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HQ canadense que concorre ao Prêmio Eisner, 'Roaming' tem romance queer entre garotas e viagem a Nova York

Recém-lançada 'Roaming' acompanha três jovens em cinco dias de férias na Big Apple

Agência O Globo - 24/07/2024
HQ canadense que concorre ao Prêmio Eisner, 'Roaming' tem romance queer entre garotas e viagem a Nova York

Como a cantora nova-iorquina Cindy Lauper costuma cantar desde 1983, as garotas só querem se divertir. Principalmente em Nova York. No quadrinho “Roaming”, recém-lançado no Brasil pela editora nVersos, as três jovens protagonistas da história viajam de férias à cidade americana e, entre passeios ao Museu de História Natural, ao Central Park e à pista de patinação do Rockefeller Center, descobrem não só o lugar, mas também a si mesmas, com direito até a um relacionamento amoroso entre duas delas, tão fugaz quanto a própria viagem.

Produzido a quatro mãos pelas primas Mariko e Jillian Tamaki, respectivamente escritora e ilustradora da HQ, “Roaming” concorre em três categorias — “Melhor novo álbum”, “Melhor roteirista” e “Melhor desenhista/arte-finalista” — do Prêmio Eisner, cujos vencedores serão anunciados no próximo fim de semana, na San Diego Comic Con, nos Estados Unidos.

—Fiz uma viagem parecida com a das meninas da história — diz Jillian, de 44 anos, por email. — Conheci uma amiga que trouxe outra e pegamos um trem do Canadá durante a “reading week” (semana de pausa nas aulas para ler; ou passear, como se vê). Mesmo que os eventos com as personagens sejam fictícios, a premissa foi inspirada em minhas primeiras viagens, lá pelos 20 anos. Viajar para qualquer lugar com amigos é uma experiência muito específica, não precisa ser para Nova York. Lembro-me de algumas e percebo agora o quão perto estivemos da calamidade. Em muitos aspectos, éramos bastante ingênuos, mas também extremamente abertos a novas experiências. Parece fácil quando você é jovem.

Mariko não pensa diferente e diz que fez muitas viagens aventurescas a Nova York com amigos ao longo dos anos:

— Cada viagem tem sua própria história, única.

Tão única como a vivida pelas personagens Dani, Zoe e Fiona nos cinco dias de viagem pela Big Apple em “Roaming”, mais uma vez em um lilás apaixonante, como em outro quadrinho da dupla: “Aquele verão” (Mino). Mas Jillian diz que a semelhança é uma mera coincidência.

— Eu meio que odeio fazer quadrinhos coloridos, então isso ainda depende da arte linear preta — explica a ilustradora canadense, de Ottawa. —Tanto o roxo azulado quanto o castanho em “Roaming” parecem bastante neutros para mim. Essas duas cores acabam sendo mais úteis para ajudar a articular cenas complexas da cidade (como a Times Square à noite), humores e atmosfera.

Segundo ela, houve, obviamente, muita pesquisa com YouTube, Flickr, Google Street View etc. para ilustrar o quadrinho:

— Mas eu não queria trabalhar muito com referências, pois qual seria a intenção de desenhar? Você poderia simplesmente replicar uma fotografia. Então, tive que recorrer às minhas memórias da cidade, onde morei por dez anos.

Parceria só à distância

Jillian diz que ela e Mariko viveram em muitas cidades ao longo dos anos. E que o processo de trabalho das duas evoluiu bastante durante esse percurso:

— Nunca moramos na mesma cidade ao mesmo tempo. Então, todo o nosso trabalho é feito por email ou telefone.

— Somos muito prolíficas por email! — garante a também canadense Mariko, de Toronto. — Isso significa que, quando nos encontramos pessoalmente, podemos simplesmente relaxar.

As primas são conhecidas pelo trabalho em dupla extremamente tocante na questão dos relacionamentos queer, mas isso não quer dizer que cada uma não produza histórias de forma individual com o mesmo resultado.

Enquanto Jillian já publicou livros como “Boundless” e “Supermutant magic academy” (ambos inéditos no Brasil), Mariko escreveu o romance infantojuvenil “Cold: a novel” (também nunca publicado aqui) e o quadrinho “Laura Dean vive terminando comigo” (Intrínseca), com arte de Rosemary Valero-O’Connell. O tema deste gibi, de fundamental importância a ser discutido, é o relacionamento tóxico entre duas jovens. Ainda assim, o livro foi banido de algumas escolas americanas desde sua publicação original, em 2019.

— É difícil reagir a essas coisas de uma forma que não seja pessoal — responde Mariko, de 48 anos. — Parece pessoal, e me afeta diretamente ver essas histórias tratadas como “inapropriadas”, em vez de refletirem a realidade dos adolescentes queer. Tento focar mais nas histórias e menos nas proibições.

Mariko também consegue levar a pauta feminina até o mainstream dos quadrinhos, escrevendo histórias para personagens como Mulher-Hulk, Supergirl e Mulher-Maravilha:

— Esses trabalhos são uma oportunidade de me divertir com os brinquedos de alguém, no parquinho alheio. É como voltar a brincar de faz de conta quando você era criança. Mas com brinquedos muito caros.