Política
Em áudio, Bolsonaro sugere falar com chefe da Receita e de órgão sobre investigação do caso da rachadinha de Flávio
Alexandre de Moraes, do STF, derrubou o sigilo relativo a gravação; ex-presidente nega qualquer irregularidade

Em áudio de uma reunião com o ex-diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem (PL), no qual se discute o caso de "rachadinha" envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), junto advogadas do parlamentar, o ex-presidente Jair Bolsonaro sugere falar com o então secretário da Receita, José Tostes, e o então chefe do Serpro (estatal de processamento de dados do governo).
A conversa cita Canuto, que provavelmente é Gustavo Canuto, ex-ministro de Bolsonaro e que foi transferido para a Dataprev, também estatal de processamento de dados. O ex-presidente Bolsonaro vem negando qualquer irregularidade.
A gravação — cujo sigilo foi derrubado nesta segunda-feira pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF) — faz parte do inquérito que investiga o uso da Abin para espionagem ilegal de desafetos de Bolsonaro.
— É o caso de conversar com o chefe da Receita — afirmou Bolsonaro.
A advogada Luciana pires, então, afirma:
— Olha, em tese, com um clique você consegue saber se um funcionário da Receita [inaudível] esses acessos lá — disse.
A fala é um alerta de que a informação poderia ficar gravada no sistema.
Em seguida, o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno diz:
— Tentar alertar ele que ele tem que manter esse troço fechadíssimo. Pegar de gente de confiança dele. Se vazar [inaudível].
No decorrer do diálogo, Bolsonaro questiona as advogadas:
— A quem interessa pra gente resolver esse assunto?
Juliana Bierrenbach diz acreditar que o melhor caminho é o Serpro. Bolsonaro responde:
— Eu falo com o Canuto.
Abin, Itamaraty e mais: Polícia Federal aponta uso de máquina estatal em benefício de Bolsonaro e aliados
Ramagem reitera:
— Fala com o Canuto pra saber do Serpro. Fala com o Canuto pra saber do Serpro, tá?
Veja a transcrição da conversa, segundo a PF
JAIR BOLSONARO: É o caso de conversar com o chefe da Receita. Ele tá pedindo é um favor.
LUCIANA PIRES (advogada): Não é favor não, presidente.
JAIR BOLSONARO: Ninguém tá pedindo favor aqui. [inaudível] é o caso conversar com o chefe da Receita. O Tostes.
LUCIANA PIRES: E não, não tem chance dele, sai disso aqui não, né [inaudível]?
JULIANA BIERRENBACH (advogada): Não.
JULIANA BIERRENBACH: Não, o Tostes não.
ALEXANDRE RAMAGEM: [inaudível] é o secretário da receita. É o zero dois, não é isso?
AUGUSTO HELENO Não. O zero um.
JAIR BOLSONARO: É o zero um dos caras. Era ministro meu e foi pra lá. Sem problema nenhum. Sem problema nenhum conversar com ele. Vai ter problema nenhum conversar com o Canuto.
LUCIANA PIRES: Serpro?
LUCIANA PIRES: Então ótimo.
JAIR BOLSONARO: Eu caso conversar com o Canuto?
LUCIANA PIRES: Sim, sim.
LUCIANA PIRES: Com um clique.
LUCIANA PIRES: Olha, em tese, com um clique você consegue saber se um funcionário da Receita [inaudível] esses acessos lá.
AUGUSTO HELENO: Tentar alertar ele que, ele tem que manter esse troço fechadíssimo. Pegar de gente de confiança dele. Se vazar [inaudível].
JAIR BOLSONARO: Tá certo. E, deixar bem claro, a gente nunca sabe se alguém tá gravando alguma coisa. Que não estamos procurando favorecimento de ninguém.
O que dizem os citados
Gustavo Canuto, disse que nunca foi procurado para tratar do assunto.
—Eu não fui procurado, em nenhum momento. Eu ouvi aqui os áudios, ouvi a citação, mas em nenhum momento ninguém me procurou por isso, não — afirmou. — Não tenho muito o que falar. O fato é que a Dataprev não tinha relação nenhuma com a Receita. Quem cuida dos dados da Receita é o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), por isso acho que houve alguma confusão — completou.
A advogada Luciana Pires disse em nota que sua atuação no episódio se deu "de forma técnica e nos estritos limites do campo jurídico". "Protocolamos a petição mencionada nos diálogos formalmente, nos órgãos competentes, com vista a obter informações acerca do acesso ilícito aos dados pessoais do Senador Flávio Bolsonaro e, diante do seu indeferimento, impetramos um habeas data, que era o remédio processual adequado àquela ocasião, o qual hoje se encontra sob recurso. Foi, portanto, uma reunião de cunho profissional na qual agi de acordo com as normas que regem a minha profissão", afirmou.
O GSI disse que não vai se manifestar.
O áudio
O ministro do STF Alexandre de Moraes retirou o sigilo do áudio da conversa entre Jair Bolsonaro e Alexandre Ramagem (PL-RJ) em que discutem uma estratégia sobre a defesa de Flávio Bolsonaro no caso das rachadinhas, junto com advogadas do senador.
O áudio foi apreendido no computador de Ramagem e diz respeito a uma gravação captada em uma reunião realizada no Palácio do Planalto, em 25 de agosto de 2020, segundo a Polícia Federal. O material tem 1 hora e oito minutos de duração.
Na ocasião, apontam os investigadores, foram discutidas supostas irregularidades cometidas por auditores da Receita Federal na elaboração de um relatório de inteligência fiscal que originou o inquérito contra Flávio Bolsonaro no caso das “rachadinhas”.
A existência da gravação veio à tona na última quinta-feira, quando uma nova fase da operação "Última Milha" foi realizada pela PF.
Investigação sobre rachadinha
O Ministério Público do Rio denunciou à Justiça, em outubro de 2020, o senador Flávio Bolsonaro, o ex-assessor dele Fabrício Queiroz e mais 15 investigados pelos crimes de organização criminosa, peculato, lavagem de dinheiro e apropriação indébita no esquema da "rachadinha", na época em que Flávio Bolsonaro era deputado estadual no Rio. O senador nega que tenha cometido os crimes.
A rachadinha é uma prática em que um parlamentar recolhe parte do salário dos funcionários dos seus gabinetes.
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