Política

Debate Globo em SP: apesar de tom mais moderado, encontro tem embates quentes entre Boulos e Marçal

Participaram Guilherme Boulos (PSOL), Ricardo Nunes (MDB), Pablo Marçal (PRTB), Tabata Amaral (PSB) e José Luiz Datena (PSDB)

Agência O Globo - 04/10/2024
Debate Globo em SP: apesar de tom mais moderado, encontro tem embates quentes entre Boulos e Marçal
Debate Globo em SP: apesar de tom mais moderado, encontro tem embates quentes entre Boulos e Marçal - Foto: Instagram - @pablomarcal1

O debate na TV Globo realizado na noite desta quinta-feira (4) transcorreu em tom mais moderado e com maior discussão de propostas em áreas variadas, como saúde, impostos, população de rua, segurança pública, criação de empregos, mobilidade e educação. Nenhum candidato foi advertido, e nenhum direito de resposta foi concedido.

Um cenário bem diferente de eventos anteriores, marcados por uma enxurrada de ofensas, agressões e até cenas de violência física. Os momentos mais quentes ocorreram em discussões entre Guilherme Boulos (PSOL) e Pablo Marçal (PRTB) no terceiro e quarto blocos, quando sugiram termos como “lobo em pele de cordeiro” e “esquerdopata maluco”.

O encontro foi o último do primeiro turno da eleição pela prefeitura de São Paulo e encerrou uma longa maratona de 11 embates realizados até o momento na campanha. Além de Boulos e Marçal, participaram os cinco candidatos mais bem colocados nas pesquisas de intenção de voto: Ricardo Nunes (MDB), Tabata Amaral (PSB) e José Luiz Datena (PSDB).

Nunes abriu o debate questionando Datena sobre a cobrança de impostos na cidade, posicionando-se à direita ao defender uma economia liberal. Sustentou que não criou “nenhuma taxa” durante o seu mandato como prefeito e atraiu 57 mil empresas.

Já Datena alegou que o prefeito fez pouco pela cidade na discussão sobre a reforma tributária e que a população acabou penalizada. Em vez de endurecer o discurso na tréplica, preferiu abordar a proposta de criar um “território de emprego”, oferecendo benefícios fiscais para empresas se instalarem na periferia e contratarem mão de obra local.

População de rua

Na sequência, Tabata escolheu Nunes para perguntar se o prefeito está “satisfeito” com indicadores da cidade sob sua gestão como o aumento no número de pessoas em situação de rua, a queda no ranking da alfabetização e o tamanho das filas para exames e consultas nas unidades de saúde.

Nunes disse que “trabalha duro”, destacou sua “parceria” com o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e alfinetou a deputada federal, afirmando que a parlamentar não apoiou um projeto que sugeria o aumento da pena para criminosos no Congresso. Tabata ignorou a provocação de Nunes e usou sua réplica para ironizar o oponente, perguntando aos eleitores se eles conheciam essa São Paulo que o Nunes estava descrevendo.

Saúde

Tabata e Boulos protagonizaram uma dobradinha com críticas a Nunes na área da saúde. A dupla listou propostas para resolver o problema da fila de exames. Boulos listou bairros em que pretende construir o chamado Poupatempo da Saúde e prometeu dezesseis unidades do equipamento em bairros da Zona Sul, Norte e Oeste da cidade, enquanto Tabata afirmou que sua gestão terá um monitoramento da fila dos exames e defendeu mais atenção à saúde mental.

Criminalidade

Marçal não foi beneficiado pelo sorteio e só apareceu na quarta pergunta do primeiro bloco, com pergunta obrigatória de Datena ao candidato para todos responderem. O tucano abordou o tema do roubo de celulares em São Paulo, dizendo que este parece um “crime menor”, mas pode resultar em fatalidades.

O empresário acenou ao público religioso dizendo já ter ouvido a “Bíblia inteira pela voz do Cid Moreira”. Ele adotou tom moderado, disse que subiria um vídeo com proposta para a segurança nas redes sociais e prometeu usar a tecnologia para atacar a criminalidade, assim como gerar empregos e ampliar a Operação Delegada.

