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Shakira: Águas passadas que não ajudam a mover o moinho do pop
Em seu primeiro álbum em sete anos, 'Las mujeres ya no lloran', cantora constrói sua legitimidade na exposição brutal de sentimentos, esfumaçando as barreiras entre arte e vida, mas abdica de trazer novidades musicais

Lágrimas são diamantes, diz Shakira, sem rodeios, na capa de seu álbum “Las mujeres ya no lloran”, lançado esta sexta-feira, quase sete anos após o anterior, “El Dorado”. O mundo inteiro sabe o que aconteceu nesse meio tempo entre discos: a colombiana sofreu horrores com o bem documentado revés da traição e da separação do marido, o jogador espanhol Gerard Piqué. Lançada ano passado, uma das suas canções de retribuição, “Shakira: Bzrp Music Sessions, Vol. 53”, com o DJ argentino Bizarrap, dominou o streaming e bateu o recorde de número de visualizações no YouTube para uma música latino-americana, com versos como “você trocou um Rolex por um Casio”.
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Com oito faixas inéditas e sete lançadas como singles nos últimos meses, desde 2022, o álbum se apresenta como um documento de todo o processo de queda, dor e superação de Shakira – um daqueles que constroem sua legitimidade na exposição brutal de sentimentos, esfumaçando as barreiras entre arte e vida, poesia e diário. Um disco todo em espanhol, de uma das artistas que mais ajudaram a levar o pop latino-americano para além das suas fronteiras, mas que deixa um tanto a desejar no que as colegas mais têm se esforçado para entregar: novidades musicais.
“Las mujeres ya no lloran” abre com a parte inédita. Em “Punteria”, um house-funk alegre e elegante com Cardi B, a cantora dá sinais de recuperação (“você tem boa mira / sabe como me fazer durar, esses idiotas ficam sem bateria”), mas deixa suas fragilidades à mostra em “La fuerte”, com Bizarrap (“guardei beijos para depois, fiquei com vontade / estaria mentindo para você se dissesse que ver minhas fotos com você não me machuca”). Há uma intensidade doída no rock “Tiempo sin verte” (“sempre acreditei que você fosse meu amigo / agora eu não sei, sinto que você nunca foi”) e, novamente, alegria em “Cohete”, com Rauw Alejandro (“farei você voar como um foguete”).
Shakira deita e rola na sofrência raiz com embalo norteño de “(Entre paréntesis)”, dividida com o Grupo Frontera (“antes você vinha sem ligar / agora, sem avisar, você se vai”) e segue na fossa em ritmo de rock no “Cómo dónde y quando” (“não sobrou ninguém honesto / só os bêbados nos bares”). Depois, mergulha as pontas dos pés nos afrobeats de “Nassau” (“eu, que prometi nunca mais amar / e aí você apareceu para curar as feridas que aquele outro deixou”) e cai de cabeça no baladismo pianístico de “Última”, a gota d’água do disco, um vale de lágrimas (“você queria sair e eu, ficar com você em casa / você queria comer o mundo e eu só queria ter você”).
O restante do disco é história já contada – e, assim como nas inéditas, com incursões sem muito brilho por fórmulas musicais já bem conhecidas. O reggaeton, por exemplo, manda em “Te felicito” (“te parabenizo, você finge muito bem / não tenho dúvidas sobre isso / continue com seu papel / esse show combina bem com você”), no “TQG” com Karol G (“você está procurando comida lá fora / e eu dizendo que era monotonia”) e no “Copa vacía” com Manuel Turizo (“há um tempo estou com sede de você, não sei por que / fico querendo mais e querendo beber de um copo vazio”).
Ainda tem mais pop norteño em “El Jefe”, com o cantor Fuerza Regida, na base das histórias de injustiças (“tenho um chefe de merda que não me paga bem / chego a pé e ele, em uma Mercedes-Benz”) e um tanto de bachata em “Monotonía, um pote (justificavelmente) até aqui de mágoa na letra dividida com Ozuna (“de repente você não era o mesmo / você me deixou por causa do seu narcisismo”). E, como não poderia deixar de ser, um pouco mais balada, no “Acróstico”, canto de superação com os filhos Milán e Sasha (“você tem que rir da vida / mesmo que as feridas doam”).
O “Shakira: Bzrp Music Sessions, Vol. 53” que começou tudo, em ritmo de house, é claro, está de volta em “Las mujeres ya no lloran” — na versão original e num remix de Tiësto. Precisar, não precisava. Resta agora confiar na promessa de que “Última” será, de fato, a derradeira canção sobre o seu calvário – e que, o enterro de toda tristeza, volte a Shakira amiga da inovação musical. Porque águas passadas não movem os moinhos do pop.
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