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Mateus Solano estreia monólogo como figurante e comenta exposição nas redes: 'Quem se mete em confusão é porque quer'
Artista estrela primeiro solo de sua carreira, em peça com dramaturgia criada com os colegas Miguel Thiré e Isabel Teixeira

A história dá voltas no cérebro de Mateus Solano há pelo menos dez anos. Na mesma época em que ganhou projeção nacional na pele do vilão Félix, da novela “ Amor à vida” (2013), o ator — que até hoje é abordado pelo nome do personagem nas ruas (“Muita gente ainda não sabe como eu me chamo”, ele diz) — começou a pensar, sem grandes pretensões, numa narrativa sobre o dia a dia de um figurante. O cerne da confabulação estava em questões que “mexem” com o artista, como ele aponta: de um lado, a necessidade generalizada da sociedade por visibilidade e aceitação, algo reforçado com o advento das redes sociais; de outro lado, a perda progressiva das singularidades de cada pessoa num mundo de comportamentos pasteurizados (e ditados) por modismos da web.
— A gente vive quase sempre como funcionário de uma rede social para se validar perante os outros. Com isso, vem a nossa invisibilidade como indivíduos autênticos — discorre o ator. — Isso tudo é como uma figuração que a gente faz.
Parte dessas divagações está sublinhada em “O figurante”, obra que finalmente deixa de ser uma “ideia solta” na cabeça do artista para ganhar os palcos, a partir desta sexta-feira (19), em temporada que se estende até 3 de novembro no Teatro Fashion Mall, em São Conrado, na Zona Sul do Rio de Janeiro.
Estrelado por Solano, o monólogo é resultado de um longo processo realizado a seis mãos — nos últimos quatro meses, entre Brasil e Portugal —, junto ao diretor Miguel Thiré e à atriz Isabel Teixeira, com quem o ator fez par romântico na recente novela “ Elas por elas” (2023). Foi Isabel quem impulsionou a criação coletiva do texto, através de exercícios de improvisação ancorados num método batizado de “escrita na cena”.
Redemoinho de ego
No tablado nu, valendo-se apenas de corpo e voz, Mateus Solano dá vida a Augusto, figurante orgulhoso do próprio ofício que embarca numa roda-viva entre a loucura e a melancolia após perceber, a partir da indiferença alheia, que não significa nada para quem o cerca. O espetáculo é uma homenagem a Augusto Mucke — figurante “conhecido” no audiovisual brasileiro, que morreu em 2023 — e deve ser adaptado para o cinema em breve, marcando a estreia do ator no posto de diretor.
— Na história, Augusto é um figurante que ensaia vários tipos em casa, mas chega no trabalho e ouve pedidos para só ficar quieto e sorrir — explica o ator. — Essa disparidade entre a nossa potencialidade e o que a gente acaba se acostumando a exercer no dia a dia é um pouco o tema da peça. O personagem vai se revoltando contra esse “estar invisível”. E ele acaba envolto num redemoinho do próprio ego.
Solano avisa que tem vivido uma “montanha-russa de emoções” em sua estreia solo (“Sempre achei um disparate estar sozinho no palco, e vejo agora que isso é vertiginoso”, avalia). É esse espaço, onde mais desenvolve sua “musculatura artística”, como frisa, que o ator pretende ocupar até o fim do ano. Por ora, nada de novelas ou séries. Ele crê que a maneira como o tempo corre nos tablados é outra — sem uma certa afobação associada a trabalhos nas telas.
'Prazer rápido'
Para Solano, a discussão sobre o papel de influenciadores digitais nas artes se relaciona, de certa maneira, com a imagem do figurante que ele encarna no teatro.
— Como todos nós somos hoje um pouco atores e protagonistas de si com um celular na mão, a ideia de “espetáculo” banalizou. É claro que isso é prejudicial para a categoria de artistas que têm alguma coisa a dizer além de aumentar o nível de endorfina dos outros por 15 segundos — analisa. — Numa sociedade que precisa de prazer rápido, não há mais a alegria de escutar uma sinfonia. Ouve-se um negócio de 15 segundos e depois outro negócio de 15 segundos... As pessoas vão colocando seus corações numa coisa e depois em outra, em outra, e por aí vai. E elas vão se sacudindo o dia inteiro! Isso é completamente diferente do trabalho artístico, que vai mais na onda do tempo da natureza.
Nas redes sociais, o ator quase sempre opta pelo silêncio diante de polêmicas, provando que dá para ser figurante ali, apesar da fama.
— Tem gente que pensa: “Ah, mas vou ficar calado?” Sim, vai sim! Por que não? Quem se mete em confusão é porque quer — enfatiza ele, casado há 15 anos com a também atriz Paula Braun, com quem tem os filhos Benjamin, de 8 anos, e Flora, de 12.
Alguns temas lhe são caros, como o valor do ator. Solano gostaria que ele e seus colegas atores fossem remunerados mais ou menos nos moldes do que acontece com compositores e intérpretes de músicas, por meio do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad). Ele se surpreende com a reprodução descontrolada do trabalho de artistas na internet, algo tracionado sobretudo com o aperfeiçoamento da inteligência artificial:
— Nossa figura vai sendo rifada por aí. A lei atual não considera que nós, atores, somos “compositores” dos personagens. É como dizer que, se fosse qualquer ator fazendo Félix, seria sempre a mesma coisa. E não, não seria!
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