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Amor no tempo de Jaraguá

Carlito Peixoto Lima 01/06/2025
Amor no tempo de Jaraguá
Carlito Peixoto - Foto: Assessoria

Pedro Ernesto tinha uma paixão fulminante, cheia de desejos presos por sua namorada Laurinha, tão bonitinha, de uma sensualidade exuberante. Toda noite eles namoriscavam, se agarravam no portão escuro da moça, não podiam ultrapassar a virgindade. Assim aprenderam as jovens daquela época.

Ernesto depois do namoro, gostava de se aliviar, subindo as escadas das boates de Jaraguá, onde certamente relaxaria. Isaura, rapariga da Boate Tabariz era seu xodó, rapaz gentil, estudante de medicina e divertido.

Numa noite de sexta-feira Pedro Ernesto foi “namorar” Isaura. Subiu a escada íngreme da Tabariz, a boate mais chique de Jaraguá. Uma sala-dancing ampla, algumas mesas com tolha de linho, cinzeiros de prata, mostravam o charme do ambiente. No tablado uma orquestra tocava belas músicas. Deparou-se com o ambiente festivo, as meninas sentadas nas mesas, casais dançando, cumprimentou uma e outra procurando Isaura. De repente ela apareceu com um charmoso vestido vermelho, morena nascida no sertão alagoano, Ernesto abraçou-a com alegria.

- “Vamos vadiar a noite toda e pegar o Sol com a mão.”

Lá para as tantas entrou no salão o Coronel Zé Malta e três capangas, sentaram-se numa mesa dupla. O coronel, brabo e prepotente mandou chamar Ana, a cafetina. Ficaram conversando, vieram algumas meninas. O Coronel, também deputado, era o maior arruaceiro da Zona. Briga e tiro faziam parte de suas histórias de boemia.

Um garçom, a mando de Ana, dirigiu-se à mesa de Ernesto e avisou à Isaura que o deputado gostaria de sua companhia. Ela respondeu que estava ocupada. O ambiente nas mesas ficou tenso, o deputado não gostou, reclamou, a própria Ana foi à mesa de Ernesto e cochichou no ouvido de Isaura:

- Menina deixe de besteira, o Coronel gosta de você, tem muito dinheiro e você fica aqui com este estudante lascado, mal tem para a bebida. Faça isso não, vá com o deputado, ele está esperando.

Saiu com raiva da sua pupila. O ambiente ficou mais tenso quando ela recusou novamente. As pessoas em volta perceberam.

Ernesto tomou uma decisão. Levantou-se, dirigiu-se à mesa do Coronel. Nessa altura todo salão acompanhava a situação. Quando o estudante encostou-se à mesa do Deputado, a expectativa, o suspense e o medo eram geral, alguns clientes desceram a escadaria, outros ficaram por trás das colunas. Pedro Ernesto falou alto e em bom tom:

-Deputado, o senhor me desculpe, mas a mulher que o senhor pediu está acompanhada comigo, assim ela não pode ficar com o senhor, faz parte de nosso costume, é a lei da boemia, que todos respeitamos.

Os capangas se levantaram com a mão nas cartucheiras, Ernesto continuou olhando nos olhos do Deputado. Esperava-se um tapa, um murro, um tiro, a qualquer momento. Surpreendentemente o Coronel estendeu a mão ao jovem.

- Gostei de você menino, mostrou que é macho, é assim que um homem faz, tome uma dose comigo.

Foi um alivio geral, Ernesto bebeu duas doses, divertiu-se com piadas picantes, depois foi pegar o Sol com a mão com Isaura.

Dizem que o Coronel se tornou amigo do Doutor Pedro Ernesto até sua morte. A história da briga que não houve, ainda é contada pelas quengas, pelos boêmios, pelas cafetinas e bêbados nos bares, nos cabarés do porto de Jaraguá.