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Copacabana, louras e poltergeists: saiba o que tem no documentário sobre Fausto Fawcett, o criador da Kátia Flávia
Aos 67 anos, o poeta, performer, escritor e pioneiro rapper brasileiro chega aos cinemas em filme que investigou sua vida e seu processo criativo, com direito a inexplicáveis manifestações da natureza durante as filmagens de seus depoimentos

Não faltam acontecimentos inexplicáveis na produção de “Fausto Fawcett na cabeça”, documentário do diretor Victor Lopes sobre a vida e a obra de Fausto Borel Cardoso, de 67 anos, um carioca que, lá se vão quatro décadas, pegou emprestado, para a sua alcunha artística, o sobrenome de uma bem conhecida estrela loura do cinema americano.
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Logo no início das filmagens do doc sobre o poeta, performer, escritor e pioneiro rapper brasileiro (acidentalmente, com o sucesso em 1987 de “Kátia Flávia, a Godiva do Irajá”), a primeira vítima dos poderes sobrenaturais do autor do livro (e estrela do show) “Santa Clara Poltergeist” foi Deborah Colker — a consagrada coreógrafa, que no começo dos anos 1990 foi, segundo Fausto, “o coração dançante do ‘Básico Instinto’”, seu “teatro de revista samba-funk” que conquistou o público com um time de louras dançarinas.
Logo após registrar seu depoimento, Deborah sofreu um apagão. Acordou meia hora depois, tendo dirigido até quase o Leme, sem lembranças de como chegou lá.
— Essa mistura que o Fausto faz, filosófica e religiosa, apocalíptica e dançante, tem um sentido intenso, e foi o que levou a gente a ter afinidade. Foi essa intensidade, essa paixão que entra por um fluxo qualquer e que se transforma em movimento e palavra — disse Deborah, emocionada, após enfim assistir a “Fausto Fawcett na cabeça” (que chega aos cinemas esta quinta-feira), em uma sessão com amigos do homenageado, como os guitarristas dado Villa-Lobos e Carlos Laufer e a cantora Fernanda Abreu — Só eu mesma pra topar um “Básico Instinto”! Houve vários questionamentos na época, do tipo “você não pode fazer isso, é um show erótico, uma putaria!” Mas tínhamos que fazer, era um “não” à hipocrisia.
Outro poltergeist verificado durante as filmagens, quem denuncia é o próprio Victor Lopes. Decidido a registrar Fausto e convidados em ambientes do habitat e grande inspirador do artista — o bairro de Copacabana —, ele os levou, em 2021, ao canteiro de obras do (até hoje inconcluso) Museu da Imagem e do Som. Emanações de frequentadores da antiga boate Help, demolida para dar lugar ao museu, se fizeram presentes, segundo ele.
— A gente tinha horário para acabar. E aí me deram dez minutos para subir no terraço. Foi só a gente montar a cena que estouraram um monte de trovões atrás do Fausto, durante os dez minutos, sem cair um pingo d’água sequer. Esse é o nosso bruxo! — brinca Victor, diretor do premiado doc “Língua, vidas em português” que conheceu Fausto nos anos 1980 numa performance em Copacabana e, anos depois, dirigiu um média-metragem com roteiro dele, “Vênus de fogo”, peça de prevenção à Aids direcionada a profissionais do sexo.
A sessão do filme, às dez da manhã de uma segunda-feira, não deixou de ser um sacrifício para os notívagos — caso de Fernanda Abreu e do próprio Fawcett.
— Ah, mas não há nada que uma hora de sono não resolva! — gracejava Fausto, ainda não muito à vontade em ver-se na tela, como objeto de um documentário (que já circulou por festivais e foi premiado no Fest Aruanda como melhor filme pelo júri oficial na mostra competitiva nacional de longas-metragens).
Para o artista, existe “um lance interessante em que você vê e diz ‘caramba, fiz umas coisas ali, né?’”, algo que lhe deu uma perspectiva.
