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Entenda os recados de Delalori na entrevista ao GLOBO: com ausência de Bacellar, deputado tenta se firmar como liderança e redesenhar forças na Alerj

Presidente em exercício combina acenos ao Executivo, afirma que terá independência, enquanto reorganiza a casa para se distanciar da herança de Bacellar e ocupar espaço no vácuo de poder

Agência O Globo - 13/12/2025
Entenda os recados de Delalori na entrevista ao GLOBO: com ausência de Bacellar, deputado tenta se firmar como liderança e redesenhar forças na Alerj
Guilherme Delaroli (PL) - Foto: Reprodução / Instagram

A entrevista concedida por Guilherme Delaroli (PL) ao GLOBO marcou o primeiro movimento público mais estruturado do presidente em exercício da Alerj desde o afastamento de Rodrigo Bacellar por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF). E a fala, cuidadosamente modulada, foi lida no Parlamento como uma tentativa de reposicionar sua própria imagem, afastar fantasmas da interinidade e indicar que, enquanto estiver no comando, atuará como liderança política — ainda que insista em se apresentar como “não-político”.

'Sou um cara simples, xucro e da roça. Entendo de cavalo e de asfalto',

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Mais do que declarações isoladas, os recados de Delaroli — que fez questão de se apresentar como um "cara simples, xucro e da roça" que "entende cavalo e de asfalto", traçam um mapa claro do projeto que pretende executar: pacificação retórica, alinhamento estratégico com o Executivo, reorganização interna para assumir controle real da máquina legislativa e um distanciamento calculado da era Bacellar.

1. O recado central: ocupar o vácuo deixado por Bacellar, mas sem confronto

Delaroli faz questão de dizer que não falou com Bacellar desde o afastamento. Não cita o nome do ex-presidente ao comentar os últimos episódios, mas deixa uma mensagem direta ao dizer que deseja “um ano sem esse tipo de episódio que mancha a política carioca”.

É um distanciamento silencioso — não hostil, mas suficiente para marcar posição. A ausência de diálogo e o caráter “estritamente administrativo” da transição revelam que Delaroli não pretende se colocar como continuidade política do presidente afastado. Ele estaria ali, portanto, apenas para cumprir uma missão data por seus mentores políticos.

Mais do que isso: ao se desvincular do tom combatente da gestão Bacellar, Delaroli tenta capitalizar o vácuo de autoridade deixado pela crise sem comprar briga com o grupo do ex-presidente — que permanece ativo nos bastidores e ainda controla parte da engrenagem da Casa.

2. Defesa da “despolarização” no plenário

Quando Delaroli critica o embate entre direita e esquerda e afirma que a polarização “é muito prejudicial ao parlamento”, não fala apenas de ideologia. A fala funciona como senha política.

Dentro da Alerj, o principal afastamento entre os parlamentares hoje não é ideológico, mas interno: bloco do Executivo x bloco de Bacellar. Ao adotar o discurso da pacificação, Delaroli tenta reduzir resistências entre grupos rivais e se colocar como árbitro capaz de mediar a reorganização do poder.

A retórica da moderação funciona como antídoto à narrativa de que ele seria "frágil, inexperiente ou facilmente influenciável por um dos lados". O parlamentar foi muito instruído a pacificar o ambiente da casa em meio a crise instaurada após a prisão e afastamento de Bacellar.

3. Acenos a Cláudio Castro

Nenhum recado foi tão explícito quanto o direcionado ao governador Cláudio Castro. Delaroli sublinhou que ambos conversam diariamente, exaltou obras e repasses para Itaboraí —cidade em que o irmão, Marcelo Delaroli, é prefeito, e utilizou termos como “harmonia” e “parceria”, reforçando o que deputados já percebiam: sua gestão dependerá da estabilidade do diálogo com o Palácio Guanabara.

Mas a mensagem vai além do agradecimento. Ao afirmar que já pautou o Propag (programa do governo federal que prevê refinanciamento das dívidas dos estados com a União, mas que depende da aprovação de um projeto de lei em tramitação na Alerj para o Rio ter direito ao benefício) — essencial para destravar recursos do Executivo — Delaroli sinaliza que está disposto a ser peça de sustentação do governo num momento de fragilidade fiscal.

Ou seja: seu poder na Alerj será exercido em sintonia com o Executivo. E Castro, por sua vez, ganha um presidente menos imprevisível e mais disposto a organizar a Casa num ambiente controlado.

4. Troca de cargos de confiança

O ponto mais político da entrevista foi a afirmação de que todos os cargos ligados à presidência serão trocados. Ele não apenas confirma que fará substituições, como lista que posições-chave — chefe de gabinete, assistentes, diretor-geral — serão ocupadas por pessoas de sua confiança.

É o gesto mais incisivo de rupturas internas desde o afastamento de Bacellar.

Delaroli, ao montar sua própria equipe, impede que quadros ligados ao ex-presidente controlem fluxos de informação, agendas, processos administrativos e canais internos — instrumentos fundamentais para quem deseja exercer autoridade real.

É, na prática, o fim da “gestão Bacellar” dentro da estrutura da Casa.

5. A narrativa de gestor

Ao afirmar repetidamente que “nunca foi político”, que não tem ambição eleitoral e que prefere “asfaltar ruas” e “reurbanizar bairros”, Delaroli tenta construir uma blindagem política.

O depoimento projeta duas mensagens: comunica que não disputará protagonismo eleitoral em 2026, reduzindo a competição com outros deputados; reforça a imagem de gestor técnico, afastando a ideia de que está manobrando para ocupar a presidência de fato.

O discurso não elimina a leitura política — e nos bastidores é tratado justamente como estratégia para circular entre grupos rivais sem gerar ciúmes —, mas funciona como ferramenta de descompressão do ambiente.

6. Recado aos prefeitos

Ao citar prefeitos, agradecer investimentos municipais e reforçar a importância de parcerias locais, Delaroli envia uma mensagem aos aliados do interior, que são parte significativa de sua base e ao governo, mostrando que pode ser ponte com os municípios num momento em que Castro precisa turbinar entregas.

É também signo de sobrevivência política: prefeitos são atores centrais na corrida eleitoral de 2026.

As reações no parlamento

Parlamentares que antes criticavam a postura discreta de Delaroli afirmam agora que ele “enfim se impôs”. O temor era que ele atuasse como figura simbólica enquanto Bacellar continuasse ditando rumos pelos corredores. A entrevista, porém, foi lida como demonstração de que a presidência não ficará solta — e que Delaroli "está disposto a assumir a condução política da Casa".

Ainda assim, o grupo de Bacellar segue tentando manter controle sobre comissões, indicações e votações sensíveis. O equilíbrio de forças dentro da Alerj continua instável, e a fala de Delaroli é apenas o primeiro movimento de um processo que deve se intensificar nas próximas semanas.