Empregos

Último a perguntar no primeiro bloco, Marçal foi obrigado a se dirigir ao único candidato que ainda não havia sido questionado, Boulos. O ex-coach disse que São Paulo tem a oportunidade de eleger um “empreendedor raiz” e perguntou ao adversário sua proposta para incentivar a abertura de empresas.

Boulos disse que vai estimular a criação de empregos na periferia ao conceder a redução no IPTU de empresas que oferecerem vagas nos bairros mais pobres. Afirmou também que é diferente de outros políticos que “só aparecem de quatro em quatro anos fingindo que se importam”.

Marçal se declarou como o “único que não deve favor a ninguém”, e disse acreditar numa vitória no primeiro turno. Na réplica, Boulos atacou tanto o candidato do PRTB quanto o atual prefeito:

— Olhe no olho do Nunes. Você vê verdade? Olhe no olho do Marçal, você vê alguma coisa que não seja vaidade?

Momento quente entre Boulos e Marçal

No embate mais tenso do debate até então, no final do terceiro bloco, Boulos cutucou Marçal diversas vezes, tentando associá-lo a João Doria e perguntou porque ele “odeia as mulheres”.

— O Marçal acusar alguém de extremista é igual à Suzane Richthofen acusar alguém de assassinato — disse Boulos.

O chefe de campanha de Marçal, Filipe Sabará, já fez parte da gestão de Doria na prefeitura de São Paulo.

— Por acaso ele é filho do Doria? O Doria pariu ele? [...] Você é um socialista de iPhone que recebeu 30 milhões do fundo eleitoral. Valdemar Costa Neto é o maior doador da campanha de Nunes, alvo do mensalão — disse Marçal, pedindo, ao fim, que a população vote em “alguém novo”.

Boulos aproveitou que Marçal subiu o tom e ironizou.

— Agora o lobo está aparecendo na pele de cordeiro. Ele junto o time do Doria com ele. [...] Outra coisa que queria te perguntar. Ficou claro seu desprezo pelas mulheres. Eu vi um vídeo seu dizendo que as mulheres teriam o crânio menor que o dos homens [...] Porque você odeia tanto as mulheres? — devolveu Boulos.

Marçal então subiu o tom contra o candidato do PSOL.

— Isso é um papinho de esquerdopata maluco. Sou casado com uma mulher. Quem não gosta de mulher é alguém aqui que tem B.O por agressão de violência doméstica, quer colocar na minha conta? [...] Não caia nessas falácias de Guilherme Boulos. Ele já foi preso — disse o empresário.

Eles voltaram a se enfrentar de forma ríspida na última parte do programa. O candidato do PRTB perguntou o que o adversário faria em casos de invasão de propriedade privada e o deputado devolveu defendo a atuação dos movimentos de moradia. Na sequência Marçal provocou o adversário.

— Você imagina alguém falando que quer descriminalizar polícia, drogas, que deve conhecer melhor a cidade na questão de biqueiras. Se você quer uma cidade segura, como vai votar um cara do PSOL? — disse Marçal.

O embate terminou com Boulos mostrando um exame toxicológico após o candidato do PRTB usar a palavra “biqueira”.

— Hoje mais uma vez ele tentou me associar ao uso de droga, de biqueira, fez isso outras vezes usando um homônimo. No debate passado usou uma passagem minha na adolescência de depressão tentando associar ao uso de droga. É um lobo em pele de cordeiro. Eu sou pai de duas filhas e não aceito ter a honra atacada desse jeito. Fiz o exame toxicológico, está subindo no Instagram. Agora faça o seu, Marçal — devolveu Boulos, sendo advertido por Tralli — pelas regras do debate, não é permitido mostrar objetos.

Discussão de Nunes e Boulos

Boulos acionou Nunes no quarto bloco com o tema das concessões para a iniciativa privada, mas focou em outro assunto, a quantidade de obras emergenciais, realizadas sem licitação pela prefeitura, em mais de R$ 5 bilhões entre 2021 e 2023. Boulos criticou o prefeito alegando que o modelo “favoreceu amigos”.

— O problema da sua gestão é a falta de transparência — disse Boulos.

