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O Corno Voador

Carlito Peixoto Lima 03/08/2025
O Corno Voador
Carlito Peixoto Lima - Foto: Assessoria

No início de 1966, eu era Tenente do Exército Brasileiro, servia no Recife. De repente fui transferido para a fronteira do Amazonas. Não tive como ficar naquela bela cidade que eu amava. Já que tinha de enfrentar a Amazônia, que assim o fosse, resolvi tirar o melhor proveito, conhecendo outras pessoas, outro mundo dentro desse enorme Brasil.

Tomei um transatlântico no Recife em três dias aportei em Belém. De Belém me envaram para Manaus via fluvial, embarquei no navio Lobo Dalmada singrando o Rio Amazonas. Foi uma experiência exuberante que ficou gravada em minha mente e coração. Tive uma feliz surpresa, encontrei o então Tenente Bosco embarcando para o mesmo destino no mesmo navio.

Foram cinco dias surpreendentes belezas de Belém a Manaus, curtindo a selva exuberante, subindo o Rio Amazonas. Paramos nos portos de Óbidos, Santarém, Parintins e outras pequenas cidades encravadas na selva.

Duas bonitas jovens americanas eram companheiras de viagem, estavam no camarote ao lado. Bosco com seu inglês e portunhol, entrosou-se com as sobrinhas do Tio Sam. O plano era, ele com uma e eu com a outra durante a viagem. Quando Bosco investiu na americana mais bonita, a outra percebeu e falou grosso. Eram namoradas. Assim acabou-se a fugaz paquera internacional pelo Rio Amazonas.

A 9ª Companhia de Fronteira em Roraima estava sem comando e precisando de oficiais. Eu e Bosco fomos designados e partimos juntos para cidade de Boa Vista num DC-3 da FAB. Eu assumi o comando do 9º Pelotão de Fronteiras, tendo o Tenente Bosco de subcomandante. Foi um trabalho maravilhoso, onde me senti útil ao país. Um soldado de fronteira se torna um defensor da nação com muito orgulho. Conheci toda a fronteira com a Venezuela e Guiana Inglesa que estava sob nossa responsabilidade. Um trabalho extraordinário. Para me capacitar enfrentei o curso de Guerra na Selva em Manaus, um dos mais difíceis no mundo.

Acontece que nem eu, nem o Bosco estávamos ali apenas para defender o Brasil. Como ninguém é de ferro, a carne é fraca e o mulherio amazonense muito assanhado, logo nos dedicamos à caça ao mulherio que nos receberam de braços e pernas abertos. Tenente Bosco foi um dedicado caçador de mulheres. Fazia isso como ocupação profissional paralela.

O inquieto Tenente Bosco só pensava em mulheres, não tinha namorada fixa, o que caísse na rede era peixe. Terminava o expediente à tardinha, ele saía na sua lambreta, pegava alguma das namoradas disponível e levava para um cantinho escuro à margem do Rio Branco. Apelidaram esse cantinho de Beco do Tenente Bosco. Eu soube que em Boa Vista ainda existe esse beco com placa e tudo.

Certa vez, Bosco cometeu a imprudência de namorar uma mulher casada, esposa de um alto funcionário da República que mandava no Território de Roraima (ainda não era Estado). A bela mulher era nova, o marido já passava dos setenta anos. Eu aconselhei ao Bosco sair dessa aventura. Ele me tranquilizou, o corno era manso. O grandola viajava para Brasília toda terça-feira no próprio avião. Na sexta-feira ele retornava pela tarde, dando rasante por cima de sua casa. Os linguarudos da cidade mexericavam. Insinuavam que aqueles rasantes eram avisos para dar tempo do Tenente Bosco sair da casa sem atropelos. A bela mulher, ao ouvir o ronco do motor do avião, dizia com carinho para o Bosco.

- Até terça-feira meu amor, que pena. O corno voador chegou.