Internacional
Funcionários testemunharam vários atos de violência de Alberto Fernández contra a ex-mulher na residência oficial da presidência
Trabalharam na villa presidencial e revelaram episódios específicos ao LA NACION; Embora estivesse em vigor um acordo de confidencialidade, eles seriam convocados para testemunhar no processo judicial

Alberto Fernández desceu do helicóptero presidencial na Quinta de Olivos e ignorou o chalé. Ele se dirigiu à casa de hóspedes, onde morava a primeira-dama, Fabiola Yáñez, de quem já estava separado de fato. Não queria vê-la, mas sim o filho deles, Francisco. Mas algo aconteceu. Gritos foram ouvidos, e o incidente terminou com ele puxando o cabelo dela e segurando-a pelo braço, seguidos pela mãe dela.
Leia mais: Acusado de agredir a ex-mulher, Alberto Fernández é alvo de busca e apreensão na Argentina
Pelo menos duas pessoas presenciaram o incidente: um militar - ainda em atividade - e o então administrador do local de Olivos, que se interpôs entre o então Presidente e a então Primeira-Dama, os separou e levou Fernández para longe dali em um carrinho de golfe, até que ele se acalmasse, segundo a reconstrução feita pelo jornal LA NACION nos últimos dias
No entanto, esse não foi o único incidente registrado na Quinta de Olivos, o local mais controlado da Argentina, onde prevalecem a lealdade à Presidência, os acordos de confidencialidade laboral, a obediência militar devida, o medo de enfrentar o poder e sofrer represálias, e a conveniência do silêncio. Mas isso começa a se deteriorar.
"Não estamos falando de uma casinha isolada em uma montanha dos Andes. Na Quinta, trabalham, entram ou saem cerca de 200 pessoas por dia... e todos sentíamos o clima hostil que se respirava ali dentro", resumiu um ex-funcionário que visitava o local diariamente, durante anos, e que só aceitou falar com o jornal sob estrita reserva de seu nome. "Eu não presenciei nada, juro. Mas, se agrediram Fabiola, alguém deve ter visto, no momento, imediatamente depois ou nos dias seguintes."
(LA NACION procurou entrar em contato com Yáñez, por meio de seus advogados, e com Fernández, por telefone celular, mas até o fechamento desta edição não foi possível contatar nenhum dos dois).
A lista, por si só, é eloqüente. No local trabalham agentes da Polícia Federal, 60 militares que integram o Regimento de Granadeiros, profissionais da Unidade Médica Presidencial, funcionários civis da administração, cozinheiros, garçons, pessoal do serviço de limpeza terceirizado, além de jardineiros, motoristas, funcionários que acompanham o Presidente e o círculo íntimo da Primeira-Dama. Em diferentes momentos, incluiu uma equipe de imprensa - porta-vozes, cinegrafistas e fotógrafos -, motoristas e seguranças, além de pessoal dedicado ao vestuário, maquiagem e penteado.
A lista não termina aí. Aos agentes da Polícia Federal que protegem o perímetro externo da Quinta e aos soldados, suboficiais e oficiais dos Granadeiros posicionados em 17 pontos diferentes do local para evitar "pontos cegos", somam-se as patrulhas, 24 horas por dia, e os seguranças designados para situações específicas. E a tudo isso se acrescentam os sensores a laser e as câmeras de vigilância.
Nesse contexto de segurança e sigilo, o guardião dos segredos daquele casal presidencial é o então administrador do local, Daniel Rodríguez, conforme todos os consultados pelo LA NACION concordaram. Trata-se de um ex-policial que se tornou assistente pessoal de Alberto Fernández desde os tempos em que ele ocupava a Chefia de Gabinete durante as presidências de Néstor Kirchner e Cristina Fernández.
"Rodríguez fez o papel de 'presunto no sanduíche' entre Alberto e Fabiola, muitas vezes. Quando eles nem se falavam mais, ele intermediava entre os dois", explicou outro ex-funcionário, que estimou que o casal começou a se deteriorar durante a quarentena, em 2020, até resultar em uma separação de fato: ele morava no chalé; ela e o filho dos dois, na casa de hóspedes.
(LA NACION tentou entrar em contato com Rodríguez em seu telefone celular, mas ele não respondeu às mensagens via WhatsApp).
Um dos advogados de Yáñez, Mauricio D’Alessandro, seguiu essa linha, ao tentar justificar a festa que foi organizada em Olivos, durante a quarentena, para o aniversário da Primeira-Dama, e que gerou uma onda generalizada de reprovação. Segundo ele, a festa foi uma tentativa das amigas de apoiá-la em um momento difícil.
"As amigas sabiam dos episódios de violência", afirmou D’Alessandro em declarações à rádio. "Sabiam que viviam em casas separadas, [e ela] na casa de hóspedes. Sabiam que ela não tinha contato com Alberto. E sabiam que muita gente ia à casa [que Fernández ocupava] e tocava violão até tarde com Alberto", acrescentou, para depois afirmar que "havia um problema de álcool transversal". Ou seja, de ambos.
