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Pablo Neruda

19/02/2014
Pablo Neruda

Durante minha primeira viagem a Santiago do Chile, em ja¬neiro de 1982, ainda eram visíveis, nos edifícios em torno da Plaza das Armas, as marcas das balas da luta onde morreu o Presidente Salvador Allenda. O país se encontrava dividido. O nome do poeta Pablo Neruda estava como que proi¬bido oficiosamente pela censura revolucionária. Pergunto aos porteiros e ascensoristas, do Hotel Carrera, onde poderia encontrar o li¬vro Vinte Poemas de Amor e Uma Canção Desesperada. Respondem-me que, dificilmente, encontraria algum tra¬balho literário de Neruda exposto à venda na capital chilena. Somente adquiri o livro, em versão portuguesa, na livraria Siciliano, no Rio de Janeiro.
Volto a Santiago, em abril de 1993. O preço da liberdade e do sacrifício de tantas vidas foi o equilíbrio econômico e financeiro. O desenvolvimento confirmado no alto percentual de empregos, na redução do analfabetismo, na eficiência do sistema de saúde pública e da previdência social, nos aumentos da renda per capita e do Produto Interno Bruto, não esconde que o regime democrático é apenas consentido, pela sombra imensa que ainda paira sobre o Chile, a figura do General Augusto Pinochet, no Comando Geral do Exército. Se o preço valeu a pena, somente o povo chileno pode responder. Constato, entretanto, que o poeta Pablo Neruda passou a ser orgulho nacional.
Conheci Pablo Neruda, em toda sua grandeza, quando li sua autobiografia – Confesso que Vivi. Seu nome de batismo era Nefatli Ricardo Reys Basoalto. Nasceu em doze de julho de 1904, em Parral, no centro do Chile, região de bos¬ques, onde crescem as vinhas e o vinho é abundante. Da¬quelas terras, daquele barro, daquele silêncio ele saiu a an¬dar e a cantar pelo mundo. O amor e a natureza foram as primeiras inspirações de sua poesia. As mulhe¬res, os livros e a política , suas imensas paixões. Afirmava não haver nascido para condenar e sim para amar. Sustentava que a tarefa do escritor não é miste¬riosa nem mágica, é uma tarefa pessoal, de benefício públi¬co.
A política infiltrou-se em seus poemas, quando milhares de operários, despedidos das minas de salitre e de cobre, che¬garam à capital e juntamente com os estudantes que apoia¬vam as reivindicações populares foram espancados pela polí¬cia nas ruas de Santiago.
Diplomata de carreira, foi Cônsul na Birmânia, no Cei¬lão, em Colombo, em Singapura e em Batávia. Nas Américas, assu¬miu os consulados de Buenos Aires e do México. Cônsul, em Barcelona, viveu toda a dramaticidade da guerra civil espa¬nhola. Encerrou sua carreira diplomática como Embaixador em Paris.
A atividade política veio como uma tempestade para tirá-lo de seu trabalho literário. Sai da solidão do gabinete e volta uma vez mais para a multidão. Senador da República, candidata-se à Presidência do Chile. Em busca da unidade popular, renuncia em favor da candidatura de Salvador Allende. Enriqueceu a vida na solidão de sua poesia. Possuía a felicidade de haver chegado, através dos labirintos da palavra escrita, a ser poeta de um povo.