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'Para onde podemos ir?': moradores de Rafah se dividem sobre acatar ou resistir a ordem de evacuação de Israel

Palestinos deslocados pelo conflito questionam nova ordem para evitar o conflito e temem as condições que serão encontradas em nova zona humanitária

Agência O Globo - 06/05/2024
'Para onde podemos ir?': moradores de Rafah se dividem sobre acatar ou resistir a ordem de evacuação de Israel

Após uma noite sob bombardeios que mataram 16 pessoas, moradores de Rafah acordaram, nesta segunda-feira, com o alerta do Exército de Israel para que deixassem o leste da cidade, diante de uma iminente invasão terrestre à região. Palestinos disseram ter encontrado folhetos lançados pelos aviões israelenses, afirmando que deveriam "evacuar imediatamente" a área.

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"O Exército está trabalhando com poder intensivo contra as forças terroristas perto de você", dizia um panfleto lançado no leste de Rafah. "Pela sua segurança, as Forças de Defesa de Israel dizem para você evacuar imediatamente em direção à zona humanitária expandida de al-Mawasi", acrescentava, com um mapa indicando a localização ao norte de Rafah.

Osama al-Kahlout, da Sociedade do Crescente Vermelho Palestino em Gaza, disse à AFP que as áreas de Rafah indicadas por Israel para serem evacuadas abrigam atualmente cerca de 250 mil pessoas, muitas das quais já vieram deslocadas de outras regiões da Faixa de Gaza. Um porta-voz militar israelense, ao ser questionado sobre quantas pessoas a operação deveria deslocar, disse que a estimativa era de cerca de 100 mil. Segundo al-Kahlout, o processo de evacuação "começou no terreno, mas de forma limitada".

Sob uma chuva torrencial, alguns dos palestinos que se abrigavam em Rafah disseram ter começado a empacotar suas coisas das tendas densamente povoadas. Eles se preparavam para sair mesmo antes de receberem a diretriz de Israel.

— Aconteça o que acontecer, minha tenda está pronta — disse um morador à AFP.

Em contrapartida, outros moradores disseram que a área para onde estavam sendo orientados a fugir já estava superlotada, e eles não confiavam que seria seguro. Abdul Rahman Abu Jazar, de 36 anos, disse que ele e 12 membros da família estão acampados em uma área que Israel ordenou a evacuação, mas não sabiam o que fazer.

— Para onde podemos ir? Não sabemos. Não há hospitais e fica longe de qualquer serviço que muitos precisam — disse ele, acrescentando que uma pessoa de sua família dependia de tratamento de hemodiálise no hospital al-Najar, na área de Rafah instruída a evacuar. — Como lidaremos com ela depois disso? Devemos vê-la morrer sem poder fazer nada?

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Um porta-voz militar israelense disse a repórteres que a evacuação faz parte dos "planos para desmantelar o Hamas". Ele também fez referência a um ataque com foguetes, no domingo, que matou quatro soldados israelenses perto da passagem de fronteira de Kerem Shalom. O Exército disse que os foguetes foram disparados de uma área adjacente a Rafah.

— Tivemos um lembrete violento de sua presença [do Hamas] e de suas habilidades operacionais em Rafah ontem — disse o porta-voz.

Cerca de 1,2 milhão de pessoas estão abrigadas em Rafah no momento, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS). A maioria fugiu de outras regiões do enclave palestino, alvo de ofensivas anteriores ao longo dos sete meses de guerra entre Israel e Hamas. O número já chegou a cerca de 1,5 milhão, segundo autoridades.

'Sem plano humanitário credível'

Organizações de ajuda internacional expressaram alarme com a iminente invasão de Rafah.

— Do ponto de vista humanitário, não existe nenhum plano humanitário credível para um ataque a Rafah — disse Bushra Khalidi, diretora de advocacia da Oxfam nos territórios palestinos.

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A guerra mais sangrenta da história de Gaza eclodiu após o ataque sem precedentes do Hamas em 7 de outubro contra Israel, que resultou na morte de cerca de 1,2 mil pessoas, a maioria civis. Os militantes também sequestraram cerca de 250 reféns, com Israel estimando que 128 deles permanecem em Gaza, incluindo 35 dos quais o Exército diz que estão mortos.

A ofensiva retaliatória de Israel, destinada a destruir o Hamas, matou pelo menos 34.683 pessoas em Gaza, na maioria mulheres e crianças, de acordo com o Ministério da Saúde do Hamas.