Nunes desviou do ataque mencionando o parecer do deputado pelo arquivamento do processo contra André Janones, acusado de “rachadinha” no gabinete, no Conselho de Ética da Câmara. Falou ainda que o adversário seria a favor da liberação das drogas e da desmilitarização das polícias.

— Quem tem a digital, a caneta, quem apoia qualquer tipo de corrupção é você — rebateu Nunes.

Na réplica, Boulos acusou o prefeito de mentir, disse que considera rachadinha crime “independente de ser o Janones ou o Flávio Bolsonaro” e retomou a questão das obras, citando uma reportagem do site UOL que mostrou que Eduardo Olivatto, chefe de gabinete da Secretaria Municipal de Infraestrutura Urbana e Obras (Siurb), é ex-cunhado do traficante Marcola.

— O rapaz é funcionário de carreira, entrou por concurso em 1988, na gestão da Erundina (a ex-prefeita Luiza Erundina, eleita pelo PT). A irmã era casada com… Como é o nome do cara aí, o da criminalidade — respondeu Nunes. — Tenho tolerância zero com qualquer corrupção. Ele é chefe de gabinete, não mexe com nada em questão de licitação.

Último embate entre Nunes e Marçal

O embate final do programa ficou a cargo de Nunes contra Marçal, sob o tema das mudanças climáticas. O prefeito fez elogios à gestão, defendendo o monitoramento de focos de incêndio por câmeras e a criação de parques.

O ex-coach criticou a falta de universalização do saneamento básico na cidade, mandou um abraço para o governador Tarcísio de Freitas, aliado de Nunes, e mencionou propostas como a limpeza de rios e mananciais e para redução do fluxo de trânsito, incluindo teleféricos em comunidades.

Nunes falou na sequência sobre a substituição de ônibus a diesel por modelos elétricos, de forma a reduzir a emissão de poluentes, e justificou-se indiretamente pelo atraso na eletrificação da frota por problemas de fornecimento na indústria.

Marçal aproveitou a tréplica, sem possibilidade de resposta de Nunes, para citar as investigações que pesam sobre o prefeito a respeito da “máfia das creches” e lembrar o Boletim de Ocorrência registrado pela esposa do prefeito, Regina, em 2011, por supostas ameaças; ela depois negou o teor do documento e a polícia não abriu inquérito.

Considerações finais

Em suas considerações finais, Boulos destacou sua parceria com Marta e Lula e disse que a cidade “está enfrentando um risco” representado por Nunes e Marçal, ambos “apoiados pelo Bolsonaro”, segundo o psolista. Boulos cobrou mobilização de sua militância nos dias finais de campanha.

Tabata, ao se despedir, destacou sua atuação no Congresso e disse que “não está na vida pública a passeio”. Voltou a fazer apelos que remetem à sua trajetória de ex-moradora da periferia e pediu que os eleitores “não desistam” e acreditem que “dá tempo” de fazer com que ela avance para o segundo turno.

Datena relembrou as décadas de televisão para dizer que vê, há anos, “os mesmos problemas se repetirem” na cidade. “São problemas que eu combati a vida inteira, porque as promessas são sempre as mesmas” disse o jornalista, que mencionou de forma sutil o número do PSDB, o 45, e terminou dizendo: “você vota em mim se você quiser”.

Nunes iniciou rebatendo Marçal, que voltou a resgatar o prefeito sobre o Boletim de Ocorrência registrado pela esposa, Regina Carnovale. “Eu sou casado há 27 anos, tive um problema 14 anos atrás, fiquei um período separado da minha esposa”, disse Nunes, que também emendou chamando o adversário de “malvado e ruim”. O prefeito terminou citando vitrines da gestão, como os domingos tarifa zero e a faixa azul para motocicletas e disse que quer ser reeleito para “continuar avançando”.

Já Marçal disse que Nunes não consegue dar conta da cidade, porque não é gestor. O candidato ainda respondeu a Tabata Amaral, que havia dito que o gesso dele era falso. Por final, se dirigindo aos eleitores, falou "olha bem a sua mão esquerda, tem um traço, tem um M de mudança. Esses caras me humilharam e eu estou aqui forte".