Internacional

Quem é Hezbollah, grupo libanês acusado de financiar combatentes no Brasil

Apoiado pelo Irã, grupo elogiou ataque terrorista organizado pelo Hamas contra Israel e afirma que está na guerra desde o dia 8 de outubro

Agência O Globo - 09/11/2023
Quem é Hezbollah, grupo libanês acusado de financiar combatentes no Brasil

A Operação Trapiche, deflagrada pela Polícia Federal nesta quarta-feira, prendeu dois homens e cumpriu 11 mandados de busca e apreensão em São Paulo, Minas Gerais e Distrito Federal. Outras duas pessoas com cidadania líbano-brasileira também são alvos da operação nesta quinta-feira, mas estão fora do Brasil. Segundo as investigações, os suspeitos seriam financiados e teriam sido aliciados pelo grupo xiita libanês Hezbollah que planejava promover atentados contra prédios da comunidade judaica e israelense no Brasil, inclusive sinagogas. Mas, afinal, o que é o Hezbollah?

Entenda a Guerra: saiba mais sobre grupos como Hamas, Hezbollah, Fatah e locais como Gaza, Cisjordânia e Jerusalém

Impactos do conflito: Antissemitismo cresce na Europa com escalada da guerra entre Israel e Hamas

O Hezbollah é uma força poderosa no Líbano e a maior milícia do país. Além do braço armado, o grupo xiita libanês está decisivamente inserido na sociedade: seus membros são libaneses, atua como partido político (embora tenha pedido maioria no Parlamento no ano passado), mantém escolas, hospitais e rede de TV. Opera ainda uma grande rede de serviços sociais, o que fortalece sua base de apoio, enquanto o país enfrenta a pior crise econômica das últimas décadas.

Foi formado em 1982 por muçulmanos xiitas do Líbano em reação à ocupação israelense do sul do país e recebe apoio do Irã. O movimento foi inspirado pela Revolução Islâmica de 1979 no Irã, de maioria xiita, e o grupo, até certo ponto, tornou-se uma força de representação da elite da Guarda Revolucionária do Irã. No Líbano, xiitas e sunitas representam, cada um, cerca de 30% da população. O grupo paramilitar também tem laços estreitos com o partido cristão fundado pelo ex-presidente Michel Aoun.

Antes do início da guerra civil na Síria em 2011, o Hezbollah se promovia como uma força dedicada a combater Israel e defender os oprimidos, independentemente de sua origem. Mas, desde que se envolveu no conflito sírio, em 2013, oferecendo apoio ao presidente sírio Bashar al-Assad contra rebeldes sunitas, passou a ser visto por muitos muçulmanos sunitas como um grupo xiita que cumpre as ordens do Irã na região.

Mossad: saiba como atua a agência israelense que ajudou na prisão de grupo ligado ao Hezbollah no Brasil

O Hezbollah é considerado um grupo terrorista por israelenses, americanos e sauditas. Lutou, com o apoio do Irã, na Síria, contra o Estado Islâmico e a al-Qaeda, para defender o regime do aliado al-Assad. Em 2006, o grupo enfrentou Israel em um conflito que se estendeu por 33 dias. O confronto de grande escala, não teve vencedores, mas o Líbano foi arrasado.

Na guerra Israel-Hamas, que eclodiu no dia 7 de outubro após o ataque terrorista contra o Estado judeu, o grupo afirma que está atuante desde o dia 8 de outubro, quando abriu um front no sul do Líbano. As forças israelenses, no norte do seu território, e a organização paramilitar trocam disparos diariamente desde então.

Qual o tamanho da força bélica do Hezbollah?

O Irã fornece ao Hezbollah "a maior parte de seu financiamento, treinamento, armas e explosivos, bem como ajuda política, diplomática, monetária e organizacional", de acordo com o Departamento de Estado dos EUA. Ainda segundo os EUA, o grupo obtém financiamento de fontes legais e ilegais, incluindo "contrabando de mercadorias, falsificação de passaportes, tráfico de narcóticos, lavagem de dinheiro e fraudes com cartões de crédito, imigração e bancos".

Os EUA estimam que centenas de milhões de dólares em dinheiro e armamentos tenham sido destinados ao grupo nos últimos anos. Além de ter mantido grande parte do arsenal usado na Guerra Civil Libanesa (1975-1990), o Hezbollah se orgulha das suas dezenas de milhares de foguetes de precisão, que, segundo o grupo, têm capacidade de atingir todo o território de Israel.

Escalada do conflito: Incursão de Israel na Cisjordânia deixa oito palestinos mortos, elevando para 173 o total desde 7 de outubro

Diferentemente do Hamas, que nos anos 1990 usava maciçamente a estratégia de atentados terroristas suicidas, o Hezbollah abandonou a tática na mesma década, optando por investir em uma milícia treinada e muito bem armada. Por isso, sua força bélica é ainda mais preocupante para Israel. Atualmente, acredita-se que o grupo armado possui cerca de 100 mil mísseis.

O poderio militar do grupo cresceu ainda mais a partir de 2012, quando juntou-se ao presidente sírio para combater os rebeldes do país, em sua maioria sunitas. Em uma entrevista em 2021, o líder do grupo, Sayyed Hassan Nasrallah, afirmou que o braço armado do Hezbollah tem cerca de 100 mil combatentes.

O Brasil na guerra Israel-Hamas

O surgimento de suspeitos financiados pelo Hezbollah no país suscita receio na população, principalmente quando a guerra abala o cenário internacional. Apesar de ter descartado participação no ataque terrorista do dia 7 de outubro, o grupo libanês afirmou que está na guerra desde o dia 8 de outubro. A ameaça de uma escalada no conflito também não é inexistente: em seu primeiro discurso desde o início da guerra, o líder Hassan Nasrallah disse que “todos os cenários estão em aberto”.

As investigações apontam que o interesse do Hezbollah no país está no levantamento de recursos financeiros, facilidade de obter documentos falsos e proximidade com grupos de narcotraficantes. Além da PF, agências de inteligência norte-americana apuram a presença do grupo terrorista no Brasil há mais de 30 anos, sobretudo na tríplice fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina.

Veja: Vídeo mostra palestinos fugindo a pé para o sul de Gaza em busca de refúgio

No campo diplomático, o Brasil tem se posicionado como um dos protagonistas. Então presidente do Conselho de Segurança da ONU, em outubro, o país apresentou uma resolução que condenava o grupo terrorista Hamas e pedia um cessar-fogo na Faixa de Gaza. O texto foi aprovado por 12 delegações entre os 15 países que compõem o órgão, mas foi vetado pelos EUA. Nos bastidores, diplomatas avaliam que a rejeição tenha sido motivada principalmente pelas eleições americanas que acontecerão no ano que vem.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem chamado o ataque de 7 de outubro do Hamas de "terrorista", mas também tem feito críticas à contraofensiva de Israel. Durante um evento no Palácio do Planalto em outubro, Lula afirmou que o conflito é um “genocídio” e criticou a morte de crianças durante a ofensiva israelense. (Colaborou Eduardo Gonçalves, de Brasília)