Internacional
Polícia detém manifestantes pró-Palestina em universidade dos EUA e França em meio ao aumento de mobilização estudantil em outros países
Acampamentos inspirados nos erguidos em universidades americanas foram registrados em instituições no Reino Unido, Alemanha e Holanda, bem como na Austrália e no México
A promotoria de Paris informou, nesta quarta-feira, que 86 pessoas foram detidas na sequência de uma operação policial para remover estudantes que participavam de uma manifestação pró-Palestina na Universidade de Sorbonne. Também nesta manhã, a milhares de quilômetros, a polícia de Washington fez várias prisões e começou a esvaziar um acampamento montado na Universidade George Washington (GW) desde 25 de abril. As intervenções policiais seguem uma onda de mobilização pró-palestinos que se espalhou pelas universidades dos EUA, mas que tampouco mantiveram-se restritos a essas instituições: além da França, também foram registrados protestos em universidades na Holanda, Alemanha, Reino Unido, Austrália e México.
A polícia francesa agiu na noite de terça depois que cerca de 100 estudantes ocuparam um auditório durante duas horas em “solidariedade” ao povo de Gaza, observou um jornalista da AFP no local. Os mais de 80 estudantes franceses foram detidos por uma série de crimes contra a ordem pública, que incluem "dano intencional, participação em um grupo com o objetivo de preparar violência contra pessoas ou destruição/dano à propriedade, rebelião, violência contra uma pessoa que exerce autoridade pública ou invasão das instalações de uma escola com o objetivo de perturbar a paz ou a boa ordem do estabelecimento", pontuou o comunicado do Ministério Público.
Os manifestantes serão mantidos sob custódia por 24 horas, que pode ser prorrogada por mais 24 horas. Outra intervenção policial também foi registrada na Sciences Po Paris, onde os primeiros acampamentos foram montados ainda no dia 24.
Na segunda-feira, o primeiro-ministro Gabriel Attal reforçou que nunca haverá o direito de perturbar as universidades francesas com tais protestos. No último dia 27, dois dias da primeira atuação da polícia francesa contra os estudantes da Sorbonne, o premier afirmou que "nunca haverá o direito ao bloqueio" e "tolerância para as ações de uma minoria ativa e perigosa".
Em Washington, não foi divulgado um número exato de detidos e nem quantos especificamente eram estudantes, mas as autoridades disseram aos jornais americanos que foram feitas "várias prisões". Estudantes da GW estão em um acampamento desde o dia 25 de abril, segundo a BBC, e o porta-voz da polícia Thomas Lynch afirmou ao Washington Post que a mobilização cresceu nos últimos dias e "se tornou mais volátil". Até então descrito como um acampamento pacífico, os veículos relataram uma escalada das tensões após a polícia ter removido uma grande bandeira palestina hasteada em um prédio do campus — classificado pela universidade como "ato agressivo de ilegalidade". Na terça, os estudantes marcharam até a residência da reitora da universidade.
Lynch afirmou que as forças chegaram ao acampamento por volta das 3h da madrugada (horário local) e que os manifestantes entraram em confronto com a polícia, que reagiu com spray de pimenta. O GW Hatchet, jornal independente organizado pelos universitários e citado pela BBC, afirmou que o "terceiro e último aviso" foi dado aos estudantes por volta de 3h30 (horário local) e que todos aqueles que permanecessem no U-Yard e no trecho da H street "seriam presos".
Em um comunicado, também citado pela BBC, a GW disse que "embora a universidade esteja comprometida em proteger os direitos dos estudantes à liberdade de expressão, o acampamento evoluiu para uma atividade ilegal, com os participantes em violação direta de múltiplas políticas universitárias e regulamentos municipais." A reitora Ellen M. Granberg tem sido uma crítica à mobilização estudantil e, há mais de uma semana, suspendeu vários estudantes que participaram do protesto, informou o WP.
Protestos se espalham pelo mundo
A repressão policial e as punições e ameaças realizadas por boa parte das universidades, porém, parecem funcionar como combustível aos protestos. A centelha originada no dia 18 de abril, na Universidade de Columbia, em Nova York, espalhou-se como um fogaréu para cerca de 140 universidades americanas, cruzou o oceano atlântico e atingiu ao menos duas francesas. Mas, longe de ater-se às instituições de Sorbonne e Sciences Po Paris, as manifestações contra a guerra em Gaza espalharam-se para outros países europeus, como Holanda, Alemanha e Reino Unido, para a Austrália e para o México.
