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Quando os campos estão cheios de preàs

Uma das cenas mais comoventes da literatura brasileira, na minha opinião, é a morte da cachorra Baleia, da obra “Vidas Secas” de Graciliano Ramos. Por sua beleza, singeleza e profundidade, gosto de, vez por outra, reler essas páginas e, todas as vezes que as releio, acabo diante de uma cena diferente porque, naturalmente, eu também, graças a Deus, não sou mais o mesmo.
Gosto dessa cena, mas devo dizer que ela não é uma passagem literária que me marcou profundamente; não foi um divisor de águas. Ela apenas me encanta e me inspira algumas reflexões a respeito da vida.
Aliás, essa história de elegermos o livro que marcou a nossa vida, de identificarmos a pessoa que mais nos influenciou é um trem deveras complicado e, por isso mesmo, muitas vezes, acabamos apresentando uma resposta injusta para essa questão espinhosa.
Sobre esse ponto, Umberto Eco, em seu livro “Pepe Satàn Aleppe”, de forma curta e grossa, feito um pino de patrola, nos diz que se em nossa vida inteira apenas um único livro nos marcou profundamente, é sinal de que nós somos reles idiotas.
Na verdade, muitas vezes nós dizemos isso porque lemos pouquíssimos livros em nossa peregrinação por essa vida, o que acaba por nos pressionar a identificarmos apenas um como sendo “o livro” que nos marcou.
Em situações mais drásticas, o livro apresentado como sendo o nosso “divisor de águas” é o único livro que lemos de capa à capa; livro esse que, provavelmente, apenas foi lido porque fomos obrigados em nossa infância ou juventude, não porque desejássemos ampliar os átrios da nossa alma com suas letras.
Por isso acho fascinante o livro “Meditações” de Marco Aurélio, onde o mesmo nos apresenta uma longa lista de pessoas que contribuíram de alguma forma para a sua formação, dizendo-nos quando e de que maneira eles fizeram isso.
Aliás, eis aí um belo exercício de reflexão, um excelente exame de consciência. Exame o qual, bem provavelmente, muitos de nós nunca realizamos (nem realizaremos).
Enfim, quando passamos a rememorar e refletir a respeito das pessoas e livros que contribuíram para sermos quem nós somos, estamos nos permitindo realizar uma sutil tomada consciência da nossa real condição humana e, humildemente, descobrindo que, bem no fundo, como nos ensina Léon Bloy, somos apenas almas indigentes e ingratas.
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