Economia

Mudanças climáticas exigem planejamento urbano de qualidade

Especialistas recomendam melhorias nas condições de moradia, universalização do saneamento e recuperação de áreas degradadas

Agência O Globo - 23/08/2024
Mudanças climáticas exigem planejamento urbano de qualidade
Mudanças climáticas exigem planejamento urbano de qualidade - Foto: Reprodução / internet

A universalização do saneamento básico, a reabilitação das cidades e a melhoria das condições habitacionais estão no centro da agenda de construção de infraestrutura urbana de qualidade, inclusiva e resiliente às mudanças climáticas.

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Essa agenda requer enfrentamento dos desafios relacionados ao planejamento e execução de projetos consistentes de longo prazo, a disponibilidade de recursos financeiros para viabilizar investimentos e criação de um ambiente favorável ao envolvimento crescente de agentes privados.

A questão climática ganha relevância. Com infraestrutura urbana precária e alta densidade demográfica, muitas cidades estão vulneráveis a ocorrências extremas, mais frequentes.

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Dados do Censo 2022 do IBGE apontam que 124,1 milhões de brasileiros (61% da população total) vivem em cidades e que dos 20 municípios mais populosos, 17 são capitais.

Os efeitos das variações do clima podem ser mais danosos para quem vive em condições precárias e não tem acesso aos serviços públicos básicos, diz Maria Caldas, colaboradora sênior do Iclei, rede mundial de mais de 2,5 mil governos locais, cujas atividades incluem a análise das vulnerabilidades das cidades em relação aos eventos climáticos.

— Embora a questão climática impacte a cidade como um todo, como se viu no Rio Grande do Sul, é claro que a população mais vulnerável sofre mais — enfatiza.

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Risco generalizado

O risco climático é alto em todo o país, observa Andrea Santos, professora do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ).

Para a professora, o enfrentamento dos desafios climáticos para construção de infraestrutura urbana resiliente passa por uma gestão ambiental que enfatize a busca por soluções baseadas na natureza.

— Tornar cidades mais verdes traz como benefícios a melhoria da qualidade do ar e a redução dos efeitos de ondas de calor. E não custa muito comparado com as obras de engenharia de reabilitação urbana —assegura.

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Programas de moradias populares contribuíram para a expansão desordenada das cidades porque as unidades habitacionais foram construídas em áreas periféricas, onde o valor do terreno é mais baixo, como forma de rentabilizar o empreendimento.

A nova versão do programa Minha Casa, Minha Vida corrige o problema, pois exige que os novos empreendimentos estejam conectados à malha urbana existente, afirma Caldas.

A reocupação de áreas abandonadas nos centros das cidades tem potencial para frear a expansão urbana desordenada e ajudar na redução do déficit habitacional, de 6,215 milhões de domicílios, ou 8,3% do total dos domicílios particulares ocupados no país, segundo a Fundação João Pinheiro.

— É possível fazer projetos de moradia para quem ganha de um a três salários mínimos — exemplifica Luiz Firmino, pesquisador do Centro de Estudos e Regulação em Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas (FGV Ceri).

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O cenário ideal, segundo Firmino, é que as pessoas residam em áreas servidas por boa infraestrutura urbana e perto do emprego, para evitar que fiquem muito tempo no trânsito.

Adaptação a mudanças

Firmino sugere que os programas habitacionais sejam alinhados à mudança do perfil da moradia, ou seja, como o número de integrantes por família está diminuindo, a busca por unidades habitacionais menores tende a aumentar. Outro aspecto importante diz respeito à necessidade de adaptação dos edifícios residenciais e dos equipamentos urbanos ao envelhecimento da população.

Recursos financeiros para projetos de infraestrutura urbana resiliente podem ser obtidos junto ao Fundo Verde Climático, por exemplo, criado no âmbito do Acordo de Paris, em 2015, que dispõe de US$ 100 bilhões.

Outras duas opções são o Fundo de Adaptação e o Fundo de Perdas e Danos, que foram desenhados para apoiar ações de combate a mudanças climáticas em países menos desenvolvidos, mas ambos ainda estão em fase de negociação, segundo Andrea Santos.