Os familiares e amigas de Yáñez que poderiam testemunhar perante o juiz federal Julián Ercolini e o promotor federal Carlos Rívolo poderiam ser acompanhados por outras potenciais testemunhas. Entre elas, um cozinheiro designado para a casa de hóspedes e uma mulher que cuidava do cabelo da então Primeira-Dama. Elas poderiam relatar outros episódios ou suas consequências, visíveis no corpo de Yáñez. Mas, até agora, ninguém se apresentou aos tribunais.
"Não é possível que ninguém tenha visto [Yáñez] com hematomas, se Fernández a agrediu", argumentou outro veterano da Quinta, que trabalhou durante duas presidências. "Como seria isso? Ela se esconderia em um quarto durante dias, sem que o cozinheiro, nenhum assistente, nenhum parente, nem o pessoal de limpeza ou a Unidade Médica Presidencial a vissem? É impossível!"
Da mesma forma, se Yáñez se refugiou com o bebê na Casa de Hóspedes, às quatro da manhã de um dia de semana, após outro suposto episódio de violência, como foi vazado por seu círculo íntimo, um ou mais sentinelas terão de comparecer ao tribunal. "Essa casa fica a trinta metros do chalé, onde mora o Presidente, e onde há segurança permanente. Não há como ela ter percorrido essa distância sem ser vista", relatou um ex-integrante dessa segurança.
Os promotores federais Carlos Rívolo e Ramiro González já estariam cientes de algumas possíveis testemunhas que estão avaliando se devem se apresentar nos tribunais, segundo fontes judiciais informaram ao LA NACION. Mas a concretização disso está condicionada por vários fatores, entre eles, o medo de eventuais represálias no trabalho. Além disso, muitos funcionários da Quinta assinaram acordos de confidencialidade. Comprometeram-se a manter silêncio sobre tudo o que veem e ouvem ali. E os militares que integram o Corpo de Granadeiros sentem-se sujeitos à obediência devida, ao dever de lealdade e ao código de honra da Casa Militar, do Exército e da Presidência.
"Para que fique claro: se algo aconteceu, o soldado que viu deve relatar isso ao seu superior imediato, que avaliará os passos a serem tomados. Mas o soldado não pode contar a mais ninguém o que aconteceu, a menos que se trate de um crime gravíssimo", resumiu um oficial da Casa Militar, já aposentado, levantando uma questão. Quão grave deve ser o crime que esse soldado, suboficial ou oficial presenciou para arriscar sua carreira? Porque essa é uma certeza entre os uniformizados: quem falar será aposentado. Ou passará por dificuldades.
Perguntas semelhantes surgem entre os funcionários civis da Quinta, que, ao entrar no local, devem deixar seus telefones celulares em um lugar pré-designado, em um esforço da segurança para garantir certa privacidade ao Chefe de Estado e, se houver, à sua família. Aquele que testemunhar perante a Justiça sobre o que viu ou ouviu preservará seu emprego ou se tornará um pária a partir desse momento?
Algumas dessas limitações não se aplicam, no entanto, a alguns membros do antigo círculo íntimo de Yáñez. Aqueles que foram seus porta-vozes ou maquiadores, entre outros, não assinaram acordos de confidencialidade, conforme confirmaram duas fontes desse círculo, separadamente, ao LA NACION.
Nesse sentido, a atuação da segurança presidencial e dos demais que trabalham na Quinta de Olivos já está sob escrutínio judicial. O partido Republicanos Unidos, que inclui o legislador Yamil Santoro e o ministro de Desenvolvimento Econômico de Buenos Aires, Roberto García Moritán, entre outros, apresentou uma denúncia por suposta violação dos deveres de funcionário público, que ficou nas mãos do juiz federal Marcelo Martínez de Giorgi.
Dadas as características específicas que envolvem a violência de gênero, assim como o abuso de menores e outros crimes que o atual ministro da Suprema Corte de Buenos Aires, Sergio Torres, define como crimes "de sombra" ou "de escuridão", os promotores Rívolo e González terão que se basear em indícios diretos ou indiretos que lhes permitam verificar as afirmações de Fabiola Yáñez, que já estava grávida quando alguns dos incidentes teriam ocorrido; outros coincidem com a revelação pública da festa de Olivos, entre 12 e 13 de agosto de 2021. "Entre ontem e hoje, você me bateu", a então Primeira-Dama repreendeu o Presidente por esses dias.
Além disso, uma das primeiras pessoas que pode ser convocada a depor nos tribunais seria a então secretária particular de Fernández, María Cantero. As mensagens de Whats
Mais lidas
-
1ORIENTE MÉDIO
Guerra com Irã pode arrastar os EUA para a 3ª Guerra Mundial, diz ex-assessor do Pentágono
-
2SEGURANÇA
Adolescente desaparecida em Palmeira dos Índios é encontrada com vida
-
3ATAQUES
Israel ataca Iêmen para atingir líderes houthis em reunião secreta, dizem fontes
-
4DESAPARECIMENTO
Desaparecimento de jovem mobiliza Polícia em Palmeira dos Índios
-
5EUA
Trump realiza desejo de desfile militar, que ocorre com tranquilidade apesar de protestos