Internacional
Com margem estreita e em meio a protestos, Milei tenta aprovar pacote de reformas-chave no Senado
Analistas acreditam que votação sobre a Lei de Bases pode terminar empatada, e discussão deve se estender até a quinta-feira; cinco deputados foram hospitalizados
O presidente da Argentina, Javier Milei, tentará nesta quarta-feira (e provavelmente na quinta-feira) obter talvez sua maior vitória no Congresso desde que assumiu o cargo há seis meses: o Senado começou a analisar o projeto de Lei de Bases, traz ousados planos de reforma do Estado. A proposta inicial, com mais de 600 artigos, foi rechaçada em fevereiro, desidratada e aprovada pela Câmara em abril, e mesmo depois de meses de negociações o resultado final é incerto. Nas ruas próximas, houve confronto entre policiais e manifestantes, e ao menos 40 pessoas precisaram de atendimento médico.
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Milei chega ao plenário com uma margem mínima. Horas antes do início do debate, dois senadores da província de Santa Cruz, José Carambia e Natalia Gadano, disseram que não dariam quórum à sessão, impedindo a abertura dos trabalhos, e exigindo que ao menos dois senadores atuassem para garantir o prosseguimento dos debates.
— O esforço dos argentinos nestes meses é colossal, esperamos (com esta lei) lançar as bases do progresso — disse em seu discurso de abertura o senador governista Bartolomé Abdala, ao defender o projeto do Executivo.
A contenção dos focos de rebeldia não veio de graça. Assim como na Câmara, havia críticas ao texto aprovado pelos deputados, e os negociadores da Casa Rosada precisaram fazer novas concessões. Uma das mais importantes foi a retirada da Aerolineas Argentinas, dos Correios e da Rádio e Televisão Argentina da lista de empresas estatais da lista de privatizações.
O governo ainda se comprometeu a finalizar obras públicas que estejam com mais de 80% dos trabalhos concluídos ou que tenham financiamento internacional — logo depois de assumir, em dezembro do ano passado, Milei suspendeu todas as obras do Estado como parte de seu choque econômico o que levou a uma crise entre as empreiteiras locais. Organismos estatais que não estejam incluídos nas reformas do presidente libertário não terão seus orçamentos reduzidos, segundo o acordado nesta quarta. Por outro lado, ele conseguiu manter alguns dos poderes para tomar decisões de cunho econômico, administrativo, energético e financeiro sem precisar do aval do Legislativo.
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Anunciada com pompa no final do ano passado, e inicialmente com mais de 600 artigos, a outrora conhecida como “Lei Ônibus” foi derrotada no Congresso em fevereiro, mesmo depois de perder quase metade de suas provisões. O plano inicial previa uma liberalização radical da economia, a derrubada de leis, privatizações e até mudanças em mecanismos como o divórcio. Após meses de negociações, concessões e ameaças, a Câmara aprovou a agora rebatizada Lei de Bases, que trazia 232 artigos, 432 a menos dos apresentados no final do ano passado, abrindo caminho para a votação no Senado.
— Eles passaram seis meses discutindo a Lei de Bases, que teria feito o ajuste ser menos doloroso, mas para a política isso não importa — disse Milei, durante um fórum econômico, em uma crítica ao que vê como demora do Legislativo para aprovar seu pacote.
A sessão desta quarta-feira está prevista para ser longa, assim como as que ocorreram na Câmara em abril e em fevereiro, quando o texto foi retirado da pauta a pedido do próprio governo, depois de uma série de derrotas. A Lei de Bases será a primeira a ser debatida, e deve ser votada em termos gerais ainda na noite desta quarta-feira, para que depois sejam apreciados os artigos.
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Diante da margem estreita, analistas não descartam um empate em 36 votos a favor e 36 contra, um cenário raro e que poderia depender da vice-presidente Victoria Villarruel, que também é a presidente da Casa, para ser resolvido. Segundo o regimento interno, caso isso aconteça, uma nova discussão e uma nova votação devem acontecer logo após o empate. Se o resultado for o mesmo, cabe a Villarruel o voto de minerva.
Em seguida serão votados os artigos de forma separada, e alguns dos pontos nos quais o governo cedeu eram considerados derrotas certas, como a presença da Aerolineas Argentinas na lista de privatizações.
No começo da tarde, quando os senadores e emissários do governo debatiam o formato das discussões e votações, a associação local de aeroviários publicou uma foto de um grupo de sindicalistas reunidos com o Papa Francisco e portando duas bandeiras da companhia aérea.
A segunda etapa, que provavelmente ficará para a manhã de quinta-feira, é o debate e a votação do chamado pacote fiscal, que traz medidas também discutidas pelos senadores, como as mudanças no regime de regularização de bens não declarados no exterior, que eleva o limite isento de multa, na cobrança de imposto sobre bens e capitais, e de regularização de dívidas com o Estado. A expectativa é a mesma, de uma votação apertada e com possibilidade de empate, e negociações de última hora não estão descartadas. Como os projetos sofreram alterações, eles deverão retornar à Câmara para aprovação definitiva.
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Se o clima dentro do Congresso era quente, do lado de fora houve confrontos intensos entre manifestantes contrários ao governo e as forças de segurança. Bombas e coquetéis molotov foram arremessados de lado a lado, e cinco deputados que participaram do ato foram hospitalizados após inalarem gás lacrimogêneo.
— É um dia muito violento, em 40 anos de democracia nunca tinha visto uma repressão assim — disse a deputada opositora Cecilia Moreau à AFP. Além dos parlamentares, outras 40 pessoas precisaram de atendimento, de acordo com os manifestantes. A polícia também usou água com corante para identificar pessoas acusadas de promoverem ataques. O veículo de uma rádio de Córdoba foi incendiado durante o tumulto.
Pontos da lei, como as mudanças nas regras trabalhistas, as privatizações e os superpoderes concedidos a Milei são atacados por sindicalistas, partidos de esquerda e organizações setoriais, como os professores e aposentados. Além da manifestação, algumas organizações convocaram uma greve para esta quarta-feira.
— Não podemos acreditar que na Argentina estejamos discutindo uma lei que nos leva 100 anos para trás — afirmou à AFP Fabio Núñez, um advogado de 55 anos que participava do ato.
Em meio aos relatos de violência, alguns senadores de oposição propuseram paralisar a discussão para que os parlamentares tentassem intermediár uma trégua.
— Vários senadores se comprometeram a sair em defesa das pessoas que se manifestam. É uma operação de segurança liderada pela Cidade de Buenos Aires e pelo Senado da Nação. Todos os senadores são responsáveis pela integridade física dos argentinos, especialmente o vice-presidente. Pela segunda vez peço que paremos com essa loucura — disse a senadora oposicionista Anabel Fernández Sagasti.
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Uma moção para paralisar a sessão chegou a ser votada e derrotada, e Villarruel foi ao X, antigo Twitter, atacar a oposição.
“Os K [kirchneristas] tentaram interromper a sessão no Senado com a desculpa de ver a situação nas ruas. Ou seja, os senadores que pagamos para legislar vão verificar como é desenvolvido o plano de segurança nas ruas”, escreveu Villarruel. “Não vamos interromper a sessão do Congresso nem permitir que pedras ataquem a democracia.”
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