Internacional
Guerra tarifária EUA-UE: Quando os imperialistas brigam, todo o globo se beneficia, diz analista

À Sputnik Brasil, analistas apontam que o embate tarifário entre os aliados ocidentais pode fazer avançar o acordo entre Mercosul e União Europeia, mas frisam que o Brasil não pode depender exclusivamente do mercado europeu, e deve buscar parcerias alternativas.
O Ocidente está em guerra, mas a disputa é tarifária. Na próxima semana entram em vigor as primeiras contramedidas da União Europeia (UE) às novas tarifas impostas pelos EUA ao bloco no tarifaço do presidente estadunidense, Donald Trump.
O bloco europeu é alvo de tarifas de importação de 25% sobre o aço, o alumínio, automóveis e autopeças, o que acertou em cheio montadoras da Alemanha que representam um setor crítico da economia do país, além das tarifas de 10% a produtos em geral, que foram impostas a blocos e países com base no déficit comercial dos EUA.
Anteriormente, as tarifas impostas a produtos em geral eram de 20%, mas nesta quarta-feira (9), Trump anunciou a redução para 10% e uma pausa na medida por um período de 90 dias.
Em resposta às tarifas dos EUA, a Comissão Europeia, que coordena a política comercial da UE, anunciou que pretende encerrar a suspensão atual de tarifas sobre produtos dos EUA e nesta quarta-feira aprovou a imposição de tarifas de 25% a produtos dos EUA, que estão previstas para entrar em vigor em três etapas: 15 de abril, 16 de maio e 1º de dezembro.
Em entrevista à Sputnik Brasil, analistas apontam como a guerra tarifária entre os tradicionais aliados pode beneficiar o Brasil.
Luiz Felipe Osório, professor de relações internacionais da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), afirma que, em abstrato, a guerra tarifária entre Washington e Bruxelas pode beneficiar o Brasil, mas destaca que o país precisa criar condições para que as vantagens se concretizem.
"O comércio internacional é tarifado desde sempre. Aliás, o livre comércio é um idealismo que não se comprova nem historicamente nem no tempo presente. O termo aparece, normalmente, na defesa do livre comércio quando os interesses do bloco dominante do comércio internacional são ameaçados. Como o que acontece agora com o tarifaço de Trump", sublinha o especialista.
Ele acrescenta que o Brasil sempre foi taxado por EUA e UE em seus setores mais competitivos, sobretudo nos produtos primários e agrícolas, mas também em produtos manufaturados específicos.
"Logo, para quem já está em uma condição desfavorável, os distúrbios entre o bloco dominante podem ter efeitos positivos. Cabe ao país sul-americano aproveitar o momento para livrar-se da dependência de alguns produtos e setores, fomentando o desenvolvimento interno."
Por sua vez, Roberto Uebel, economista e professor de relações internacionais da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), afirma que antes de tudo o Brasil precisa analisar os riscos e as oportunidades decorrentes da guerra tarifária imposta pelos EUA ao mundo.
"Antes de qualquer medida de reciprocidade em relação a Washington ou de realinhamento de expectativas com Beijing, é fundamental que o governo brasileiro realize um mapeamento de mercados alternativos para identificar oportunidades, sobretudo nos campos do agronegócio, da energia e das novas tecnologias, como inteligência artificial e tecnologia quântica, além, é claro, dos minerais críticos e das terras raras", afirma o especialista.
Ele avalia que, apesar dos benefícios decorrentes do mapeamento e do estreitamento de laços com novos parceiros e mercados, é importante destacar o risco inerente a uma guerra tarifária global, que obviamente afetará o poder de compra das famílias e a capacidade de investimento das empresas.
"É importante, portanto, que não apenas o governo brasileiro e suas agências, como a Apex-Brasil e a Agência Brasileira de Cooperação, mas, sobretudo, as empresas passem a adotar, por meio dos instrumentos da diplomacia corporativa, um horizonte de cenários novos e mais complexos de oportunidades — sem jamais ignorar os riscos envolvidos."
Guerra tarifária pode fazer avançar o acordo entre Mercosul-UE?
Assinado em dezembro do ano passado, o acordo entre o Mercosul e a UE ainda não tem previsão para sair do papel, por conta de divergências entre sul-americanos e europeus e pela resistência da França.
Questionado se a guerra tarifária entre EUA e UE pode fazer o acordo avançar, Uebel afirma que "sem sombra de dúvidas".
"Arriscaria ponderar que, talvez, as únicas duas salvaguardas de que a Europa dispõe para amortecer os impactos das tarifas de Trump sejam esse acordo e o próprio BRICS — mas aí entra a questão russa, que precisará ser devidamente cotejada pelos europeus em algum momento", avalia.
Uebel considera que as tarifas dos EUA à UE podem abrir mercados europeus aos produtos brasileiros em decorrência do próprio acordo entre os blocos sul-americano e europeu.
"No entanto, é importante que o governo brasileiro, dentro desse mapeamento da nova ordem econômica mundial — isto é, do novo regime internacional em que estamos inseridos —, não busque depender exclusivamente dos mercados europeu ou chinês, mas procure novas alternativas, como os mercados da Índia e da Indonésia, por exemplo, no âmbito das commodities, ou até mesmo mercados mais distantes ou complexos [...]. Há muitas possibilidades que precisam ser mapeadas pelos setores público e privado daqui para frente."
Osório enfatiza que EUA e UE, junto com Canadá e Japão, compõem o que se pode chamar de bloco imperialista, e afirma que, quando esse bloco entra em conflito, "todo o globo, que é subjugado permanentemente pelo imperialismo, pode se beneficiar".
"De toda forma, resta saber como fazer para aproveitar as brechas e curtos-circuitos como os de agora. O Mercosul, por si só, a depender de sua orientação, pode continuar na toada de apenas fomentar as liberdades econômicas, o que não traria grandes vantagens. Porém, caso ele retorne a uma orientação mais desenvolvimentista da região, o bloco pode, sim, ser uma saída interessante."
Ele avalia que ainda é cedo para traçar um prognóstico sobre a capacidade de a guerra tarifária abrir os mercados europeus ao Brasil, no entanto, torna a frisar que "não existe nem nunca existiu livre mercado" e que os europeus cultivam desde o fim da Segunda Guerra Mundial uma aliança com os EUA na qual são sócios minoritários.
"Ou seja, eles não perderam sua condição metropolitana, mas estão em uma posição inédita, de subordinação aos interesses estadunidenses. Este foi o preço que pagaram para não sair do núcleo imperialista, mantendo uma relação de cooperação e conflito com os EUA, na qual, nos momentos de crise, a submissão fica explícita. Basta lembrar episódios recentes como a pirataria de materiais sanitários durante a pandemia, os casos de espionagem de importantes líderes europeus, a explosão do gasoduto Nord Stream e as fracassadas sanções impostas à Rússia mesmo contra a vontade dos europeus", afirma.
Nesse contexto, Osório afirma que não se sabe se em uma situação extrema um acordo com os EUA, ainda que desvantajoso, seria celebrado pela Europa.
"É questão de acompanhar atentamente e aproveitar as brechas, pois, quando os de cima brigam, os de baixo podem se beneficiar", conclui o especialista.
Por Sputinik Brasil
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