Internacional
Protestos nas universidades dão a China, Rússia e Irã combustível para explorar as divisões nos EUA
Pesquisadores apontam para uso de imprensa oficial, sites que imitam veículos ocidentais e contas em redes sociais para espalhar narrativas críticas a Washington
Um artigo publicado em um site de notícias falsas que a Meta (empresa que controla o Facebook) ligou a operações de desinformação da Rússia atribuiu o s confrontos em campi de universidades dos EUA aos fracassos do governo de Joe Biden. Um jornal controlado pelo Partido Comunista da China disse que a repressão da polícia expõe “os padrões duplos e a hipocrisia” nos Estados Unidos quando o assunto é a liberdade de expressão.
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No X, o antigo Twitter, um porta-voz da Chancelaria iraniana, Nasser Kanaani, publicou o desenho de um policial prendendo um jovem manifestante vestido de Estátua da Liberdade: “prisão da liberdade nos EUA”, escreveu na publicação.
Conforme os protestos sobre a guerra na Faixa de Gaza se espalharam pelos EUA, Rússia, China e Irã estão usando o movimento para ganhar pontos geopolíticos no exterior e incitar tensões dentro dos Estados Unidos, de acordo com pesquisadores que identificaram esforços abertos e disfarçados para amplificar os atos desde seu início.
Há poucas provas, pelo menos por enquanto, de que esses países deram apoio operacional aos protestos, como a Rússia recrutou manifestantes do movimento Vidas Negras Importam para protestos antes das eleições de 2016 e 2020, sem que soubessem que estavam sendo chamados por Moscou.
Por outro lado, as campanhas retratam os EUA como um país que vive turbulências sociais e políticas. Nas duas últimas semanas, a mídia estatal russa, chinesa e iraniana publicou mais de 400 artigos em inglês sobre os protestos, segundo a NewsGuard, uma organização que estuda a desinformação na internet. Os países também liberaram uma onda de conteúdos através de contas ou robôs no X e no Telegram, ou em sites, ao menos no caso russo, similares aos de empresas de mídia do Ocidente.
— É uma ferida que nossos adversários tentarão jogar sal em cima sempre que puderem — disse Darren Linvill, diretor da Media Forensics Hub da Universidade Clemson, que identificou campanhas do tipo lançadas pelos três países. — Quanto mais lutarmos entre nós mesmos, mais fácil ficará a vida deles, e mais poderão se livrar impunes disso.
Pesquisadores estão preocupados que algumas das operações estejam focadas também nas eleições de novembro, buscando inflamar tensões partidárias, degradar a democracia e promover o isolacionismo. Os três países lançaram uma grande quantidade de propaganda e desinformação desde o início da guerra em Gaza, em outubro do ano passado, tentando minar a imagem de Israel e dos EUA, ao mesmo tempo em que expressam apoio ao Hamas ou aos palestinos de forma geral.
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Os protestos nos campi, que ganharam força nas últimas semanas, permitiram aos três países redirecionar sua propaganda para ressaltar o apoio que o governo Biden tem dado a Israel, argumentando que ele minou sua posição internacional ao não refletir o sentimento da população americana.
“As políticas do governo Biden estão complicando a situação dentro do país”, disse um artigo na quarta-feira do TruthGate, um dos sites que a Meta afirmou, no ano passado, foram criados por uma operação de informação russa chamada “Doppelgänger”, voltada à disseminação de propaganda através de um site parecido com os da imprensa dos EUA. “Na pressa de ajudar nossos aliados controversos, eles se esqueceram completamente das questões internas. Agora a situação parece irreparável.”
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Esses esforços para exercer influência foram rastreados por pesquisadores da Clemson e do NewsGuard, assim como do Instituto para o Diálogo Estratégico, a Fundação para a Defesa das Democracias, o Instituto Australiano de Políticas Estratégicas e a Recorded Future, uma empresa de análise de ameaças de inteligência.
Explorando uma crise interna
Uma operação clandestina chinesa, conhecida como “Spamouflage”, inicialmente ligada a um braço do Ministério de Segurança Pública em 2019, também voltou as atenções aos protestos. Algumas publicações no X alegavam que os EUA estavam “expondo o totalitarismo”. Linguagem semelhante — tal qual “como podem haver policiais tão violentos no mundo” e “expulsão, prisão, supressão!” — ecoou em contas identificadas pela Fundação pela Defesa das Democracias, uma organização de pesquisa em Washington ligada à segurança nacional.
Max Lesser, um analista sênior na fundação, descreveu o “elevado volume” de conteúdos ligados aos protestos como um “exemplo claro de um adversário estrangeiro explorando ativamente uma crise interna”.
Muitas contas ligadas ao Spamouflage publicam conteúdos semelhantes. Uma delas no X, com mais de 18 mil seguidores, compartilhou publicação de um diplomata chinês no Paquistão, que criticou a resposta da polícia aos protestos e trouxe um vídeo, com legendas em mandarim, dos atos nos campi. A foto de perfil dele era de Winter, uma popular cantora sul-coreana do grupo aespa. A localização aparecia como nos EUA, mas as mensagens eram publicadas quando era dia na Ásia, e traziam muitos erros de gramática.
Outra conta no X, que segundo Linvill estava ligada a uma operação chinesa conhecida pelos pesquisadores como Dragonbridge, publicou uma mensagem de uma organização pró- Palestina em Nova York, defendendo que os manifestantes “inundem os acampamentos” nas universidades locais.
Mas os pesquisadores não identificaram um esforço direto para organizar protestos ou causar violência. O foco, ao invés disso, tem sido para ressaltar as divisões que a guerra em Gaza expôs na opinião pública nos EUA, e o efeito potencial que teve nas políticas de governo.
Melanie Smith, diretora de pesquisa do Instituto para o Diálogo Estratégico, uma organização de pesquisa que estuda a desinformação na internet, polarização e extremismo, disse qu as ações da China se tornaram particularmente agressivos em relação ao governo Biden.
A organização dela e outros grupos identificaram anteriormente um esforço incipiente para minar as chances de reeleição de Biden. Uma estratégia que incluiu a criação de contas falsas que se apresentavam como americanos críticos ao democrata.
— Seu conteúdo é agressivamente centrado em apresentar a pouca disposição dos jovens para votar em Biden como uma questão — disse Smith.
Bret Schaefer, pesquisador no Fundo Marshall Alemão que estuda manipulação da informação, disse que China, Rússia e Irã têm diferentes motivações. Mas todos se beneficiaram de narrativas que minaram as percepções globais sobre os EUA. A imprensa estatal iraniana, que há muito tempo apoia o Hamas, publicou mais sobre os protestos do que Irã e Rússia, e amplificou as críticas à resposta policial mais do que comentaristas americanos, como Jackson Hinkle, disse Schaefer.
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