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Análise: ataque contra Israel foi fracasso militar ou sucesso estratégico do Irã?

Teerã lançou centenas de drones e mísseis na noite de sábado, causando danos mínimos, mas também 'forçou' israelenses a revelarem seus planos de defesa

Agência O Globo - 15/04/2024
Análise: ataque contra Israel foi fracasso militar ou sucesso estratégico do Irã?

Enquanto governos de todo o mundo tentam digerir o ataque iraniano contra Israel da noite de sábado, com centenas de drones e mísseis lançados contra o país (quase todos interceptados no ar), outro debate já está a pleno vapor: se a ação do Irã, que foi uma resposta ao ataque israelense contra seu consulado em Damasco, foi um fracasso em termos militares, ou um sucesso em termos políticos e estratégicos? A resposta pode variar bastante, dependendo do interlocutor.

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Para integrantes do governo israelense, o fato de praticamente todos os projéteis terem sido abatidos demonstra a capacidade do país de suportar um ataque de grandes proporções, mesmo com armas mais poderosas e precisas, sem grandes sustos. O Domo de Ferro, desenvolvido em parceria com os EUA, foi testado em seu limite, e as explosões sobre os céus de cidades israelenses chegaram a ser tratadas como “fogos de artifícios” por usuários de redes sociais.

Dentro dessa visão, se os iranianos queriam de fato causar estragos — como os que os israelenses provocaram em Damasco, no dia 1º de abril —, eles fracassaram. Sendo o Irã um país que usa seu programa de desenvolvimento de mísseis e drones como uma bandeira de propaganda e como ferramenta de projeção regional, não conseguir superar o Domo de Ferro com centenas de projéteis seria uma prova de que seus produtos não são exatamente invencíveis.

Politicamente, alguns veem no alegado fracasso um sinal de fraqueza das lideranças em Teerã, que agora podem se ver ainda mais ameaçadas caso Israel decida dar uma resposta militar, tema que ainda divide o Gabinete de Guerra.

— O fato de o ataque iraniano ter sido um fracasso completo não reduz em nada a obrigação de Israel de retaliar contra o Irã por seu ato direto de agressão — afirmou na Fox News Jonathan Conricus, ex-porta-voz do Exército de Israel e pesquisador da Fundação para a Defesa da Democracia, uma organização baseada nos EUA que tem no Irã um adversário existencial há décadas.

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Mas o Domo de Ferro não foi o único responsável por abater os mísseis e drones: americanos, britânicos, franceses e jordanianos interceptaram alguns dos projéteis, mais de 100, segundo integrantes do governo israelense, mostrando que o apoio demonstrado por esses países, especialmente pelos EUA, não se baseia apenas em discursos e declarações.

Segundo o jornal Maariv, foi montada uma operação pelos americanos e britânicos para garantir que as interceptações fossem bem-sucedidas. Algumas das aeronaves estavam sobre o espaço aéreo iraquiano antes mesmo dos lançamentos, e foram abastecidas no ar para que continuassem a postos.

— A ameaça iraniana se viu diante da superioridade tecnológica e operacional de Israel, com a cooperação dos países ocidentais e do Oriente Médio. E o programa de mísseis do Irã falhou miseravelmente contra Israel, com 99% das ameaças interceptadas — disse ao Maariv Ou Fialkov, analista de dados de inteligência.

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O ataque do sábado, apesar de sem precedentes em termos militares, não foi exatamente inédito, e duas ações nos últimos anos podem dar pistas sobre os objetivos de Teerã neste momento.

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Em 2019, os houthis, uma milícia apoiada por Teerã no Iêmen, lançaram um grande ataque com drones (iranianos) contra instalações petrolíferas da Arábia Saudita, impactando a capacidade de produção do país árabe e afetando o preço do petróleo em nível global. Um ataque, como apontam analistas, que veio sem qualquer tipo de aviso prévio.

Um ano depois, mísseis iranianos voaram em direção a uma base usada pelos EUA no Iraque, dias após um drone dos EUA matar o chefe da Força Quds, Qassem Soleimani, em Bagdá. Os disparos causaram alguns ferimentos nos militares na instalação, mas sem grandes danos materiais— as vítimas naquela noite foram os passageiros de um voo da Ukraine International Airlines, abatido por engano nos arredores de Teerã. Ao todo, 176 pessoas morreram.

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A principal diferença é que o ataque de 2019 pegou os sauditas de surpresa, enquanto o de 2020 e o de 2024 tiveram algum tipo de coordenação prévia entre os iranianos e os muitos envolvidos na segurança do Oriente Médio, incluindo os americanos.

Segundo o Jerusalem Post, Teerã informou o governo turco sobre o ataque, e os EUA mandaram uma mensagem via Ancara para que a operação ocorresse “dentro de certos limites”. Os planos também foram, de acordo com fontes diplomáticas, revelados a autoridades do Iraque, que teriam compartilhado os dados com os americanos. Uma ação com roteiro conhecido e avisado previamente, que deu a todos os envolvidos tempo para ações de defesa, e que já é usada propaganda oficial do regime, dentro e fora do país.

"Os disparos da República Islâmica contra certos alvos dentro dos territórios ocupados (Israel) foram uma espada desembainhada à força, de modo que talvez o regime israelita compreenda, pelo menos desta vez, que qualquer tipo de ação ameaçadora contra a República Islâmica será o mesmo que brincar com a cauda de um leão, que não tem medo de destruir os sionistas", afirmava um artigo publicado pelo site da agência semi-estatal Isna.

Em análise publicada na noite de sábado, o Instituto para o Estudo da Guerra (ISW) concorda que se tratou de uma ação “coreografada”, mas aponta que os iranianos tinham objetivos estratégicos. A começar pela compreensão sobre como funcionam os sistemas de defesa de Israel.

“A composição do ataque iraniano a Israel é semelhante à dos ataques que a Rússia conduziu repetidamente contra a Ucrânia nos esforços para determinar o modelo ideal para penetrar nas defesas aéreas e antimísseis ocidentais”, escreveu o ISW no X, o antigo Twitter. “A combinação de drones iranianos e mísseis de cruzeiro e balísticos contra Israel pretende confundir e sobrecarregar as defesas aéreas israelenses. O lançamento de ataques simultâneos por parte de grupos apoiados pelo Irã no Líbano e no Iémen faz parte deste esforço.”

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Ver como outros países estão dispostos a ajudar Israel — incluindo a Jordânia, criticada por Teerã há alguns dias — forneceu, ao menos em teoria, uma amostra da capacidade real de defesa israelense. Se os aliados ocidentais e regionais não conseguissem agir a tempo, como em um ataque surpresa, possivelmente alguns dos projéteis atingiram alvos em território israelense. Informações com valor estratégico incalculável, e que certamente já integram planos militares do Irã.

Contudo, mesmo que o ataque tenha sido, por essa ótica, favorável, os riscos foram extremamente elevados: a imagem dos mísseis explodindo sobre Jerusalém, após serem atingidos pelos sistemas de defesa, podem ter servido para fins de propaganda em Teerã, mas um erro de cálculo na mesma área, onde está um dos locais mais sagrados para o islamismo, a mesquita do Domo da Rocha, poderia ter causado problemas inimagináveis. E eventuais falhas dos sistemas de defesa de Israel, com alvos atingidos em solo e um número elevado de vítimas, tornariam impossível para os EUA pedirem qualquer tipo de moderação por parte do governo de Benjamin Netanyahu.