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A guerra do Trottoir

20/09/2015
A guerra do Trottoir

Segundo o Aurélio, “trottoir” (trotoar) significa exercer a prostituição perambulando pelas calçadas. Há alguns anos em Maceió houve uma grande disputa, verdadeira guerra devido à ocupação das calçadas em frente aos hotéis da Pajuçara. Não recordo o ano, tenho certeza que o fato se deu no final do século XX.

     As prostitutas tomaram conta das calçadas dos hotéis da belíssima praia de Pajuçara, fazendo a alegria de alguns turistas e nativos solteiros. O ponto era tão bom que os travestis invadiram uma fatia da calçada, dividindo o espaço com as prostitutas. Foi a gota dágua para que os hoteleiros da orla iniciassem a briga, tentaram proibir o “trottoir” em  frente a seus estabelecimentos, alegando que a indecência provocava o afastando turistas. As mariposas do amor rebateram com propriedade, os turistas achavam ótimo ter as jovens perto, às suas mãos; o que afastavam turistas eram travecos, a invasão bárbara dessas bichas nojentas invadindo seus pontos de faturamento.

    Os travestis contestaram, alegando terem os mesmos direitos das prostitutas, aliás, se diziam mulheres, assim exigiam ser tratados. Por conta do desentendimento  foi deflagrada a “Guerra do Trottoir.” Geralmente uma guerra divide duas partes, a Guerra do Trottoir, dividiram três partes antagônicas, brigando entre si, as prostitutas, os travestis e os proprietários de hotéis.

       Toda noite confusão, os hoteleiros chamavam a polícia. Tapas entre raparigas e travecos, algumas brigas ficaram na história, como a de Maria Chupetinha e Paolla. Saíram puxando cabelos e xingando gritando em pleno calçadão da avenida, se arrastando por mais de um quilômetro. Os jornais e televisão fizeram matéria e alarde sobre a guerra noturna nas calçadas da Pajuçara.

       O líder dos travestis, de nome Jaciara, parecia uma bela mulher, nariz afilado, lábios carnudos, saia justa escondendo a identidade sexual, foi queixar-se ao PROCOM, à OAB, aos Direitos Humanos, procurando o direito de trabalhar no trottoir, estavam  impedidos pelas marafonas. A guerra caminhava  para consequências graves.

        Depois de ouvir os lados, a autoridade competente convocou uma reunião entre as partes conflitantes, o interesse maior era  o restabelecimento da paz.

       A reunião da Comissão de Paz foi realizada com a participação da Polícia Militar, OAB, Direitos Humanos, Câmara de Vereadores, Prefeitura, hoteleiros, e uma comissão das quengas e dos perobos.

         Reunião iniciada, palavra aberta aos presentes, cada representante deu sua versão. O que mais incomodava às prostitutas era a ocupação de seus pontos pelos travecos, eles (ou elas) se achavam com direitos iguais às mulheres. Os hoteleiros exigiam todas as tribos longe de seus hotéis. Depois de mais de doze horas de debates, fala de advogados, pedidos de políticos, muita pressão de simpatizantes, ficou determinada uma divisão de área, um loteamento para o trottoir noturno.

         Daquele dia em diante os travestis ocupariam  seus pontos na Avenida da Paz, as prostitutas permaneceriam na Pajuçara, no início do calçadão perto do estacionamento que serve à noite para namoro, economizando pagamento de motel.

                   Houve reação dos travestis, exigiram a construção de um estacionamento na Avenida da Paz destinado ao amor igual àquele da praia da Pajuçara. Jaciara em seu discurso final aceitou as determinações do Conselho de Paz, entretanto, fez uma reivindicação.

       “Como é para o bem de todas, pela paz, nós ficamos na Avenida da Paz. Pedimos apenas que a Prefeitura de Maceió mande construir um estacionamento. Nem todos podem pagar motel. Faz-se necessário esse equipamento urbano, a construção de um local de trabalho, queremos  um “transódromo” para Avenida igual ao da Pajuçara.” Finalizou o traveco batizando adequadamente o estacionamento.

         Embora não tenha sido atendida a reivindicação dos travestis, as partes têm obedecido às cotas dos locais determinados.

       Recentemente as meninas do trottoir nas imediações do CRB procuraram um conhecido vereador solicitando que coloquem interruptores para apagar algumas lâmpadas nos arredores do estacionamento, pois na belíssima reurbanização da orla da Pajuçara, as noites foram contempladas com um banho de iluminação, inclusive no estacionamento, local de trabalho das mariposas, o “transódromo”, como bem definiu Jaciara. Essa iluminação vem atrapalhando os serviços prestados pelas jovens, os clientes têm acanhamento ou receio de serem identificados pelas chapas dos carros.

      O vereador sugeriu à Prefeitura colocar um interruptor urgente, quatro das lâmpadas modernas foram quebradas por pedras anônimas.