Alagoas
54 ações na Justiça podem mudar a composição de Câmaras em quase todo o Estado

A Justiça Eleitoral segue firme no combate às fraudes à cota de gênero nas eleições proporcionais. No início de julho, mais uma decisão causou reviravolta política em Alagoas: quatro dos nove vereadores eleitos em Japaratinga nas eleições de 2020 tiveram seus mandatos cassados por fraude na composição da chapa, que deveria cumprir o mínimo de 30% de candidaturas femininas. A ação foi proposta pelo Ministério Público Eleitoral (MPE), e o caso se junta a uma lista crescente de processos semelhantes no estado.
Segundo o Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL), tramitam atualmente 54 ações eleitorais por suspeita de descumprimento da cota de gênero — 35 delas ainda em 1º grau. Algumas foram arquivadas, enquanto outras seguem para julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A legislação brasileira estabelece que cada partido ou coligação deve destinar no mínimo 30% e no máximo 70% das candidaturas a um dos sexos. Desde que entrou em vigor em 2009, a regra já levou à anulação de votos e perda de mandatos em diversas cidades do país.
Em Alagoas, municípios como Porto Real do Colégio, Barra de São Miguel e Palmeira dos Índios já sentiram os efeitos diretos dessa legislação. Neste último, a cidade já enfrenta seu segundo escândalo consecutivo relacionado à fraude na cota de gênero. Em 2021, uma decisão do juiz eleitoral André Parisio cassou a chapa do PRTB, incluindo suplentes e o presidente do partido. Agora, dois novos vereadores eleitos em 2024 também estão sob risco de perder os mandatos por suspeita de envolvimento em nova fraude, em ação também proposta pelo Ministério Público. Com isso, Palmeira dos Índios se torna um dos poucos municípios com histórico reincidente nesse tipo de irregularidade, chamando a atenção do TRE e do TSE.
Em Japaratinga, o vereador Poliano de Moura Pinheiro (PSDB), conhecido como Pôly, ingressou com ação alegando que a candidatura da Dra. Carla Lins (MDB) era fictícia. Segundo a denúncia, a suposta candidata não teve movimentação financeira compatível com uma campanha real e obteve apenas três votos, além de não realizar atos públicos de campanha. A Justiça reconheceu a fraude e cassou toda a chapa, possibilitando que Pôly assuma uma das cadeiras remanescentes.
Casos semelhantes foram registrados em 2022, quando o TSE anulou os votos do MDB em Porto Real do Colégio, e em 2023, com a cassação da chapa do Republicanos em Barra de São Miguel. O Tribunal considera como indícios de fraude a votação zerada ou inexpressiva, ausência de movimentação financeira significativa, contas padronizadas ou zeradas, e inexistência de campanha ativa ou divulgação da candidatura.
Na capital, Maceió, embora haja registros de ações judiciais, não houve cassação de mandatos até o momento. Em 2023, o TSE chegou a acatar pedido de cassação contra a vereadora Silvânia Barbosa (Solidariedade), eleita pelo PRTB, mas a decisão não foi executada. Já na disputa eleitoral de 2024, o ex-vereador João Catunda (PP) ajuizou ações contra o PDT e o PSD, buscando anular os mandatos de Aldo Loureiro e Rui Palmeira. A estratégia seria alterar o quociente eleitoral e assumir uma vaga na Câmara, mas o processo ainda aguarda julgamento.
A desembargadora eleitoral Natália França Von Sohsten, em entrevista ao jornal Tribuna Independente, de Maceió, destacou que a cota de gênero é uma política pública eficaz e que sua aplicação vem sendo reforçada com o tempo: “Na minha avaliação, as severas consequências decorrentes das decisões judiciais têm obrigado os partidos a se adaptarem às regras. O risco do descumprimento se tornou alto.”
Para denunciar possíveis fraudes, partidos, candidatos ou cidadãos podem ingressar com Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) junto ao cartório eleitoral de sua cidade. A punição pode ir da cassação do registro de candidatura à perda de mandato dos eleitos. Já os partidos podem ser penalizados com a anulação total da chapa e inelegibilidade de dirigentes.
O prazo para apresentação de denúncias relacionadas às eleições de 2024 terminou em 7 de janeiro, mas os julgamentos seguem seu trâmite na Justiça Eleitoral. Como reforçou a desembargadora Natália França, "a diplomação não é definitiva. Ilícitos praticados durante o processo eleitoral podem ser punidos mesmo com os mandatos em curso."
Palmeira dos Índios, mais uma vez, se vê no centro do debate sobre o cumprimento da legislação eleitoral e da lisura no processo democrático. Se confirmadas as suspeitas, será a segunda vez consecutiva que a cidade terá mandatos de vereadores anulados por fraude de gênero — um sinal claro da necessidade de maior fiscalização, responsabilidade partidária e respeito à legislação.
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