— Agora, quanto a participar do filme, era como se eu estivesse com o Victor fazendo uma um espetáculo, montando um show. Não tive distanciamento, só envolvimento, nem chegava a pensar nisso — conta. — Até porque o que eu queria fazer com o Roberto (Berliner, da TV Zero, produtor de “Fausto Fawcett na cabeça”) era um média-metragem que se chamaria “Copacabana Hong Kong”, com vários personagens e os meus textos. Eu não estaria ali. O que aconteceu é que entrei no meio dos textos e do imaginário escaneado e projetado pelo Victor.
Transcendências
Com o propósito de “entrar na cabeça de Fausto”, Victor Lopes escreveu todo um roteiro antes de iniciar as filmagens. Uma das ideias, que o diretor realizou no subterrâneo de um shopping em Copacabana, foi a de fazê-lo reproduzir o altar de colagens que serve de ponto de partida para os seus projetos artísticos. Entre fotos de Copacabana e de Farrah Fawcett (“o estopim de tudo”), Fausto saiu falando, de improviso, por 90 minutos.
— Só aquilo já dava um filme! — acredita Victor.
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Nessa parte do filme, o artista deixa explícita a sua ligação com o transcendente ao contar sobre as idas com a família, quando criança, a um terreiro de macumba em Nilópolis, e sobre o quanto aquilo mudou a sua vida e, mais tarde, orientou a sua criação.
— Aquilo serviu de portal para uma visão de mundo no que diz respeito a você vislumbrar o mundano, o meramente humano, e vislumbrar uma coisa que é maior, que é cósmica — diz Fausto. — Se bem que, falando assim, fica tudo ridiculamente autoajuda. Mas é que, quando você fala de misticismo, de religião, vem logo uma picaretagem, está tudo tão mundano e mercantil que ninguém escapa disso, nem as religiões. Tem aí uma vastidão de acontecimentos que, para mim, não têm nada de fofo ou de New Age. O Cosmos é uma é uma besta-fera, é caos consignado mesmo. São os sacrifícios, as loucuras dos eremitas, das santas e dos santos... é muito mais um filme de John Carpenter do que o anseio pela paz interior.
‘Entrando um pouco no coração’
Victor Lopes tem certeza de que, ao entrar na cabeça de Fausto Fawcett, ele também acabou “entrando um pouco no coração”. Um dos parceiros mais constantes de Fausto, o guitarrista Carlos Laufer (que ele conheceu em 1981, num curso do grupo teatral Asdrúbal Trouxe o Trombone) disse ter descoberto neste “filme íntimo” coisas sobre o amigo que ele jamais soubera.
— O Fausto sempre foi muito reservado em relação à vida pessoal, sempre teve esse escudo, que foi furado pelo filme — confirma Fernanda Abreu, que ficou amiga de Fausto em 1982 e que o imortalizaria dez anos depois, ao gravar “Rio 40 graus”. —Quando acabou a Blitz, ele me falou: “Agora a gente pode trabalhar juntos!” Aí fizemos vários shows, e eu participei do primeiro álbum dos Robôs Efêmeros cantando “Juliette”. O Fausto é um grande comunicador, que mistura tradição e pop com ironia e bom humor, um cara único na cultura brasileira.
Para Victor Lopes, o essencial em “Fausto Fawcett na cabeça” foi retratar a atemporalidade da obra do amigo:
— Em “Silvia Pfeifer” (faixa de encerramento do LP “Império dos Sentidos”, de 1989), o Fausto fala de shows de realidade patrocinada. Ou seja: ele cunhou o termo reality shows muito antes de ele aparecer!
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Já o artista (que neste 2024, depois de 31 anos, voltou ao álbum com a adaptação musical do livro “Favelost” — a qual, por sinal, vai virar o próximo longa de Victor), este diz não haver nada de profecia ou misticismo na sua arte.
— Na verdade, como diz o pessoal da moda, são tendências (risos), tendências que vão se acirrando e vão acontecendo. São tendências que eu gosto de observar. Eu jogo minhas fichas nesse pôquer e, quando vejo, é “puta merda, tô ficando meio rico!”
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