Poder e Governo
Entrevista: 'PT não pode sempre associar criminosos a problemas sociais', diz Tarso Genro, ex-ministro de Lula
Petista defende recriação do Ministério da Segurança Pública para ‘preencher vazio’ na área e critica ‘uso da força sem nenhum critério’ em megaoperação no Rio
Ex-ministro da Justiça no segundo mandato de Lula, o petista Tarso Genro defende a divisão da pasta para a recriação do Ministério da Segurança Pública, proposta apresentada em um seminário do PT no mês passado. Após ter atuado, pelo governo federal, em auxílio à instalação das primeiras Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), Tarso afirma que esse tipo de colaboração é mais difícil hoje porque “o crime penetrou no Estado”. Em entrevista, ele defendeu uma polícia firme para agir, “inclusive com violência”, e criticou a proposta de redução da maioridade penal incluída pelo relator da PEC da Segurança, deputado Mendonça Filho (União-PE).
Em 2026:
Câmara:
Criar um Ministério da Segurança ajudaria a sinalizar para o eleitor que o governo está atento a esse tema?
Essa questão não pode ser objeto de disputa eleitoral. Vivemos um cenário em que a segurança pública, que se refere à vida comum das pessoas e à capacidade de transitar no território, está cada vez mais confundida com questões como a segurança nacional, por exemplo, quando o governo Trump passa a usar o conceito de “narcoguerrilha” para interferir na soberania. Acabou ocorrendo uma certa ausência da União e temos que preencher esse vazio rapidamente, o que exige uma estrutura específica no governo.
Houve aprovação popular à megaoperação que deixou 122 mortos no Rio, segundo pesquisas. O cálculo eleitoral levará os partidos a aderir a esse discurso em 2026?
Se o PT adotasse uma posição como essa, de querer uma polícia que mate, estaríamos nos alinhando a países como a Alemanha nazista e a Rússia stalinista, que tinham baixos índices de criminalidade enquanto o Estado promovia matanças. Nós temos que superar no PT uma convicção, que vem dos anos 1960 e 1970, de identificar sempre os criminosos com problemas de natureza social. Até porque os piores criminosos não vêm de baixo. Precisamos de uma polícia firme para agir, inclusive com violência, contra criminosos armados. Mas isso é diferente do uso da força sem nenhum critério, como ocorreu no Rio.
Foi um erro a fala de Lula que tratou traficantes como “vítimas” dos usuários?
Acho que ele quis dizer que os traficantes muitas vezes são alimentados por um mercado altamente lucrativo para alguns. Essa relação de mercado tem de ser quebrada, tanto obstruindo a chegada desses produtos ilegais quanto realizando um trabalho educativo em relação ao consumidor.
Isso pode contemplar a legalização das drogas?
Isso precisa ser discutido quando o governo tiver maior controle sobre a entrada dessas substâncias no território. Sem esse controle, a mera liberalização das drogas só vai aumentar o potencial desse mercado para causar ainda mais danos do que já causa hoje.
Há uma tentativa da Câmara de usar a PEC da Segurança para reduzir a maioridade penal. O PT apoiará isto?
Acho isso contraproducente. O que eu defendo é um projeto que nós deixamos no Ministério da Justiça antes de sair (em 2010), de construir penitenciárias socioeducativas para jovens entre 18 e 25 anos de idade. Continua sendo uma prisão, mas com condições de formação profissional e separados do convívio com as lideranças criminosas, que muitas vezes cooptam esses jovens para o crime. É uma ideia para reduzir a taxa de reincidência desses jovens.
O texto também prevê uma “polícia municipal”, e alguns integrantes do PT defendem que essas forças usem fuzil. Esse caminho é inevitável?
Trocar o nome não é o problema, e sim trocar as funções da guarda, que são mais adequadas para armamento leve. Há uma posição minoritária no partido, do prefeito de Maricá e vice-presidente do PT, Washington Quaquá, de defender esse tipo de policiamento. A proposta dele surge por conta de obrigações político-institucionais que ainda não conseguimos responder de maneira completa, mas mostra também, na minha opinião, um desconhecimento sobre segurança pública.
Por que o governo Lula, que já atuou na criação das UPPs no Rio, hoje tem mais dificuldade de colaborar com governos estaduais na segurança?
Há um distanciamento político-ideológico, mas não é esse o fator predominante. Hoje o crime organizado tem base política, formada a partir de grupos de parlamentares que recebem verbas polpudas do Estado. E no Rio, o crime penetrou no Estado em proporções alarmantes, o que dificulta um regime de colaboração. Na época das UPPs, o que atrapalhou foi a ansiedade eleitoral do então governador Sérgio Cabral, que expandiu as unidades antes de entrar com outras estruturas sociais e educativas.
Em 2026, Lula deverá reeditar a ideia de frente ampla ou apostar em um discurso mais à esquerda e combativo?
Não acho que tenha que ir mais à esquerda ou mais à direita, e sim ter um programa mínimo de defesa da Constituição e ir mais a fundo na questão da segurança pública. Tem que excluir os partidos em que predomine a corrupção e que tenham propensão a proteger o crime organizado.
Isso envolve manter Alckmin como vice ou redesenhar a chapa com MDB e PSD?
Quem dirige esse processo é o presidente Lula. Mas para dar um exemplo prático: se chegar em determinado momento e o (presidente do PSD, Gilberto) Kassab propuser entrar na aliança, com pessoas a indicar, eu rejeitaria? Não. Eu ia verificar qual é a pretensão, quais são as alianças regionais que podemos fazer.
Mais lidas
-
1CRISE INTERNACIONAL
UE congela ativos russos e ameaça estabilidade financeira global, alerta analista
-
2REALITY SHOW
'Ilhados com a Sogra 3': Fernanda Souza detalha novidades e desafios da nova temporada
-
3DIREITOS DOS APOSENTADOS
Avança proposta para evitar superendividamento de aposentados
-
4TENSÃO INTERNACIONAL
Confisco de ativos russos pode acelerar declínio da União Europeia, alerta jornalista britânico
-
5FUTEBOL INTERNACIONAL
Flamengo garante vaga na Copa do Mundo de Clubes 2029 como quinto classificado