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Onde homenagear Zumbi?
Hoje se comemora o Dia Nacional da Consciência Negra em 20 de novembro. A dar-mos crédito a Domingos Jorge Velho, o “Tigre dos Palmares” foi morto em 20 de novembro de 1695. Então, e isto é óbvio, significa dizer que se comemora este dia na mesma data em que Zumbi foi assassinado. Nada mais justo.
Ocorre que todos se dirigem para um único lugar: a serra da Barriga, localizada no município de União dos Palmares. Esquecem completamente que no final da “epopéia palmarina” esta serra possivelmente, apenas serviu de palco para a construção e posterior destruição de sua Fortaleza. Esquecem, também, que não há nenhuma relação, absolutamente nenhuma, tanto cronológica quanto geográfica, entre a data dos acontecimentos da serra da Barriga e a data e local da morte de Zumbi, pois enquanto a Fortaleza foi totalmente consumida por um inferno de fogo em 06 de fevereiro de 1694, o bárbaro e sádico assassinato de seu comandante supremo ocorreu, acredita-se, aproximadamente, um ano e dez meses depois, em 20 de novembro de 1695, em local, como vimos, ainda incerto. Portanto, se alguém me perguntasse onde, possivelmente, as mais diversas manifestações relativas ao dia 20 de novembro deveriam se realizar eu, com fulcro nas fontes históricas citadas e raquiticamente comentadas, despretensiosamente, responderia:
1. Em Porto Calvo, se no lugar onde o corpo de Zumbi, sem a cabeça, possivelmente está sepultado (Fig. 31);
Figura 31: Porto Calvo: um dos locais onde se deveria homenagear Zumbi
2. Numa ponte de Recife, se onde sua cabeça, “espetada num pau”, serviu de execração pública e “para atemorizar os negros que supersticiosamente julgavam-no imortal” (Fig. 32);
Figura 32: Satisfação, compaixão, desespero e falta de esperança misturam-se, dependendo de quem observa a cabeça do “Tigre dos Palmares” espetada numa estaca.
3. Na serra da Barriga, no município de União dos Palmares, se no lugar onde, provavelmente, ocorreu a batalha e a Fortaleza de Zumbi foi completamente destruída em 06 de fevereiro de 1694;
4. Na serra do Gigante, no município de Bom Conselho, no Estado de Pernambuco, se as palavras corretas do documento intitulado “O Homem que Matou Zumbi”, forem “cabeceiras do Paraíba”;
5. Na serra dos Dois Irmãos, no município de Viçosa, se acreditarmos que a afirmação contida no documento “A Cabeça de Zumbi” (é imprescindível ler o original), restringi-se unicamente a ela;
6. Na serra dos Dois Irmãos, no município de Viçosa, se a palavra correta contida no documento “O Homem que Matou Zumbi”, for “cachoeira” (é necessário ler o original);
7. Numa das serras localizadas em Viçosa, Cajueiro ou Capela, se o autor do documento “A Cabeça de Zumbi”, com “Serra Dois Irmãos”, quis se referir a uma das serras localizadas num dos municípios citados;
8. Num local ainda indeterminado – ao que tudo indica situado entre a nascente e a foz do rio Paraíba – se a palavra utilizada no documento “O Homem que Matou Zumbi” for “cabaceiras do Paraíba”;
9. Possivelmente, na “Toca do Negro”, no município de Cajueiro ou Viçosa, se levarmos em consideração o seu nome, localização e semelhança com o que parece ser um sumidouro. Mesmo assim deve-se, de todas as maneiras, se possível, comprovar-se historicamente através da cópia manuscrita do documento intitulado por Décio Freitas “A CABEÇA DE ZUMBI” e, após, se houver condições, arqueologicamente;
10. Em outro local da região de Viçosa e/ou Cajueiro que possua as características do sumidouro e no qual se encontre artefatos para que a Arqueologia, se possível, possa dar a última palavra;
11. Em qualquer outro ponto desta região onde exista um lugar semelhante a um sumidouro e que após um minucioso exame arqueológico encontre-se vestígios condizentes com os acontecimentos;
12. No subterrâneo da gruta da serra Gulandy, no município de Bom Conselho, no Estado de Pernambuco, se levarmos em conta o relato de Alfredo Brandão, o conceito de sumidouro, sua proximidade com a serra do Gigante e a informação contida no documento “O Homem que Matou Zumbi”;
13. Na região da cachoeira da serra Dois Irmãos, no município de Viçosa, se quem escreveu ou copiou o documento “O Homem que Matou Zumbi”, trocou a palavra “cachoeira” pelas palavras “cabeceiras” ou “cabaceiras” porque o que existe na serra Dois Irmãos não são as “cabeceiras” ou “cabaceiras” do Paraíba, mas sim, a cachoeira do rio Paraíba;
14. Num dos poços do rio Paraíba, se aceitarmos o que diz Alfredo Brandão, ou seja, acreditarmos na possibilidade de uma entrada fluvial para o sumidouro;
15. Finalmente, num desconhecido ponto do gigantesco território que constituía os Palmares, se dermos crédito ao que informa a Carta do Governador de Pernambuco, Caetano de Melo e Castro.
