Internacional
De diplomata a exilado político na Espanha: Vida de opositor González é virada do avesso desde que aceitou substituir María Corina
Expectativa de rival de Maduro era passar o resto da vida em Caracas, mas agora não sabe quando voltará; ex-candidato é alvo de mandado de prisão e acusado de cinco crimes

Alvo de mandado de prisão, o opositor Edmundo González, principal rival do ditador Nicolás Maduro nas eleições de 28 de julho, deixou a Venezuela no sábado e viajou rumo à Espanha em busca de asilo político. O ex-diplomata estava na clandestinidade há mais de um mês e, apesar de buscar abrigo "de casa em casa", segundo seu advogado, entendeu que não havia mais local seguro no país após o governo Maduro revogar a autorização para que a Embaixada da Argentina em Caracas, que abriga opositores venezuelanos, tenha custódia do Brasil no país. Um furacão político que, até pouco tempo atrás, era inimaginável em sua vida.
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No início do ano, González era um aposentado de 74 anos (faltavam meses para completar 75) desconhecido da maior parte do país, que lia à tarde na poltrona de sua sala de estar, escrevia livros que não aspiravam a best-sellers sobre personagens quase anônimos, brincava com seus netos e caminhava com sua esposa pelas ruas de Caracas. Juntos, eles alimentavam e davam água às araras que pousavam em sua varanda todas as manhãs. O casal desfrutava de uma vida tranquila no inverno de suas vidas. Tudo mudou em abril.
A líder absoluta da oposição, María Corina Machado, foi inabilitada politicamente pela Justiça venezuelana, controlada pelo chavismo, e tornada inelegível por 15 anos em junho de 2023 — o que não a impediu de vencer por ampla margem as primárias da oposição. No Palácio de Miraflores, a residência presidencial, eles estavam convencidos de que, ao tirar María Corina da equação, não havia obstáculo que impedisse a reeleição de Maduro, sucessor de Hugo Chávez, até 2030. Só ela estava ofuscando o presidente nas pesquisas.
De repente, em um movimento que desequilibrou a todos, María Corina cedeu sua candidatura a uma filósofa, historiadora de prestígio e torcedora do Real Madrid, Corina Yoris. A oposição, que na época parecia desarmada pelo chavismo, viveu um momento de otimismo, quase de êxtase. Essa estratégia já havia sido usada antes em uma região venezuelana, em Barinas: para cada candidato desqualificado, outro, e outro, e outro, e assim por diante, até que o chavismo não tivesse outra escolha a não ser aceitar um. Em Barinas, isso funcionou, e um candidato da oposição está agora governando a região.
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Quando Yoris parecia ser a pessoa que concorreria contra Maduro nas eleições presidenciais, as autoridades eleitorais a desqualificaram sem nenhum motivo — a historiadora nunca ocupou nenhum cargo público nem tinha contas pendentes com a Justiça. María Corina então pensou em González, um homem discreto e bem-educado que havia sido diplomata e operador político da oposição clássica, quase sempre nas sombras.
'Não tenho medo'
Quando jovem, González tinha um caráter mais irritadiço que, de acordo com aqueles que o conheciam, ele modulou com o passar dos anos. E parece ter dado certo: foi descrito atualmente por seus colaboradores como "incapaz de perder as estribeiras". Como todo diplomata, é conciliador, além de muito culto e estudioso.
Quando a oferta foi feita a ele, Edmundo disse não, que deveriam encontrar outra pessoa. Sua esposa, Mercedes López, também achou uma loucura. Enfrentar o chavismo em um contexto político como o da Venezuela era embarcar em uma aventura com consequências desconhecidas. No final, ele cedeu.
— Não tenho medo — disse em uma entrevista ao jornal El País.
González aceitou a liderança de María Corina com naturalidade e estava ciente desde o início de que seu capital político era herdado de uma política que havia conseguido uma mobilização antichavista de enormes proporções na Venezuela. Começaram a circular memes com o slogan "Edmundo para todo mundo" e "todo mundo com Edmundo". Ele começou a ser chamado carinhosamente de "el viejito" (o velhinho) de maneira carinhosa. Para colaboradores e familiares, porém, é Egu. Ele andou com María Corina por todo o país e, em questão de semanas, não havia um venezuelano que não o conhecesse.
Maduro, que inicialmente o havia recebido com desdém, começou a perceber que González era um adversário mais difícil do que ele imaginava.
Sem previsão de volta
A dupla Edmundo-María Corina trabalhou e conseguiu uma grande mobilização no dia da eleição, 28 de julho. Por desconfiarem do chavismo, eles distribuíram voluntários nas seções eleitorais de todo o país para coletar todas as folhas de apuração possíveis, onde o resultado é discriminado. À meia noite, o Centro Nacional Eleitoral (CNE) venezuelano, controlado pelos chavistas, anunciou Maduro como vencedor, mas sem mostrar as atas, conforme exigido por lei.
Ao mesmo tempo, os ativistas da oposição começaram a fazer o upload dos resultados que haviam coletado em um site, e o resultado foi completamente diferente: González quase triplicou a vantagem de Maduro. A comunidade internacional começou a exigir que o chavismo mostrasse provas de sua vitória, mas até o momento isso não aconteceu. Os Estados Unidos e outros países já declararam González o vencedor e consideram Maduro um usurpador.
A resposta do governo foi prender mais de 2 mil pessoas, quase todas elas sob acusações vagamente definidas como "terrorismo". Os colaboradores e assessores de María Corina também foram perseguidos e presos pelo Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin). O cerco contra González era apenas uma questão de dias. Há cinco, a promotoria emitiu um mandado de prisão contra ele pela publicação das atas no site que ele nem sequer projetou ou gerenciou, tudo isso foi preparado muito antes de ele ser eleito candidato. Não importava: a sombra da Justiça chavista já estava pairando sobre ele.
González planejava passar o resto de sua vida em Caracas, mas agora está atravessando o Atlântico para a Espanha, onde o exílio o aguarda. Ele não tem certeza se algum dia verá a Venezuela com seus próprios olhos novamente.
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