Internacional

'Longe' do conflito, Cisjordânia vive escalada de violência com mais de 70 mortos desde início da guerra entre Israel e Hamas

Território, ocupado por Israel desde 1967, entrou em alerta máximo na quarta-feira, depois que protestos eclodiram horas após a explosão em um hospital na Faixa de Gaza

Agência O Globo - 19/10/2023
'Longe' do conflito, Cisjordânia vive escalada de violência com mais de 70 mortos desde início da guerra entre Israel e Hamas

Ao menos 73 palestinos morreram na Cisjordânia em ações das forças israelenses ou de colonos desde o início do conflito entre Israel e o Hamas, em 7 de outubro, segundo o Ministério da Saúde palestino. Embora o território esteja geograficamente distante dos principais fronts do conflito, a violência tem crescido, ampliando o temor de que a região se torne uma trincheira importante na disputa entre judeus e árabes, como vem acontecendo com fronteira de Israel com o Líbano.

A Cisjordânia, ocupada por Israel desde 1967, entrou em alerta máximo na quarta-feira, depois que protestos eclodiram horas após a explosão catastrófica em um hospital na Faixa de Gaza, que estava lotado de palestinos abrigados no local. Na região vivem cerca de 3,2 milhões de pessoas, acima dos pouco naus de 2 milhões da Faixa de Gaza, porém abaixo dos cerca de 6 milhões de Israel.

As vítimas mais recentes na região foram sete palestinos que morreram nesta quinta-feira, incluindo quatro moradores do campo de refugiados de Nur Shams, no norte da Cisjordânia, atacado por colonos israelenses, informou o Ministério da Saúde palestino.

As autoridades locais também anunciaram a morte de um adolescente de 16 em um ataque das forças israelenses, e de um de 17 anos no campo de refugiados de Dheisheh, perto de Belém. Um homem de 32 anos em Budrus, ao oeste de Ramallah, foi morto a tiros, segundo o ministério. Não há, contudo, até o momento, dados de israelenses mortos na região.

Procurado pela AFP, o Exército israelense não fez comentários sobre as vítimas palestinas, limitando-se a dizer que as tropas "continuam operando para frustrar a atividade terrorista".

Greve geral

A Cisjordânia é parcialmente administrada pela Autoridade Palestina e, na noite de terça-feira, os manifestantes, irritados com as mortes no hospital em Gaza, começaram a entrar em conflito com as forças da autoridade, que fornecem segurança no local. A autoridade é rival do Hamas, que controla a Faixa de Gaza.

Eles atiraram pedras nos militares e quebraram janelas em Ramallah, uma das maiores cidades da Cisjordânia. Protestos menores ocorreram em muitas outras áreas e em Jerusalém Oriental, os moradores disseram que as tropas israelenses atacaram uma multidão que atirava pedras e coquetéis molotov, e o barulho de tiros ecoou pelos telhados durante horas.

Na manhã de quarta-feira, os líderes palestinos convocaram uma greve geral. A maioria das pessoas obedeceu. As lojas e as escolas foram fechadas, as ruas estavam praticamente desertas e os carros da polícia circulavam pelas ruas. Muitos moradores ficaram em casa, embora os manifestantes tenham continuado a protestar até a noite. O Ministério da Saúde da Autoridade Palestina informou que as forças israelenses haviam atirado e matado duas pessoas.

Embora ainda não esteja claro quem foi o culpado pela enorme explosão no Hospital Árabe al-Ahl em Gaza na terça-feira, a opinião predominante entre os palestinos é que foi um ataque aéreo israelense.

A alegação israelense de que foi, na verdade, causada por um foguete com defeito disparado pela Jihad Islâmica, um grupo xiita armado em Gaza que trabalha em estreita colaboração com o Hamas, foi amplamente rejeitada. Nenhuma das alegações foi verificada de forma independente.

— Israel é totalmente responsável pelo ataque — disse Hassan Froukh, um carpinteiro de Ramallah, ao New York Times. — Não consigo imaginar por que a Jihad Islâmica ou o Hamas estariam interessados em matar seu próprio povo.

Esses pensamentos foram amplamente repetidos em todo o mundo árabe. Como muitos outros, Froukh acredita que as imagens citadas pelos militares israelenses, mostrando o que dizem ser a evidência do ataque do foguete com defeito da Jihad Islâmica ao hospital, foram fabricadas.

De acordo com as autoridades de Gaza, centenas de pessoas morreram na explosão. Nenhum número exato pôde ser confirmado de forma independente, mas imagens do hospital, que é administrado pela Igreja Anglicana, e relatos de testemunhas deixaram claro que muitas pessoas foram feridas e mortas.

Autoridades ‘cúmplices’

A Cisjordânia é um território montanhoso povoado principalmente por palestinos e ocupado por Israel desde 1967. Os manifestantes da região têm expressado sua raiva principalmente em relação aos compatriotas palestinos mortos em Gaza. Mas outro tema se intensificou na última semana: a fúria contra a Autoridade Palestina.

Muitos residentes consideram a autoridade fraca, corrupta e um fantoche israelense. Na quarta-feira, os manifestantes exigiram que o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, renunciasse. Os manifestantes também estão expressando opiniões pró-Hamas. O Hamas tomou o controle de Gaza da Autoridade Palestina em 2007.

— Nossas autoridades são cúmplices — gritavam os manifestantes. — Amanhã o Hamas estará aqui!.

Um cofundador do grupo islâmico fundamentalista, Hassan Yousef, participou de um dos protestos.

Em Deir Jarir, um vilarejo palestino a nordeste de Ramallah, os jovens atacaram um dos prédios do serviço de segurança da autoridade. As forças palestinas revidaram atirando dos telhados. Uma autoridade palestina, que pediu para permanecer anônima porque não tem permissão para falar com jornalistas, disse que os serviços de segurança receberam ordens para se protegerem, mas que deveriam se conter para não inflamar ainda mais a situação.

Desde o ataque a Israel em 7 de outubro, que matou mais de 1.400 pessoas, e os ataques de retaliação de Israel em Gaza, que mataram mais de 2.700 palestinos, as tensões têm aumentado constantemente na Cisjordânia. As forças de segurança entraram em confronto com homens armados e manifestantes, e as autoridades palestinas disseram que mais de 50 pessoas foram mortas. As forças de segurança israelenses também têm feito amplas varreduras em muitos bairros, prendendo centenas de supostos combatentes desde o ataque. (Com AFP e New York Times)