Esportes
Como cada Copa do tetra explica a importância de Zagallo para o futebol
Do jogador taticamente completo de 1958 e 1962 ao mentor carismático de 1994, cada conquista ajuda a entender o papel do Velho Lobo

A vida de Zagallo, que nos deixou na noite de sexta-feira, foi cercada por números. O 13, da sua superstição mais conhecida; o quatro, referente às Copas do Mundo vencidas; além dos anos destas conquistas (1958, 1962, 1970 e 1994). Só para ficar nos mais famosos. Ainda assim, não é possível mensurar através deles seu tamanho no futebol.
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De fato, o que mais se aproxima disso é o de taças mundiais conquistadas como jogador, técnico e coordenador. O Velho Lobo também fez história pelos clubes em que jogou e dirigiu. Foi campeão por Flamengo, Botafogo, Fluminense, Vasco e Bangu. Mas é inegável que a primeira associação que seu nome gera no imaginário popular é com a seleção brasileira.
Zagallo é a maior personificação da “Amarelinha” vencedora. Por ter feito parte da equipe que foi bicampeã seguida na Suécia-58 e no Chile-62. Pela forma como fez o time encantar no México-70. E como fiel escudeiro de Parreira no comando do time do tetra nos EUA-94.
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Ganhou outros títulos, perdeu alguns (quem não se lembra do vice-campeonato na França-98?). Comprou briga com Romário quando entendeu que ele se considerava acima da seleção. E com a imprensa quando esta deixou de acreditar no potencial de sua equipe. “Vocês vão ter que me engolir!” desabafou aos céticos. Assim como o aviãozinho, em resposta à provocação semelhante dos sul-africanos num amistoso em 1996.
Não era a si mesmo que ele defendia. Mas a seleção. Uma paixão que contagiou jogadores, torcedores e fez o mundo respeitá-la. Não há legado maior.
1958 - 'Em todos os lugares ao mesmo tempo'
Ao falar sobre o Zagallo de 1958 é inevitável pensar que o Velho Lobo poderia atuar em qualquer time de 2024. Só que na época o apelido era Formiguinha, o que diz sobre suas funções em campo. Enquanto Pelé, Garrincha, Didi e Vavá chamavam atenção pelo futebol mais vistoso, o então ponta-esquerda do Flamengo se destacava pela obediência tática e o senso de posicionamento. Se Pelé pôde infernizar as zagas adversárias, foi porque seu companheiro de lado fazia a recomposição defensiva. Foi ele quem salvou, em cima da linha, um gol quase certo da Suécia na decisão. E foi também quem marcou o quarto do Brasil e deu o passe para o camisa 10 fechar a goleada.
“De Zagallo diremos apenas o seguinte: estava em todos os lugares ao mesmo tempo. De certa feita, foi até interessante. Zagallo salva um gol, sai com uma bola e, em seguida, aparecia lá na frente, lá na área adversária, desintegrando a defesa inimiga”, resumiu Nelson Rodrigues em crônica para a Manchete Esportiva.
O irônico é que ele quase não foi à Suécia. Conquistou a vaga ao brilhar nos últimos amistosos, desbancando favoritos. E só foi titular porque Pepe lesionou o tornozelo direito antes da estreia.
1962 - O auge do Formiguinha
A Copa do Chile, em 1962, representou uma continuação do que já havia dado certo quatro anos antes. O técnico não era o mesmo (Aymoré Moreira assumiu no lugar de Vicente Feola), mas os destaques da primeira conquista estavam lá. E Zagallo, apesar da importância em 1958, se viu às voltas com situação semelhante antes da estreia. Ele levava a pior na disputa com Pepe pela vaga na ponta esquerda. Até que o favorito torceu o joelho e não conseguiu estar 100% recuperado fisicamente para iniciar o torneio.
Melhor para a seleção, que viu um Zagallo ainda mais exuberante em sua dedicação para defender, sair com a bola, distribuir o jogo e finalizar. Seguro do que fazer e entrosado com os companheiros, o Formiguinha foi mais protagonista do que na Suécia. Marcou o primeiro gol do Brasil no Chile, de cabeça, após levantamento de Pelé. Foi dele ainda o cruzamento para Amarildo empatar com a Espanha. E, de trivela, bateu os escanteios para os gols de cabeça de Garrincha contra Inglaterra (jogo da foto) e Chile. Neste último jogo, ainda cruzou para Vavá marcar de cabeça o quarto gol da vitória por 4 a 2 e selar a vaga à final contra os tchecos.
1970 - O comandante da seleção arte
Foi às pressas. Faltando 77 dias para a Copa do México, Zagallo foi convidado a assumir o comando após a saída de João Saldanha, demitido por não aceitar as interferências do governo militar na seleção. Mas, quando o Mundial começou, parecia que sempre deveria ter sido ele o técnico. Quando se dizia que o Brasil tinha um problema com cinco camisas 10 (Pelé, Gerson, Rivelino, Tostão e Jairzinho), o Velho Lobo mostrou que aquilo era uma solução.
Fez os craques jogarem em funções diferentes das que cumpriam em seus clubes. Com Tostão (e, às vezes, Pelé), surpreendeu os adversários através da figura do “falso 9”. Jairzinho, centroavante no Botafogo, virou o Furacão da Copa como ponta-direita. Rivelino, meia clássico no Corinthians, assumiu a esquerda. Só Gerson não mudou tanto em relação a como atuava no São Paulo. Isso só para citar as inovações que envolviam os homens de frente. Resultado: um time campeão invicto, eleito por diversas publicações como melhor de todos os tempos e chamado de “a seleção mais maravilhosa que já existiu” por Pep Guardiola, técnico do Manchester City e considerado o maior nome da função na atualidade.
1994 - Uma nova faceta vem à tona
A Copa dos EUA apresentou um Zagallo diferente. Depois do jogador discreto mas de futebol tecnicamente completo e do treinador que sabia como pôr todos os craques em campo sem prejuízo tático, foi a vez de assumir o papel de mentor. Desde 1991, era coordenador técnico de Carlos Alberto Parreira, que em 1970 trabalhou na preparação física da seleção. O novo papel lhe dava menos responsabilidades que nos anos anteriores, mas marcou o início da mudança de sua relação com o público. Um profissional mais frio deu lugar a um homem que sabia se comunicar melhor do que nunca com jogadores e torcida (não que isso fosse uma deficiência antes).
Zagallo soube usar essa capacidade para motivar atletas e aproximar os brasileiros da seleção. Seu lado frasista ganhou mais evidência, e ele se tornou de vez uma figura carismática. Mas obviamente sua importância não se resumiu a isso. O próprio Parreira sempre fez questão de deixar claro que havia uma forte troca de opiniões entre os dois em relação à convocações, esquemas e criação de jogadas. O Velho Lobo ainda tinha muito conhecimento técnico e tático para dar.
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