Internacional
Nova 'guerra nas estrelas': EUA ampliam investimentos para conter ameaças em órbita
Pentágono planeja nova geração de satélites capazes de evitar ataques e equipamentos para eliminar espaçonaves 'hostis', mas iniciativa pode demorar a sair do papel
O Pentágono está intensificando suas capacidades para travar guerras no espaço, convencido de que os avanços recentes de China e Rússia são uma crescente ameaça aos EUA em solo e aos satélites do país em órbita. Os detalhes dos planos são sigilosos, mas integrantes do Departamento de Defesa têm reconhecido que eles refletem uma mudança crucial nas operações, com o espaço se tornando um campo de batalha.
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Ao invés de se basear apenas em satélites militares, que por décadas deram aos americanos uma vantagem em conflitos, o Pentágono quer adquirir uma nova geração de equipamentos para defender suas redes e, caso necessário, atacar espaçonaves inimigas.
A estratégia se diferencia de programas espaciais militares anteriores, ao expandir as capacidades ofensivas — uma diferença considerável se comparada com as propostas apresentadas nos anos 1980, que tinham como ponto principal o uso de satélites para proteger os EUA de ataques de mísseis nucleares.
— Precisamos proteger nossas capacidades espaciais, ao mesmo tempo em que precisamos impedir que o adversário use suas capacidades de maneira hostil — disse em março o general Chance Saltzman, chefe de operações espaciais da Força Espacial, agência criada em 2019 como uma divisão da Força Aérea. — Se não tivermos o espaço, perdemos.
Integrantes do Pentágono e uma análise recentemente liberada ao público do diretor da inteligência nacional disse que Rússia e China já testaram ou implementaram sistemas como lasers de alta energia em solo, mísseis antissatélites e espaçonaves manobráveis, que podem podem ser usadas contra equipamentos americanos.
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A preocupação se intensificou com os relatos de que a Rússia pode estar desenvolvendo uma arma nuclear posicionada no espaço que pode eliminar uma série de satélites em órbita, sejam eles militares ou comerciais. O uso de armas de interferência eletrônica na Ucrânia, que afetaram sistemas de armas dos EUA, é citado pelo Pentágono como mais uma razão para intensificar as defesas do país no espaço.
— Não é mais teórico — afirmou o general Stephen Whiting, responsável pelo Comando Espacial, em encontro com repórteres no mês passado. — É real e está lá posicionado no nosso ambiente.
Mas a expansão da capacidade militar no espaço está ligada especialmente à China.
— A China implementou uma série de equipamentos para atacar nossas forças no espaço — afirmou, em entrevista, o secretário da Força Aérea, Frank Kendall. — Não poderemos operar no Oeste do Pacífico se não pudermos derrotá-los.
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O general Whiting disse que a China triplicou sua rede de satélites de inteligência, vigilância e reconhecimento desde 2018, descrita por ele como uma “rede mortífera sobre o Oceano Pacífico para encontrar, rastrear e, sim, alvejar as capacidades dos EUA e aliados”.
“Os EUA têm repetidamente citado a China como uma ‘ameaça no espaço’ para criticar e atacar a China”, disse Pequim em uma declaração emitida no começo do ano, alegando que as alegações americanas eram “uma desculpa para a expansão de suas forças no espaço e manter a hegemonia militar”. Ao tentar rebater os argumentos americanos, China e Rússia tentaram, sem sucesso, pedir ao Conselho de Segurança que agisse para “prevenir, de uma vez por todas, o posicionamento de armas no espaço”.
Programa ambíguo
Integrantes do governo americano adotaram uma iniciativa chamada por eles de “operação contraespacial responsável”, um termo intencionalmente ambíguo que evita confirmar que o país quer posicionar suas armas no espaço. Ao mesmo tempo, ele confirma que o governo tem interesse em ações que não criem campos de destroços resultantes de uma explosão ou míssil usado para explodir um satélite inimigo. Foi o que aconteceu em 2007, quando a China usou um míssil para eliminar um satélite em órbita — EUA e Rússia também testaram armas semelhantes, mas os americanos se comprometeram a não fazê-lo novamente.
