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O xexeiro

03/04/2016
O xexeiro

Era uma vez em Maceió um rapaz chamado João Fortunato, conhecido como “Joãozinho Caga Rua”, quando mais jovem deu-lhe uma dor de barriga na rua, ali mesmo baixou as calças, deixou sua marca no meio-fio, daquele dia até hoje atende por esse apelido. Amante da boemia e do carnaval, certa vez, em ensaio noturno, o Bloco Cavaleiro dos Montes arrastava foliões cantando e dançando pela Avenida da Paz. João, feliz da vida, agarrado à uma bela jovem desconhecida, dançava o frevo com maestria. O bloco tomou rumo ao bairro boêmio de Jaraguá.

Ao passar pelo corredor de Jaraguá, a bela acompanhante de João se identificou. Vera era “inquilina” da Boate Alhambra, fazia a vida naquele antigo casarão, convidou João a subir ao cabaré. Entre surpreso e alegre, prontamente galgou as íngremes escadas do lupanar . De paquera no bloco, achou-se no direito, sentiu-se namorado, mesmo sem dinheiro, convidou-a para o quarto.

Depois do amor, a jovem rapariga cobrou pelos competentes serviços. João confessou, não tinha dinheiro, pensava ser de graça. Vera falou braba, ele tratasse de arranjar o pagamento, pegou calça, cueca, camisa e sapato de João, entregou ao Leão de Chácara da Alhambra (segurança), só devolvia quando pagasse.

Joãozinho não teve o que pensar, nu, abriu a porta do quarto, desceu as escadas aos pulos, a rapariga gritava: “Xexeiro, Xexeiro…” Nove da noite, a Boate Alhambra começava a funcionar.

O Leão de Chácara não conseguiu alcançar João, excelente atleta, exímio jogador de futebol. Sua nudez foi notada pelos passantes, olhavam incrédulos. Joãozinho continuou correndo pela rua até desembocar na Avenida da Paz . Surpresa, não podia continuar, as rodas de famílias conversando, cadeiras na calçada, era costume na cidade, antes da televisão.

Um homem nu passando seria excitante novidade naquelas rodas de conversas, entretanto, João escondeu-se atrás de um poste. Olhou em frente , meninos brincavam, jovens namoravam nos bancos, a Avenida da Paz, à noite, era uma festa. João encontrou uma solução , partiu em direção à praia iluminada, Lua cheia. Correu na areia fofa, branca, fria, até encontrar solo de areia dura, molhada, beira mar, onde alguns jovens jogavam futebol sob o luar. Ao se aproximar devagar, a meninada percebeu, ouviu-se a gritaria: “Um homem nu! Um homem nu!”. Imediatamente Joãozinho correu, mergulhou no mar, água tépida, deliciosa, era noite de verão.

Nosso herói ficou por muito tempo curtindo gostoso banho noturno, deixava o corpo nu ser levado pelas pequenas ondas, não havia pressa. Naquele momento, olhando pro céu prateado pela Lua cheia, deslumbrou uma cintilante estrela, sentiu-se dono do mundo, do universo, poeta, seresteiro, no seu encantamento, começou a cantar para o infinito: “A estrela Dalva… no céu desponta… e a lua anda tonta… com tamanho esplendor… as pastorinhas pra consolo da lua… vão cantando na rua… lindos versos de amor…”

Por volta da dez horas da noite, depois de tomar uma fresca, as famílias recolheram-se, os jovens cansados das brincadeiras foram dormir, os namorados, depois do xumbrego, excitados, se auto aliviavam. Joãozinho esperou um pouco, onze horas, apenas alguns boêmios passavam em direção às boates de Jaraguá, dar expansão aos instintos e fantasias.

Afinal nosso herói saiu do mar, corpo molhado, dedos engelhados. Sentiu o vento, tremia de frio. Andou, correu, pulou, recuperou-se. Caminhou pela praia. Retornou às calçadas na Praça Sinimbu, pouca gente na rua. Correndo de poste em poste, Joãozinho, nu, conseguiu chegar em sua casa na Rua da Alegria. Recebeu a devida descompostura do pai, no fundo se orgulhava em ter aquele filho boêmio, cheio de histórias e picardias. Dia seguinte, o pai deu-lhe o dinheiro, não queria filho desonesto, xexeiro, a moça merecia o pagamento. À tarde, Joãozinho resgatou suas roupas, seu sapato de coro de jacaré. Contou a Vera sua aventura noturna, ela caiu às gargalhadas, amaram-se novamente, dessa vez , não houve a devida recompensa pecuniária.