Internacional
'Pachajchos': general envolvido em tentativa de golpe seria líder de grupo militar acusado de elaborar plano contra Evo Morales
Existência de organização voltada para ações de inteligência foi confirmada pelo próprio general Juan José Zúñiga, em 2022;
Apontado como o nome por trás das mobilizações de tropas e tanques que tomaram a frente da sede da presidencial em La Paz, na Praça Murillo, o general Juan José Zúñiga já foi acusado por Evo Morales de fazer parte de um grupo dentro das Forças Armadas do país que atuava contra o ex-presidente, o ''Pachajcho''. Zúñiga acabou preso após a tentativa fracassada de golpe, nesta quarta-feira.
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Morales, presidente da Bolívia entre 2006 e 2019, já havia entrado em conflito com Zúñiga antes do episódio desta semana. Em 2022, ele acusou o general de liderar o grupo militar "Pachajcho", responsável por monitorar e perseguir políticos locais, entre eles, o próprio ex-presidente.
Evo Morales acusou o general de ser o nome por trás de um ''plano negro" para desacreditá-lo. Na época, o governo boliviano negou a existência desses planos.
"É preciso ter cuidado com o grupo Pachajcho, organizado pelo chefe do Estado-Maior do Exército (Zúñiga). Militares que estão atrás de Evo, atrás dos dirigentes, perseguição permanente. A qualquer momento, este grupo Pachajcho do Exército vai montar provas, quero adiantar-lhes, alertar o povo", disse Morales, em outubro daquele ano.
Em novembro de 2023, Morales publicou no X, antigo Twitter, que Zúñiga, em uma reunião solicitada por ele:
"O Comandante Geral do Exército, Juan José Zúñiga, em 2021 solicitou uma reunião por meio de seus camaradas. Quando veio, ele me informou e disse 'Irmão Presidente, sei que você gosta de charque, da próxima vez eu vou trazer'. Agora, em reuniões internas com seu grupo "pachajchos", ele fala em eliminar fisicamente nós. Se ele afirma que não há mais Kalimanes, que se apresente ao Ministério Público e declare o que sabe sobre a participação e conspiração de seu ex-comandante geral no Golpe de Estado", escreveu.
No último domingo, o ex-presidente afirmou ter vídeos e áudios que mostram que o Comandante do Exército estava planejando sua eliminação e a de seus colaboradores mais próximos, mas não apresentou provas nesse sentido.
"Esse senhor é um verdadeiro mitômano, usa a mentira como estratégia para retornar ao poder", retrucou Zúñiga no programa de televisão. Em seguida, ele afirmou que os militares não permitiriam que Morales retorne ao poder. Um dia depois, Zúñiga foi destituído de seu comando, e nesta quarta-feira ele se levantou em armas em uma tentativa de golpe fracassada.
Ao jornal El Deber, o coronel da reserva e advogado boliviano Jorge Santistevan afirmou que os "pachajchos" são "um grupo de poder dentro do Exército, liderado pelo ex-comandante do Exército Hugo Arandia e pelo general (Juan José) Zúñiga". Ao veículo de imprensa boliviano outras fontes militares também confirmaram a existência do grupo, que teria sido criado durante o governo de Evo Morales com foco na inteligência militar.
"O grupo 'Pachajchos' é formado por excelentes oficiais, suboficiais e sargentos que atuam no Estado-Maior. Eles também são vítimas de mentiras e calúnias. Eles trabalham para o país, para a instituição", disse o general Zúñiga, segundo o jornal El Deber, em janeiro de 2022, meses antes da acusação de Morales.
Segundo Santistevan, o grupo se consolidou atuando contra o contrabando nas fronteiras bolivianas durante a gestão Jeanine Áñez. "Pachajchos" é um termo usado para se referir a caminhões de grande porte, capazes de transportar grandes quantidades de mercadorias. A proximidade do grupo com a questão do contrabando chegou a suscitar questionamentos por parte da parlamentares.
Em 2022, o deputado Alberto Astorga, do partido Comunidad Ciudadana (CC), do ex-presidente Carlos Mesa, chegou a declarar que "não nos interessa se eles seguem Evo Morales ou líderes opositores". Os pachajchos devem "ser investigados por sua ligação com o tema do contrabando, se manejam altas somas de dinheiro e se coordenam com as máfias do contrabando", disse o deputado.
Quem é Zúñiga?
Membro do alto escalão do Exército boliviano, Zúñiga atuava como Comandante Geral desde 2022 até sua demissão nesta semana, segundo o jornal boliviano El Deber. Controvérsias e acusações diversas fazem parte da carreira do militar. Enquanto ocupava o cargo de Chefe do Estado-Maior, por exemplo, ele foi identificado por Evo Morales como um dos nomes envolvidos em um suposto plano para perseguir lideranças políticas.
Nesta segunda-feira, Zúñiga, durante uma entrevista na televisão, disse que Morales não poderia mais ser o presidente do país . O militar declarou que não permitira "que a Constituição fosse pisoteada, que desobedecesse ao mandato do povo".
Evo Morales criticou as declarações feitas pelo militar em uma publicação no X, antigo Twitter. "O tipo de ameaças feitas pelo Comandante Geral do Exército, Juan José Zúñiga, nunca ocorreu em democracia. Se não forem desmentidos pelo Comandante-em-Chefe das Forças Armadas, Ministro da Defesa, Presidente e Capitão General das Forças Armadas, ficará provado que o que estão realmente a organizar é um autogolpe", escreveu Morales nesta terça-feira.
"Sou um militar de honra que está disposto a sacrificar sua vida pela defesa e pela unidade da Pátria. Nossa pátria, mais uma vez, está sob a ameaça de inimigos internos e externos que buscam a divisão, a desestabilização e o ódio entre os bolivianos, para se apoderarem dos recursos naturais em benefício de interesses mesquinhos e de grupos de poder que respondem ao caudilhismo.", disse o militar ao jornal El Deber ao responder as críticas de Evo Morales.
O general também já foi acusado de envolvimento em escândalos de corrupção, como o desvio de até 2,7 milhões de bolivianos destinados a programas sociais. Ele e outros 12 militares foram sancionados com sete dias de prisão pelo caso em 2014.
Em janeiro de 2024, Zúñiga foi descrito como um "especialista em inteligência militar" e um "espião a favor do governo", com conhecimento dos movimentos de políticos bolivianos, pelo jornal boliviano El Deber. O militar também teria ligações com movimento sindicais, sendo chamado de "general do povo" e tende participado em eventos de diferentes organizações ao longo dos anos.
“É um general muito querido por nós, dirigentes. Chamamos ele de general do povo, é muito próximo ao povo e tem uma ótima coordenação com os movimentos sociais”, disse ao jornal boliviano um dirigente sindical ligado ao setor de mineração.
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