Inspirados em seus colegas nos campi americanos e francesas, alunos de algumas universidades de elite multiplicaram as ocupações em salas de aula e centros acadêmicos. Assim como as manifestações que os antecederam, exigem em particular, o fim das parcerias com instituições israelenses, como forma de sanção para a ofensiva lançada por Israel contra Gaza, após o ataque do Hamas em 7 de outubro, que deixou 1,2 mil mortos e fez mais de 240 reféns. Em sete meses, a represália levada a cabo pelo Estado judeu já deixou quase 35 mil mortos, com a maior parte das vítimas sendo mulheres e menores de idade.
Na Universidade de Amsterdã, centenas de estudantes retomaram na terça-feira à noite sua protesto no campus, apenas um dia depois de a polícia tê-los desalojado de maneira truculenta e destruído suas barracas. Desta vez, os manifestantes ergueram barreiras nas estradas de acesso à universidade, vigiados por um forte contingente policial. A intervenção na noite de segunda resultou em 169 detidos, informou a polícia, que libertou todos exceto dois, ainda sob custódia por acusações de crimes de desordem pública. A violência irrompeu brevemente quando um pequeno grupo de pessoas, empunhando sinalizadores, invadiu o protesto principal.
Cerca de 50 manifestantes também estavam protestando na terça-feira em frente à biblioteca da Universidade de Utrecht e algumas dezenas na Universidade Técnica de Delft, de acordo com a agência de notícias local ANP.
Em uma atualização publicada pela instituição nesta quarta-feira, o Conselho Executivo da Universidade teve uma reunião com uma delegação de manifestantes para chegar a um acordo. Alguns edifício também foram fechados nesta quarta devido à manifestação.
Na cidade de Leipzig, no leste da Alemanha, a universidade disse em um comunicado que 50 a 60 pessoas ocuparam uma sala de aula na terça, agitando faixas que diziam: “Ocupação da universidade contra o genocídio”. Os manifestantes barricaram as portas da sala de aula por dentro e ergueram tendas no pátio, segundo a instituição, que chamou a polícia à tarde e registrou uma queixa policial. Foram iniciados processos criminais contra 13 pessoas que estavam na sala de aula por suspeita de invasão. Nenhuma prisão foi feita até o momento. Cerca de 40 manifestantes pró-Israel, contrários ao protesto pró-Palestina também se reuniram na região, informou a polícia.
Também na terça-feira, na Universidade Livre de Berlim, a polícia liberou uma manifestação depois que cerca de 80 pessoas montaram um acampamento de protesto em um pátio do campus. Os manifestantes, alguns dos quais usavam o lenço kufiya, há muito usado como um símbolo da causa palestina, sentaram-se em frente a tendas e agitaram cartazes. A instituição afirmou que, depois, os manifestantes tentaram entrar em salas e auditórios para ocupá-los. A polícia foi chamada, e algumas prisões foram realizadas por incitação ao ódio e invasão de propriedade. Danos contra a propriedade foram relatados e as aulas foram suspensas durante o dia.
Na Suíça, os protestos se espalharam por três universidades em Lausanne, Genebra e Zurique. A Universidade de Lausanne disse em um comunicado que “considera que não há motivo para cessar essas relações” com as universidades israelenses, como exigem os manifestantes. Já na Áustria, dezenas de manifestantes estão acampados no campus da Universidade de Viena, montando barracas e pendurando faixas desde o final da quinta-feira.
No Reino Unido, pequenos acampamentos foram erguidos, na última sexta-feira, nas universidades das cidades de Bristol, Newcastle e Warwick. No dia anterior, uma coligação de estudantes da University College London armou tendas no campus para pressionar o desinvestimentos em empresas que apoiam o que descreveram como "genocídio dos palestinos", além de outras demandas. "Não sairemos até que a universidade atenda às nossas demandas", afirmou um porta-voz do movimento, citado pelo New York Times.
Um sindicato que representa os estudantes do Trinity College Dublin, em protestos contra a guerra em Gaza desde o ano passado, afirmou na semana passada que foram multados pela universidade em mais de € 214 mil por perdas financeiras decorrentes das manifestações, o aumento das taxas estudantis e outras questões. A universidade, que não tem fins lucrativos, citou em comunicado o “impacto financeiro negativo” dos protestos que bloquearam o acesso dos visitantes ao Livro de Kells, um manuscrito religioso medieval mantido na universidade.
Na Austrália, foram montados acampamentos nas principais universidades das cidades de Adelaide, Canberra, Melbourne e Sydney. As tensões nos protestos escalaram à medida que manifestantes pró-Israel se reuniram nas proximidades. A União Australásia de Estudantes Judeus afirmou, em um comunicado divulgado na quinta-feira, que estavam "profundamente preocupados" com uma nova onda de assédio contra os estudantes judeus.
Estudantes da Universidade Nacional Autônoma do México (Unam) também organizaram um acampamento, na quinta-feira, que exigiu o "fim do genocídio imperialista em Gaza", bem como o rompimento das relações diplomáticas entre México e Israel. (Com AFP e NYT)
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