Política

Quem é o advogado do Rumble que conversou com Bolsonaro sobre ações contra Moraes

21/08/2025
Quem é o advogado do Rumble que conversou com Bolsonaro sobre ações contra Moraes
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) - Foto: © AP Photo / Ettore Chiereguini

A investigação da Polícia Federal que indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) por coação no curso do processo identificou diálogos entre o ex-presidente e o advogado americano Emiliano Martin de Luca, que representa as empresas Rumble e Trump Media em uma queixa civil na Justiça Federal da Flórida contra o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).

Segundo as mensagens interceptadas pela PF, Martin de Luca enviou a Bolsonaro uma cópia de uma peça do processo movido contra o magistrado. Além disso, o ex-presidente pediu ajuda ao advogado sobre como se posicionar após a imposição de tarifa de 50% a produtos brasileiros pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

Martin de Luca é bacharel em Belas Artes, Ciências Políticas e Estudos do Leste Europeu pela Universidade Rutgers, de Nova Jersey. Formou-se em Direito em 2010 na Universidade Fordham, de Nova York. O defensor é sócio do escritório Boies Schiller Flexner, especializado em litígios internacionais e em clientes de alto padrão.

Nos Estados Unidos, o curso de Direito é uma pós-graduação e exige do estudante um bacharelado anterior. Embora seja chamado de "juris doctor", o curso não é equivalente ao doutorado brasileiro.

De Luca representa as empresas Rumble e Trump Media contra Alexandre de Moraes, acusado de violação às leis americanas sobre liberdade de expressão. Os autores pedem que a Justiça dos Estados Unidos reconheça como inexequíveis as ordens do ministro para a remoção de conteúdo e de contas na plataforma de vídeos Rumble.

A Rumble funciona de modo parecido ao YouTube e surgiu com a proposta de ser "imune à cultura do cancelamento". A rede passou a abrigar produtores de conteúdo restritos em outras plataformas, como os comentaristas Paulo Figueiredo, Rodrigo Constantino e Bruno Aiub, conhecido como Monark. O site descumpriu determinações da Justiça brasileira e não indicou um representante legal no País. Por essas razões, foi proibido de atuar em território nacional.

A Polícia Federal identificou diálogos entre Martin de Luca e Jair Bolsonaro. Em 13 de julho, Bolsonaro enviou a De Luca uma publicação no X (antigo Twitter) em que se posicionou sobre o anúncio das tarifas adicionais a produtos brasileiros. Depois, o defensor e o ex-presidente trocaram mensagens sobre publicações jornalísticas.

Durante a conversa, De Luca disse a Bolsonaro que recebeu mensagens de veículos de mídia dos Estados Unidos interessados em um posicionamento do ex-presidente sobre a crise do tarifaço.

Em 14 de julho, o ex-presidente pediu orientações ao advogado sobre comunicações futuras. "Me orienta uma nota pequena da tua parte, que eu possa fazer aqui, botar nas minhas mídias, pra chegar a vocês de volta aí. Obrigado aí. Valeu, Martin", disse Bolsonaro. Em resposta, Martin prometeu ajudá-lo. Bolsonaro replicou dizendo que o defensor poderia lhe ligar "quando desejar".

Ainda em 14 de julho, De Luca enviou a Bolsonaro uma peça do processo movido contra Alexandre de Moraes na Justiça dos Estados Unidos. Trata-se do aditamento realizado pela Trump Media naquele mesmo dia. Na petição, a empresa ligada ao presidente americano e detentora da rede social Truth Social apresentou novos argumentos à Justiça americana.

Para a Polícia Federal, o encaminhamento da petição a Bolsonaro naquele mesmo dia evidencia um desvio de finalidade do processo contra Moraes na Justiça americana. Segundo o inquérito, há evidências de desvio da "real finalidade das pretensões deduzidas pela empresa (Rumble) em face de litigância contra ministro do Supremo Tribunal Federal".

O Estadão já havia mostrado que as empresas Rumble e Trump Media peticionaram contra Moraes em datas coincidentes à ação penal por tentativa de golpe, relatada pelo magistrado. Além de 14 de julho, houve petições coincidentes a outros dois marcos da ação penal da trama golpista. Martin de Luca negou o espelhamento de datas. "Não houve nenhuma coincidência - o calendário foi planejado inteiramente por Alexandre de Moraes. A Rumble não escolheu o momento nem o motivo pelo qual recebeu ordens judiciais ilegais em fevereiro", disse De Luca.

Em 15 de julho, Bolsonaro e De Luca conversaram em uma chamada de voz de cerca de nove minutos. A conversa foi intercalada por mensagens com reportagens sobre a possível sanção a Alexandre de Moraes por meio da Lei Magnitsky. O ministro veio a ser sancionado com a norma no dia 30 daquele mês.

O ex-presidente seguiu em contato com o advogado estrangeiro no dia 16. Na sexta-feira, 18, Bolsonaro foi alvo de operação da Polícia Federal e foi submetido a cinco medidas cautelares. O descumprimento reiterado das medidas levou Moraes a decretar sua prisão domiciliar em 4 de agosto.

Para a Polícia Federal, os diálogos mostram que Bolsonaro comportou-se "de forma subordinada às pretensões de grupo estrangeiro, com a finalidade de obter o apoio a pretensões pessoais, no sentido de implementar ações criminosas de coação a membros da Suprema Corte".

"A adesão subjetiva por interesses comuns entre os investigados se materializa nas ações de ataques ao Poder Judiciário brasileiro, evidenciado pelo desvio de finalidade da pretensão formulada em ação judicial no exterior, bem como no prévio ajuste de conteúdos a serem publicados em redes sociais contra membros do STF", observam os investigadores.

Em nota, o defensor afirmou que as conversas interceptadas são "correspondências profissionais rotineiras" e não comprovam uma "subordinação estrangeira" de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos. "Como advogado americano, presto regularmente orientação jurídica e de comunicação. Esse é o meu trabalho. Oferecer sugestões sobre a redação de uma breve nota pública ou encaminhar um documento judicial público é absolutamente comum. Ainda assim, esses atos rotineiros agora são distorcidos e apresentados como teorias conspiratórias", afirmou o advogado. "Continuarei realizando meu trabalho de forma transparente e profissional, sem medo."