Zumbi não aceitava ser escravo. O que desejava era a libertação de todos aqueles que padeciam sob o jugo da escravidão. A sua importância não está em sua cor, mas em sua luta, em sua mensagem, pois liberdade foi, é e sempre será o maior de todos os anseios de qualquer que seja o ser vivo. Quem, além de ter lido ou escutado outras contribuições sobre o assunto, como as diversas pregações de Jesus, os inúmeros ensinamentos de Gandhi, e a gigantesca e admirável resistência de Nelson Mandela, não se emocionou e com elas conscientizou-se, ainda mais, de que o que existe de maior valor na vida, na existência, é a paz, a liberdade, o respeito e o esforço para a posterior diminuição das desigualdades entre os seres humanos? Portanto, a descoberta do sumidouro onde Zumbi foi sadicamente assassinado é de extrema importância, pois ele deve se tornar um lugar conhecido e não destinado a amnésia da História.
Um lugar de união, não de diáspora de seus seguidores, ou seja, de peregrinação de todos os excluídos, humildes, marginalizados e desprezados e onde o entusiasmo pela luta seja o único pensamento. Não deve ser visto somente como um local onde se cometeu um bárbaro e sádico assassinato, mas como o refúgio hospitaleiro de todos os injustiçados; de diversidade de idéias e onde se possa ter a humildade de implorar pelo perdão por não se ter tido a coragem de seguir o seu exemplo. Um lugar onde se sinta o delicioso perfume exalado pelas rosas da liberdade e não o odor fétido de qualquer que seja o cativeiro. Enfim, um Santuário Sagrado, onde deveriam ser construídos vários monumentos e um cenotáfio, a altura dos nobres objetivos e ideais de sua interminável luta. Deve também, por outro lado, e principalmente, ser o inferno flamejante daqueles que ainda continuam cometendo todo e qualquer tipo de injustiça.
Daí a extrema necessidade, a extrema obrigação científica, moral e cívica de saber onde se localizava para, é claro, poder conhecê-lo e, por mais humilde que seja, pela sua indiscutível e inquestionável importância, eternizá-lo.
Partir em sua busca, subindo e descendo montanhas e arriscar a vida para descobrir, catalogar e entrar em todas as tocas e cavernas, eterna morada das super-peçonhentas surucucus, pico de jaca e malha de fogo e outras congêneres, atravessar riachos e rios, deixar a marca das botas na lama dos brejos e derramar o sangue ao escalar serras, íngremes morros, desfiladeiros e penhascos quase inacessíveis e se ferir ao penetrar nas poucas, porém densas matas ainda existentes, tudo em busca desse misterioso sumidouro é uma obrigação cívica.
Com relação à hipótese levantada por Alfredo Brandão, por ser a mais incrível, e por isso mesmo merecedora de um estudo mais minucioso, deve-se fotografar, anotar a forma, medir a profundidade, dimensões superficiais e coletar todas as histórias, fantásticas ou não, sobre os poços do Paraíba situados na região do universo da pesquisa. Se necessário for, não só providenciar mergulhadores para sondar os seus mais íntimos e profundos recantos, mas secar alguns. Enfim, não medir esforços para encontrar o sumidouro, pois ele representa a fonte da juventude da imorredoura Liberdade.
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