Internacional

Strelkov, Prigojin e Popov: como Putin neutraliza ultranacionalistas russos

De origens diferentes, com funções diferentes e destinos diferentes, os três têm em comum as críticas à forma como o Kremlin conduz a invasão à Ucrânia

Agência O Globo - 23/07/2023
Strelkov, Prigojin e Popov: como Putin neutraliza ultranacionalistas russos
Strelkov, Prigojin e Popov: como Putin neutraliza ultranacionalistas russos - Foto: Reprodução

Um político nacionalista russo, o oficial reformado Igor Strelkov (seu sobrenome verdadeiro é Girkin) se tornou a última voz a ser abafada de forma abrupta depois de criticar a forma como o presidente da Rússia, Vladimir Putin, está conduzindo a guerra na Ucrânia. Girkin foi preso em casa, em Moscou, na sexta-feira, segundo informaram sua mulher e seu advogado.

'Pessoas indesejáveis': Tenista ex-número 2 do mundo é barrada na Polônia em meio à tensão com a Rússia

Atingido por bombas de fragmentação: Jornalista russo da agência Ria Novosti morre em bombardeio no sul da Ucrânia

Em 2014, Strelkov foi um dos líderes militares das campanhas separatistas instigadas pelo Kremlin na Ucrânia. Um tribunal da capital decidiu mantê-lo em prisão preventiva até o dia 18 de setembro, sob acusação de exaltar atos extremistas, utilizando para isso suas redes sociais. Se for condenado, poderá passar alguns anos na cadeia.

Diante do edifício do tribunal onde se examinava o caso do político nacionalista, também foi preso o ativista Pavel Gubarev, de acordo com o site independente Meduza: Gubarev, que protestava pela libertação de Strelkov, foi um dos primeiros separatistas da chamada “primavera russa” de 2014, quando se autoproclamou “governador popular” de Donetsk, no Leste da Ucrânia.

A prisão de Strelkov foi realizada pelo Serviço Federal de Segurança (FSB), o mesmo organismo que abrigou o oficial em suas fileiras até 2013. Naquele mesmo ano, se aposentou com a patente de coronel e embarcou em uma aventura que o levou primeiro a participar da anexação da Crimeia, em fevereiro de 2014, e depois à nomeação de ministro da Defesa da autoproclamada República Popular de Donetsk, em maio daquele ano.

Strelkov é um dos três personagens conhecidos que caíram em desgraça, de formas diferentes, nas últimas semanas, depois que ficaram evidentes alguns conflitos com as autoridades centrais russas. Os outros são Yevgeny Prigojin, o chefe da milícia Wagner, e o general Ivan Popov, chefe do 58º Exército das Forças Armadas da Rússia, que denunciou ter sido afastado do posto após alertar sobre as dificuldades das forças russas na Ucrânia, ao invés de dizer o que o alto comando queria ouvir.

Motins: Prigojin e a longa e infame história das fracassadas rebeliões russas

No caso da milícia Wagner, apesar de não ter prosperado, o motim do final do mês passado foi um sinal claro das fissuras no poder de Putin. Depois de sua tentativa de marchar até Moscou, Prigojin transferiu a maior parte de suas forças para a Bielorrússia (para treinar as tropas daquele país), enquanto uma outra parte dos combatentes se uniu às Forças Armadas russas e outros se desmobilizaram. O general Popov, por sua vez, esperava ter um novo destino depois de ser afastado por ordem do ministro da Defesa, Sergei Shoigu.

Por suas biografias, suas educações e status, Strelkov, Prigojin e Popov são muito diferentes, mas todos têm em comum as críticas (em graus diferentes) ao Ministério da Defesa russo pela forma como dirige e organiza a guerra na Ucrânia.

Strelkov é um dos fundadores do movimento Patriotas Irritados da Rússia, com o qual espera consolidar o apoio da sociedade para a vitória que esperam ter na Ucrânia, mas os observadores russos afirmam que ele tem pouca influência na atual política do país. Um entusiasta de encenações de batalhas e atos históricos, Strelkov foi condenado à prisão perpétua por um tribunal de Haia por seu papel na derrubada de um Boeing 777 da Malaysia Airlines, em 2014, com 298 pessoas a bordo — nenhuma sobreviveu — que sobrevoava áreas controladas por separatistas no Leste ucraniano.

No dia 9 de julho, um contingente das forças de intervenção especial (Omon) impediu que Strelkov desse uma palestra em uma livraria de São Petersburgo, alegando que havia explosivos no edifício. Ele acabou falando (sobre a milícia Wagner e Prigojin), em outro local.

Em abril: Blogueiro militar pró-Kremlin é morto em atentado em São Petersburgo

Depois, Strelkov chamou Prigojin de “sádico” e “psicopata”, mas “preparado” e “ajudado pelos demônios”. Em sua opinião, o chamado cozinheiro do Kremlin não se adapta ao meio político russo, mas, contando com o consentimento das autoridades, conseguiu se esquivar das responsabilidades pela destruição de helicópteros e aviões no motim de 24 de junho.

— O que me preocupa é que ele não tenha sido castigado de forma alguma — disse Strelkov, se referindo a Prigojin.

Strelkov criticou o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, o acusando de não cumprir um pacto firmado com seu colega Vladimir Putin ao permitir o retorno a Kiev dos líderes do Batalhão Azov que estavam na Turquia desde a ocupação russa da cidade de Mariupol.

Para vencer na Ucrânia hoje, afirma Strelkov, há “pouco aumento do patriotismo; não basta que economizemos até o último centavo para dar aos militares o que o Ministério da Defesa não lhes dá e não tem a intenção de dar”. O militar defende que os russos se unam em nome da vitória e se se opõe a “compromissos” em busca de uma paz.

Strelkov faz comentários sobre a política russa e sobre a guerra na Ucrânia, especialmente em seu canal no telegram, e o faz com juízos duros e taxativos. Quando atuava como ministro da Defesa da autoproclamada República Popular de Donetsk, Strelkov desafiou chefes insurgentes de Donbass em várias ocasiões, quando agia de forma dura e dogmática.