Os EUA usam há muito tempo sistemas capazes de interferir em sinais de rádio, atrapalhando a comunicação com satélites, e tem agido para modernizar esses sistemas. Mas nesta nova abordagem, o Pentágono tem uma tarefa ainda mais ambiciosa: suprimir ameaças inimigas em órbita, da mesma forma como a Marinha o faz nos mares e a Força Aérea nos céus. Uma das prioridades é evitar que as demais forças militares não sejam ameaçadas pelo uso de satélites por inimigos.
“Conseguir a superioridade através da efetiva supressão das capacidades espaciais inimigas” é como uma atualização da doutrina de guerra do Pentágono descreve essa tática. Por causa de seu alto grau de sigilo, oficiais rejeitaram discutir publicamente esses detalhes, e assessores do general Salzman cancelaram uma entrevista agendada depois de serem informados sobre as perguntas relacionadas a armas específicas.
Mas há algumas pistas, incluindo um relatório recente de Charles Galbreath, ex-coronel da Força Espacial. Ele citou três exemplos de armas que podem afetar redes de satélites: ciberataques, lasers baseados em terra ou no espaço, e sistemas de microondas de alta potência.
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Um relatório do Pentágono, dos anos 1990, sugeriu a criação de um satélite “caçador”, que poderia enviar um raio de energia contra espaçonaves inimigas para queimar seus sistemas eletrônicos, estimando que poderia integrar as operações da Força Aérea em 2025. John Shaw, militar hoje na reserva que trabalhou no Comando Espacial, disse que esses dispositivos provavelmente serão empregados no futuro.
— Eles reduzem os destroços e trabalham na velocidade da luz — afirmou. Provavelmente serão as ferramentas preferenciais para atingirmos nossos objetivos.
Os EUA jamais confirmaram ter armas no espaço. Mas o Pentágono já tem o modelo secreto X37B, uma espaçonave similar ao ônibus espacial que já realizou sete missões, e que levanta suspeitas de que poderia ser usado como uma plataforma de armas. Oficiais disseram que ele está sendo usado para experiências.
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Também há planos separados para o lançamento de uma nova geração de satélites espaciais que podem manobrar, serem reabastecidos e ter braços robóticos capazes de alcançar e pegar um satélite inimigo.
Outra preocupação é com a proteção dos satélites. O Departamento de Defesa pediu que a nova geração de sistemas de monitoramento tragam sistemas capazes de responder ou de evitar um possível ataque. No mês passado, duas empresas — Rocket Lab e True Anomaly — ganharam contratos para lançar duas espaçonaves no final do ano que vem, uma agindo como um alvo inimigo e outra equipada com câmeras, para observar a ameaça. O satélite de interceptação não terá armas, mas terá um compartimento capaz de levá-las.
— Evitar surpresas operacionais exige que tenhamos uma compreensão apurada dos domínios do espaço a todo tempo — disse o general Saltzman ao Senado no mês passado, dizendo que US$ 2,4 bilhões (R$ 12,25 bilhões) do orçamento total de US$ 29,4 bilhões (R$ 150,08 bilhões) para 2025 foram destinados para a “compreensão do domínio espacial”.
Uma vez que os programas são sigilosos, ninguém fora do governo consegue estimar quanto está sendo gasto nesses sistemas. Mas Todd Harrison, engenheiro aeroespacial que estuda o orçamento espacial militar para o American Enterprise Institute, disse que ele se situa em centenas de milhões de dólares por ano. Mesmo assim, Harrison aponta que levará algo entre cinco a dez anos até que os EUA tenham um arsenal de armas de ataque no espaço, se essas iniciativas saírem mesmo do papel.
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