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Fazendas, 32 veículos e R$ 600 milhões: como o Comando Vermelho lavava dinheiro na fronteira com a Bolívia

Esquema era chefiado por Edgar Alves Andrade, o Doca, e Carlos da Costa Neves, o Gardenal, ambos da cúpula da facção.

Agência O Globo - 16/12/2025
Fazendas, 32 veículos e R$ 600 milhões: como o Comando Vermelho lavava dinheiro na fronteira com a Bolívia
Imagem ilustrativa gerada por inteligência artificial - Foto: Nano Banana (Google Imagen)

A Polícia Civil desarticulou, nesta terça-feira, um sofisticado esquema de lavagem de dinheiro do Comando Vermelho (CV), liderado por Edgar Alves de Andrade, o “Doca”, um dos chefes da facção, e por Carlos da Costa Neves, o “Gardenal”, seu principal operador. Segundo as investigações, valores obtidos pelo tráfico em comunidades do Rio de Janeiro, São Gonçalo e Juiz de Fora (MG) eram transferidos para contas bancárias em Pontes e Lacerda, no Mato Grosso, cidade próxima à fronteira com a Bolívia. A Justiça determinou o sequestro de diversos bens utilizados pela quadrilha, incluindo duas fazendas, 32 veículos e o bloqueio de R$ 600 milhões.

A suspeita é de que as propriedades rurais no Mato Grosso, uma delas com 183 hectares, eram empregadas em operações ilícitas do CV. O esquema teria movimentado aproximadamente R$ 630 milhões em dois anos, com parte desse valor destinada à compra de drogas, como cocaína, e de armas para a facção.

A investigação revelou que recursos provenientes do Morro da Mangueira, favela de Manguinhos, favela Final Feliz (Guadalupe), Complexo do Chapadão (Costa Barros), Complexo da Penha, Jardim Catarina (São Gonçalo) e Juiz de Fora eram depositados em contas de um agropecuarista em Pontes e Lacerda. Ele e outros 24 suspeitos estão sob investigação. Para cumprir 39 mandados de busca e apreensão, a Polícia Civil do Rio de Janeiro deflagrou mais uma etapa da Operação Contenção, com apoio de agentes da Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas e Inquéritos Especiais (Draco/IE), da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE), da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), do Departamento-Geral de Polícia Especializada (DGPE) e das polícias civis de Minas Gerais e do Mato Grosso.

— Doca e Gardenal determinavam o envio dos valores arrecadados com a exploração territorial e venda de drogas para serem depositados por mulas financeiras. Tudo era pulverizado em duas contas correntes com destino ao Mato Grosso. Identificamos o proprietário dessas contas, um indivíduo que se apresenta como agropecuarista, mas que movimenta dinheiro do tráfico não apenas do Rio, mas de outros estados. Trata-se de um dos principais lavadores de dinheiro do CV — explicou o delegado Jefferson Ferreira do Nascimento, da Draco.

O delegado acrescentou que o material apreendido será analisado para subsidiar novas fases da investigação: “Agora a investigação prossegue. Vamos analisar o material apreendido e, posteriormente, com a quebra de sigilo fiscal e bancário, pedir novas prisões”.

A investigação começou há um ano, após troca de informações com o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), e contou com apoio do Comitê de Inteligência Financeira e Recuperação de Ativos (Cifra). O trabalho evidenciou que o funcionamento do CV depende não só do tráfico de drogas, mas de um robusto sistema de lavagem de dinheiro, responsável por receber, ocultar, movimentar e reinserir valores ilícitos no sistema financeiro. O esquema utilizava mulas financeiras, pessoas ligadas ao tráfico, à extorsão e à exploração de serviços ilegais, para realizar depósitos em dinheiro vivo.

De acordo com a Polícia Civil, a escolha de Pontes e Lacerda como principal polo financeiro do CV se deve à sua proximidade com a Bolívia. Além do município mato-grossense, os mandados de busca e apreensão foram cumpridos na capital fluminense, em cidades da Baixada Fluminense, em Silva Jardim (RJ) e em Juiz de Fora (MG).