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O Massacre De Jaraguá

16/11/2014
O Massacre De Jaraguá

    O fato se deu há muitos anos, quando a República do Brasil estava engatinhando. O presidente Floriano Peixoto precisou endurecer para consolidar a República. Naquela época o bairro de Jaraguá vivia na efervescência de muitos negócios, exportação de açúcar, algodão, e importação de materiais industrializados. O porto de Jaraguá era um dos mais movimentados do Brasil. Na Praça da Recebedoria, hoje Praça Dois Leões, em torno da Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo, moravam estivadores, embarcadiços, pescadores, homens que tinham o mar como sustento.
Os vizinhos se conheciam, havia casamento entre eles, era como fosse uma só família. Augusta, a moça mais bonita da redondeza, 16 anos, filha de Seu Augusto, estivador, homem forte e rude. Ele ficava de olho naqueles que admiravam a beleza de sua alegre filha. Menina sapeca, trepava em árvore, corria na praia, faceira, a todos encantava. Mas só um ela se agrava, Gumercindo, jovem espadaúdo, tomou corpo de homem com 18 anos, forte musculatura, corpo foi forjado carregando sacos de açúcar no cais do porto, tornou-se embarcadiço. Os pais de Augusta permitiram o namoro. Era do gosto das duas famílias.
Certa tarde de domingo, uma pequena patrulha da Força Policial, comandada pelo Cabo Sobral, fazia ronda na Praça da Recebedoria. Quando o cabo viu a moça de roupa domingueira, se encantou. Ficou deslumbrado com a beleza de Augusta. Todo domingo, o cabo admirava a menina de seus sonhos passando para missa na Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo. Certo dia ele se apresentou e falou com o pai da moça. Não se conformou em saber que a bela Augusta estava comprometida com um embarcadiço.  Não admitia uma negativa, era quase proposta de casamento, ele um cabo da Força Policial, autoridade, de tradicional família (sua família deu nome à belíssima praia do Sobral, continuação da Avenida da Paz).
No dia 14 de janeiro havia a festa de Bom Jesus dos Navegantes. As embarcações flutuavam, singravam, na enseada da praia da Avenida, cada qual com sua decoração, muitos fogos, muita alegria. À noite a festa de prolongava na Praça da Recebedoria. Colocavam tendas para leilões, bingos, tablados onde se dançava e jogava. Improvisavam bares servindo cachaça tira-gosto para animar a moçada.
Nas casas eram organizadas festas particulares frequentadas apenas pelos vizinhos e convidados. Gumercindo havia chegado em uma barcaça de Penedo. Os amigos encheram a festa na casa de Augustão, pai da menina mais bonita da cidade.
O Cabo Sobral, ao longe, via a animação na casa de Augusto, ficou com ciúme e despeito quando viu pela janela Gumercindo dançando o coco com a amada Augusta na maior felicidade. O Cabo, bêbado, com mais 3 policiais, tentou entrar na casa de Augusto, foram barrados na porta por Simplício, irmão do dono da casa. O cabo quis alterar, apareceram mais de 10 estivadores, ele recuou. Depois de certo tempo, Sobral, conhecido arruaceiro, retornou com mais 12 policiais. Foram rechaçados por braços e pontapés, briga generalizada. Uma peixeirada deixou um policial morto na rua. Sobral foi à Delegacia Regional, armou mais de 40 homens. Montados em cavalos chegaram atirando e matando quem vinha pela frente. Os donos das casas pularam muro, fugiram da sanha dos policiais. Na casa de Augusto, todos dispersaram. Dois músicos ficaram guardando seus instrumentos, foram fuzilados. Na praça, os ambulantes que nada tinham a ver com a história correram para dentro da Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo. Os soldados do Cab        o S    obral entraram, atiraram em todos inocentes, não ficou um vivo.
No outro dia, o governador Gabino Besouro foi olhar a chacina, estava escandalizado, entretanto, permitiu que os cadáveres, mais de 50, fossem ajuntados em carroça de bonde, e enterrados numa vala comum no cemitério de Jaraguá. Nenhuma notícia saiu em jornais, nada foi registrado. Para abafar o caso, a Igreja, a cúria, determinou a interdição do templo católico. A Igreja Nossa Senhora Mãe do Povo da freguesia de Jaraguá ficou fechada por mais de 20 anos. Mas o povo não esqueceu, ainda hoje, por tradição oral, os netos e bisnetos de Gumercindo e Augusta contam a história do massacre de Jaraguá.