Internacional
'Uma oportunidade perdida': Milei encerra com altos e baixos mandato à frente do Mercosul

O presidente argentino, Javier Milei, entregará ao seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, a presidência pro tempore do Mercosul, após um semestre marcado por frustrado esforço para firmar um acordo comercial com os EUA.
Especialistas ouvidos pela Sputnik destacaram, ao menos, o avanço em flexibilizar exceções à Tarifa Externa Comum (TEC).
Em abril, diante da pressão da Argentina, chanceleres do Mercosul concordaram em adicionar 50 produtos em uma lista de exceção que os torna passíveis de serem comercializados fora da lógica de tarifa externa comum aos parceiros.
A cúpula de presidentes do Mercosul será realizada em Buenos Aires entre os dias 2 e 3 de julho. Milei, que assumiu a presidência rotativa do bloco em dezembro de 2024, encerra seis meses de gestão marcados pela crise no comércio internacional provocada pelas tarifas impostas pelos Estados Unidos sob a liderança de Donald Trump.
Um êxito diplomático para a Argentina?
Em entrevista à Sputnik, a analista internacional argentina Florencia Rubiolo destacou como um dos "pontos positivos da liderança argentina" no primeiro semestre de 2025 o acordo para ampliar em 50 itens a lista de exceções à TEC.
O acordo permite que Brasil e Argentina aumentem de 100 para 150 os tipos de artigos isentos da TEC até 2028. O Uruguai poderá ampliar de 225 para 275 até 2029, e o Paraguai de 649 para 699 até 2030. Os presidentes devem ratificar o acordo durante a cúpula de Buenos Aires.
"A Argentina teve que lidar com um abalo estrutural no sistema comercial e multilateral causado pelos anúncios tarifários de Trump, e ter conseguido o consenso entre os Estados-membros para ampliar a lista pode ser considerado um êxito diplomático da liderança argentina", avaliou a analista Florencia Rubiolo.
Segundo a especialista, a proposta argentina buscou "manter o Mercosul vivo" em meio a uma crise multilateral global, oferecendo ao bloco "mais flexibilidade", sem "sacrificar" o acordo regional — que não permite que os países assinem acordos comerciais individuais fora do bloco.
Rubiolo lembrou que Milei assumiu a presidência pro tempore com uma visão "ideológica e aspiracional" de alcançar um acordo de livre comércio com os Estados Unidos — algo que, apesar das expectativas do presidente argentino, não tinha base concreta e acabou sendo inviabilizado pela política tarifária de Trump.
A partir daí, o governo argentino passou, segundo a analista, por uma "mudança de retórica", abandonando as ameaças de sair do bloco e buscando, ao menos, uma negociação com o Brasil para flexibilizar tarifas em alguns produtos.
Tempo perdido com a União Europeia
Também ouvido pela Sputnik, o especialista em comércio Miguel Ponce avaliou que a insistência de Milei em buscar um acordo impossível com os EUA "impediu" que a Argentina aproveitasse sua presidência pro tempore para avançar nas negociações com a União Europeia, justamente num momento em que Bruxelas demonstra maior urgência por fechar o acordo.
"Com a guerra tarifária em curso, a União Europeia precisa desesperadamente assinar acordos, e suas prioridades são México e Mercosul. Já poderíamos ter dado passos concretos nesse sentido durante a presidência de Milei, mas o tempo foi perdido", lamentou Ponce.
Rubiolo, por sua vez, apontou que o papel que Milei não assumiu nas negociações com a UE parece ter sido ocupado por Lula, que buscou "aproveitar seu papel de liderança não apenas regional, mas também com projeção global" e a chegada da presidência nesta cúpula — o que abre caminho para tentar concluir o acordo com Bruxelas no próximo semestre, com o Brasil à frente do Mercosul.
Para Miguel Ponce, é fundamental que Milei compreenda, nos próximos anos, a importância de melhorar a relação bilateral com o Brasil, peça-chave nas dinâmicas internas de negociação do bloco.
"É imprescindível desideologizar as relações diplomáticas, para não continuar prejudicando nossos vínculos comerciais e econômicos", concluiu.
No entanto, Ponce advertiu que dificilmente haverá uma reaproximação entre Argentina e Brasil nos próximos meses, especialmente considerando que os argentinos terão eleições legislativas em novembro de 2025.
"Será difícil vermos os gestos de racionalidade, prudência e inteligência estratégica que são necessários", acrescentou.
Ao mesmo tempo em que reiterou que "é óbvio que uma oportunidade foi perdida", Ponce afirmou que o Mercosul precisa que os presidentes dos países-membros "mantenham uma relação permanente", num contexto internacional em que "as regras do comércio global já não existem mais".
Por sua parte, Rubiolo demonstrou confiança de que as divergências entre Milei e Lula "não significam um bloqueio ao Mercosul", graças ao funcionamento de outras instâncias do bloco, como os encontros entre chanceleres e ministros da Economia.
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