do Rio São Francisco à comunidade, realizada na última segunda-feira (18).

Moradores relataram que funcionários de uma empresa informaram sobre a possível passagem da obra pela área do quilombo, levantando o temor de desapropriações e perdas de moradias sem garantias de indenização. Eles também cobram o direito à consulta prévia, livre e informada — previsto na Constituição e em tratados internacionais — que até agora não foi respeitado.

A insegurança fundiária se soma a outras dificuldades históricas. O abastecimento de água é irregular, deixando famílias sem acesso no período de estiagem. Na saúde, o atendimento é limitado a poucos dias da semana no posto do Povoado Pedrão, com serviços odontológicos e exames ainda mais restritos. Em caso de falta de medicamentos, os moradores precisam buscar remédios na sede do município.

Para o procurador da República Eliabe Soares, do Ministério Público Federal em Alagoas, os relatos ouvidos pela FPI são fundamentais para subsidiar medidas de proteção aos direitos das comunidades tradicionais. Já a coordenadora da Rede Mulheres de Comunidades Tradicionais, Elis Lopes, ressalta que a ausência de regularização fundiária fragiliza o território e estimula a migração dos homens para outras regiões em busca de trabalho.

Composta por 65 famílias, a comunidade Guarani sobrevive principalmente da agricultura de subsistência, com destaque para o cultivo de milho e feijão. As mulheres complementam a renda com a produção de bolos artesanais, enquanto os homens frequentemente deixam a região em busca de emprego temporário no Sul e Sudeste do país. Além das lutas por terra, água e serviços básicos, os moradores preservam sua identidade cultural, com iniciativas como a retomada do Samba de Quilombo.

Certificada pela Fundação Cultural Palmares desde 2009, a comunidade tem imóveis rurais inscritos no Cadastro Ambiental Rural (CAR). Em Olho d’Água das Flores, vivem atualmente 197 famílias quilombolas inscritas no Cadastro Único, sendo 133 beneficiárias do Bolsa Família. Além do quilombo Guarani, o município também abriga o quilombo Gameleiro.