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Mais de 650 projetos em pauta, muita discussão e volta da polêmica 'gratificação faroeste': entenda como foi a última sessão do ano na Alerj
Entre os dez vetos do governador Cláudio Castro derrubados está o que recria a “gratificação faroeste” para policiais civis, que prevê o pagamento de bônus por mortes de bandidos em confronto
A Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) chegou ontem ao último dia de trabalho do ano com 655 projetos em pauta para analisar em uma só tacada. Após oito horas e muito bate-boca, os deputados encerraram a sessão com 24 propostas e 19 vetos votados. Entre os dez vetos do governador Cláudio Castro derrubados está o que recria a “gratificação faroeste” para policiais civis, que prevê o pagamento de bônus por mortes de bandidos em confronto. O texto aprovado autoriza prêmios 10% a 150% do salário para o agente que for ferido em serviço, apreender arma de grande calibre ou de uso restrito em operações ou “neutralizar” criminosos. Castro havia indeferido o projeto porque ele aumenta despesas, o que viola o Regime de Recuperação Fiscal.
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A sessão da derrubada do veto foi marcada por forte polarização. A primeira votação foi contestada por deputados de direita, alegando ter mais votos do que os 35 anunciados. Diante da divergência e da confusão no plenário, o presidente em exercício, Guilherme Delaroli (PL), anulou a votação, mandou zerar o painel e determinou nova apuração, que terminou com 40 votos pela derrubada do veto e 24 contra.
O deputado Flávio Serafini (PSOL) defendeu o veto:
— Os policiais queriam ser promovidos por mérito, por antiguidade, sem precisar se tornar bajuladores de chefes. Todos esses mecanismos foram derrubados por esta Casa. Agora querem dar dinheiro para o policial que mata alguém em serviço.
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Líder do governo, o deputado Rodrigo Amorim (União) afirmou que Castro liberou a bancada para votar de “acordo com a convicção individual de cada parlamentar”:
— O veto do governador foi absolutamente criterioso do ponto de vista orçamentário. Todos aqui gostariam de ampliar direitos, mas muitas vezes estamos limitados pelo regime fiscal. Essa gratificação gera despesa continuada, mas pode ser regulamentada e modulada pela chefia da Polícia Civil.
O presidente do Sindicato dos Delegados da Polícia Civil, Leonardo Affonso, que foi à Alerj, criticou duramente a decisão dos deputados.
— Essa gratificação não era prioridade dos policiais civis. Aprova-se um dispositivo que expõe ainda mais a vida do policial e estão deixando de lado medidas que realmente valorizariam a carreira — afirmou.
A “gratificação faroeste” foi aprovada pela Alerj em setembro. Um grupo de deputados — Rodrigo Amorim (União), Marcelo Dino (PL), Alexandre Knoploch (PL), Alan Lopes (PL), Célia Jordão (PL) e Dionísio Lins (PP) — incluiu uma emenda com o bônus na proposta do Executivo que reestruturava a Polícia Civil. O plenário aprovou, mas Castro decidiu não sancionar o projeto porque o estado não pode aumentar suas despesas diante das regras impostas pelo ajuste fiscal firmado com o governo federal.
Ontem, a maioria dos deputados decidiu pela gratificação. A lei será promulgada em até dois dias. Deputados da oposição já debatiam ontem a possibilidade de ir à Justiça contra a medida, enquanto a direita planejava estender a gratificação para os policiais militares no ano que vem. O Ministério Público do Rio informou ontem que, “como ocorre com qualquer ato normativo, poderá realizar análise técnica no âmbito de suas atribuições institucionais”. O Ministério Público federal havia enviado ao governo, em setembro, um ofício ao governo estadual afirmando que a proposta é inconstitucional.
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Pecúnia no salário
A “gratificação faroeste” instituída em 1995, no governo Marcello Alencar, previa a promoção por bravura e prêmios em dinheiro para policiais e bombeiros, que eram incorporados ao salário. Três anos depois, uma lei aprovada na Alerj, de autoria de Carlos Minc (PSB), derrubou a bonificação. Durante o período de vigência, receberam a chamada pecúnia — valor acrescido ao salário — 3.183 PMs, 1.032 policiais civis e 1.698 bombeiros. O pagamento só foi encerrado em 2000.
Daniel Hirata, coordenador do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos da Universidade Federal Fluminense (Geni/UFF), afirma que o cenário de hoje é mais complexo do que o da década de 1990:
— Nós temos que aprender com as escolhas que ofereceram resultados interessantes e importantes, mas também com aquelas que não renderam resultados e até aprofundaram alguns de nossos problemas. A “gratificação faroeste” é uma delas. Essa bonificação acabou estimulando a letalidade pelas forças policiais e, em contrapartida, não reduziu o crime, nem o comum, nem o organizado — avalia.
O professor da Uerj Ignácio Cano, integrante do Laboratório de Análise da Violência, também critica a medida:
— O mais importante é valorizar o trabalho dos policiais, melhorar as condições de trabalho e incentivar o contrário. Os policiais deveriam ser premiados por prender sem atirar, por planejar operações em que não houvesse tiroteios.
Propag e alívio de R$ 8 bi
Entre as mais de 600 propostas que entraram na pauta de ontem da Alerj, uma terá forte impacto no caixa do estado. Os deputados aprovaram na última sessão do ano o projeto de lei que autoriza o Executivo a aderir ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), mecanismo de refinanciamento de débitos com a União. Pelos cálculos de parlamentares, o benefício poderá reduzir em até R$ 8 bilhões o déficit de R$ 18,9 bilhões previsto no Orçamento. Agora, caberá ao Palácio Guanabara correr para fazer o pedido formal de adesão a tempo porque o prazo vence dia 31.
Deputados destacaram que a aprovação do projeto representa apenas uma etapa inicial de um processo longo de negociação com o Tesouro Nacional e o Ministério da Fazenda.
— O estado tem agora a autorização legislativa necessária para pedir a adesão formal. A partir daí, começa uma negociação que não é rápida nem vai produzir efeitos imediatos — explicou o deputado André Corrêa (PP), presidente da Comissão de Orçamento da Casa. — O Propag é fundamental para manter o estado vivo, mas não resolve tudo.
Corrêa lembrou que o Rio só consegue se manter em funcionamento atualmente por causa de uma liminar do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal, que limita o pagamento da dívida com a União a R$ 4,9 bilhões por ano. Essa decisão judicial só vale até o fim deste ano.
Durante a votação, os deputados aprovaram uma emenda do decano da Casa, o deputado Luiz Paulo (PSD), que obriga o Executivo a encaminhar à Alerj uma revisão do Orçamento no prazo de até 30 dias após a eventual implementação do Propag.
— Deixar de pagar os juros no ano que vem é o único respiro possível para o estado neste momento. Se manter o orçamento como está, não há saída — afirmou Luiz Paulo.
Contas aprovadas
Após muita discussão, os deputados também aprovaram o Orçamento de 2026, com o déficit de R$ 18,9 bilhões. Pelo texto aprovado, a receita líquida estimada é de R$ 107,6 bilhões, enquanto as despesas devem chegar a R$ 126,5 bilhões. Com o Propag, os gastos vão cair.
— Esse é um dos piores orçamentos que já votei aqui no parlamento. Eu não me lembro de um orçamento com um rombo de R$ 19 bilhões, isso depois de vender a Cedae e colocar R$ 17 bilhões no caixa — disse Luiz Paulo.
O Executivo conseguiu ainda ter as contas de 2022 e 2023 aprovadas. O placar foi de 48 votos favoráveis, 13 contrários e uma abstenção.
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