Internacional
Em meio a crise de segurança, Equador vota em referendo sobre medidas para o enfrentamento ao crime
Propostas abrem caminho para que as Forças Armadas participem de ações contra gangues e para que equatorianos possam ser extraditados
Em meio a uma grave crise de segurança, protagonizada por grupos criminosos ligados ao tráfico de drogas, o Equador foi às urnas neste domingo decidir se aprova um conjunto de reformas constitucionais, algumas voltadas ao enfrentamento ao crime. Outrora conhecido como uma ilha de relativa paz na América Central, o território equatoriano se tornou um ponto estratégico para a exportação de entorpecentes, e as quadrilhas impõem um regime de terror a milhões de pessoas ao redor do país. No dia da votação, o diretor de uma penitenciária, empossado na semana passada, foi assassinado a tiros.
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As cédulas traziam cinco propostas do governo para mudanças na Constituição. A primeira, que despertou grande atenção de eleitores, analistas políticos e especialistas em segurança pública, tratava da permissão para que as Forças Armadas atuem com a Polícia no combate ao crime organizado. Hoje, os militares estão a cargo da defesa do país e da soberania nacional, e não existe qualquer previsão legal sobre seu emprego em ações de combate ao crime.
Durante o caos que sucedeu a fuga de José Adolfo Macías Villamar, conhecido como Fito, líder da facção criminosa Los Choneros, de um presídio em Guayaquil, o presidente Daniel Noboa declarou “estado de conflito armado interno”,permitindo o emprego dos militares nas ruas. O decreto segue em vigor.
Outra medida é a que permite a extradição de cidadãos equatorianos para o exterior. Hoje, a Carta veta essa possibilidade, ao contrário de países como a vizinha Colômbia, que com frequência manda acusados de ligação com os cartéis para serem processados e presos nos EUA. No caso do Equador, a proposta analisada pelos eleitores prevê a extradição apenas em casos de terrorismo e crimes contra a humanidade, e desde que o país de destino não aplique a pena de morte.
Eleito em outubro do ano passado para completar o mandato de Guillermo Lasso, que dissolveu o Parlamento e renunciou ao cargo, Daniel Noboa tem usado o discurso de combate ao crime como bandeira política. Na semana passada, durante comício, disse que era necessário “limpar o país das máfias, do narcoterrorismo e de seus cúmplices", e analistas veem essa linha de atuação, similar à do presidente salvadorenho Nayib Bukele, como uma prévia de sua campanha à reeleição, no ano que vem. Para analistas, o referendo é, além de uma forma de mostrar que Noboa está trabalhando, uma ferramenta para legitimar seu mandato, mesmo que não tenha apresentado bons resultados.
Nas semanas que antecederam a votação, vários massacres foram registrados ao redor do país: no feriado da Semana Santa, 80 pessoas morreram, e às vésperas do referendo, dois prefeitos foram mortos em um intervalo de três dias. Em 2023, a taxa de homicídios chegou a 45 por cada 100 mil habitantes — em 2018, o índice era de 6 assassinatos a cada grupo de 100 mil pessoas, apontou levantamento do jornal equatoriano Primícias.
No domingo, o diretor de uma prisão em Manabí, no Oeste do país, foi morto a tiros, de acordo com o serviço penitenciário nacional. Damián Parrales havia assumido o cargo na terça-feira passada, e foi baleado em um restaurante. Em comunicado, o serviço penitenciário disse que ele “foi vítima de um atentado que lamentavelmente terminou com sua vida”.
Em Guayaquil, epicentro da onda de violência, houve uma falsa ameaça de bomba, e um homem foi assassinado a tiros perto de uma seção eleitoral, pouco antes da abertura das urnas. Outras 42 pessoas com mandado de prisão em aberto por irregularidades no pagamento pensão alimentícia foram detidas na cidade. Em várias regiões do país a forte chuva dificultou o acesso de eleitores aos locais de votação.
Pautas questionadas
Além da pauta da segurança pública, as cédulas traziam questões ligadas à política econômica e ao funcionamento da Justiça. Uma proposta trata do estabelecimento de juizados especializados em temas constitucionais, e outra volta a reconhecer a arbitragem internacional em disputas comerciais e relacionadas a investimentos, revertendo uma decisão do governo do presidente Rafael Correa (2007-2017). O plano para estabelecer o contrato de trabalho por prazo determinado e por horas, apresentada como uma medida para incentivar o mercado de trabalho e a geração de empregos, é atacada por centrais sindicais por “precarizar” a situação dos trabalhadores.
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Caso sejam aprovadas, as reformas constitucionais entrarão em vigor assim que forem publicadas no Diário Oficial. Os eleitores também responderam a seis perguntas em uma consulta popular — os temas, caso aprovados, serão submetidos à Assembleia Nacional, onde serão debatidos e eventualmente aprovados na forma de projeto de lei.
Neste caso, todas as questões eram relacionadas à segurança pública, a começar pela permissão às Forças Armadas para que realizem controles de armas nas prisões. As penitenciárias equatorianas são consideradas bases de comando das organizações criminosas, e além de massacres recorrentes — foram 460 mortes desde 2021 —, armas mais sofisticadas têm sido encontradas com os detentos. Uma das propostas em votação neste domingo defendia que as armas apreendidas sejam ser usadas pelas próprias forças de segurança.
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Ainda no campo penal, o governo sugeriu a elevação de penas para os crimes de terrorismo, que chegar a 13 anos de prisão, narcotráfico e para assassinos de aluguel, e que pessoas condenadas por esses delitos não tenham direito à redução de penas. A posse de armas de uso privativo das Forças Armadas e das polícias também passaria a ser crime. Por fim, uma legislação ligada ao arresto de bens de origem ilícita seria simplificada, agilizando sua incorporação pelo Estado.
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