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Quem é Irfaan Ali, presidente da Guiana que trava embate com a Venezuela pelo território de Essequibo

Descrito como 'carismático e popular' pela imprensa local, político costuma aparecer ao lado da população pela 'defesa da soberania' do país

Agência O Globo - 08/12/2023
Quem é Irfaan Ali, presidente da Guiana que trava embate com a Venezuela pelo território de Essequibo
Quem é Irfaan Ali, presidente da Guiana - Foto: Reprodução

“Orgulhoso marido de Arya Ali, pai grato de Zayd e do bebê Ilan, e honrado em servir como presidente da linda Guiana.” É assim que Mohamed Irfaan Ali, de 43 anos, costuma se descrever nas redes sociais. Eleito em agosto de 2020, ele é o nono político a ocupar o posto no país, que abriga o território de Essequibo, reivindicado pela Venezuela. Enquanto lida com as tensões políticas crescentes com o vizinho, Ali costuma aparecer ao lado da população pela “defesa da soberania”.

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Em 24 de novembro, ele divulgou que teve “a honra de passar a noite com os soldados na fronteira” e que estava “orgulhoso dos homens e mulheres fardados”. Nos comentários, os elogios da população são um indício do que já foi veiculado pela imprensa local, que o retrata como “carismático e popular”. Conforme pesquisa de opinião conduzida pela Associação de Professores da América do Norte e Caribe (Nacta) e divulgada em fevereiro, a taxa de aprovação de Ali seria de 80% na base de seu partido, o Popular Progressista, e de 60% nacionalmente.

Nascido em Leonora, um vilarejo dentro de uma das ilhas que são parte do território guianense, Ali é descendente de uma família muçulmana com ascendência indiana. Doutor em planejamento urbano, foi membro da Assembleia Nacional da Guiana entre 2006 e 2015 e ministro da Indústria do Turismo e Comércio. Ele também já foi ministro de Habitação e Água, quando implementou a campanha de concessão de terras mais extensa da História do país, apoiada pela distribuição de lotes para cidadãos de todas as classes e regiões.

Na Assembleia Nacional, Ali foi um dos principais porta-vozes de economia e finanças. Ele atuou como presidente do Comitê de Contas Públicas e como copresidente do Comitê de Serviços Econômicos do Parlamento da Guiana. O atual presidente ainda trabalhou como coordenador no Banco de Desenvolvimento do Caribe. Em sua biografia, disponível no site do governo, é ressaltado que “Ali é um dos dois filhos de seus pais, ambos educadores”, e que é “casado e pai de família”.

Entenda a disputa

A disputa territorial pelo Essequibo, pertencente à Guiana, remonta ao século XIX. De um lado, a Guiana se atém a um laudo arbitral de 1899, no qual foram estabelecidas as fronteiras atuais. Do outro, a Venezuela usa sua interpretação do Acordo de Genebra, firmado em 1966 com o Reino Unido, antes da independência da Guiana. Na época, Londres e Caracas concordaram em estabelecer uma comissão mista “para buscar uma solução satisfatória”, já que o governo venezuelano havia considerado o laudo de 1899 “nulo e vazio”.

Ainda que a Venezuela tivesse reivindicado a soberania sobre o território quando a Guiana ainda era uma colônia britânica, porém, a escalada de interesse aumentou com a descoberta de grandes reservas de petróleo na região em 2015. Sem solução, a questão foi parar nas mãos da Corte Internacional de Justiça (CIJ) em 2018, por definição do secretário-geral da ONU, António Guterres, que se valeu da prerrogativa estabelecida pelo próprio Acordo no caso de as partes não chegarem a um entendimento. Ainda não há previsão para uma decisão final da Corte.

Em meio ao embate, a Venezuela chegou a convocar um referendo para reforçar a reivindicação. Segundo dados do Conselho Nacional Eleitoral (CNE), mais de 95% dos 10,4 milhões de eleitores (o equivalente a metade dos 20,7 milhões habilitados a votar) que participaram da consulta aprovaram a criação de um estado venezuelano chamado Guiana Essequiba. Outra proposta aprovada foi a concessão de cidadania venezuelana aos 125 mil habitantes da região.

No dia da votação, Ali afirmou que seu país não tinha “nada a temer”. Em transmissão ao vivo nas redes sociais, ele disse que as autoridades trabalhavam “incansavelmente” para garantir que as fronteiras permanecessem “intactas”.

‘Disputa ameaça a paz’

O Conselho de Segurança da ONU convocou uma reunião urgente para esta sexta-feira sobre a rápida escalada da disputa que a Guiana disse “ameaçar a paz e a segurança internacionais.” Nesta quinta-feira, após a cúpula presidencial do Mercosul e países associados, lideranças emitiram um comunicado em que expressaram a “profunda preocupação com a elevação das tensões” entre as duas nações e alertaram sobre “ações unilaterais que devem ser evitadas”.

Os Estados Unidos, por meio do porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, John Kirby, solicitaram que as partes encontrem uma solução diplomática para a questão, indicando que não querem “ver isso se transformar em confronto”. No entanto, Washington provocou uma resposta irritada de Caracas ao anunciar, por meio da embaixada em Georgetown, a realização nesta quinta de “operações conjuntas de voo dentro da Guiana” como parte do “engajamento e operações de rotina para aprimorar a parceria de segurança”.

“Essa infeliz provocação dos Estados Unidos é outro passo na direção errada”, escreveu o Ministro da Defesa venezuelano, Vladimir Padrino López, no X (antigo Twitter). “Não seremos desviados de nossas futuras ações para a recuperação de Essequibo”, continuou. (Com AFP)