Internacional

Aliança 'indestrutível': com olhos voltados para a China, Biden recebe o premier japonês na Casa Branca

Líderes querem alinhar discurso sobre políticas de segurança para a Ásia e Pacífico, além de firmar acordos sobre temas econômicos sensíveis, como as cadeias de suprimentos

Agência O Globo - 10/04/2024
Aliança 'indestrutível': com olhos voltados para a China, Biden recebe o premier japonês na Casa Branca
Joe Biden

O presidente dos EUA, Joe Biden, e o premier do Japão, Fumio Kishida, deram início na noite de terça-feira a uma série de reuniões e discursos que, além de fomentar uma relação chamada pelo americano de "indestrutível", é um pilar da estratégia da Casa Branca para conter o que vê como um perigoso avanço da China na Ásia e Pacífico.

— Há apenas algumas gerações, nossas duas nações estavam presas em um conflito devastador — disse Biden, durante rápidas declarações nos jardins da Casa Branca, antes da principal reunião do dia. — Teria sido mais fácil dizer que permanecemos adversários. Ao invés disso, fizemos uma escolha melhor: nos tornamos os amigos mais próximos.

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Kishida chegou na noite de terça-feira à capital americana, e foi recebido pelo casal presidencial para um jantar em um restaurante de frutos do mar. Pela manhã, após uma rápida cerimônia, na qual o Japão ofereceu três mil mudas de cerejeiras, árvore nacional do país, os dois seguiram para um almoço de trabalho e a série de reuniões, que serão concluídas com um jantar com honras de chefe de Estado para cerca de 230 convidados.

Na quinta-feira, além de uma reunião trilateral com Biden e o presidente das Filipinas, Ferdinando Marcos Jr., Kishida fará um discurso no Congresso americano, algo que apenas um premier japonês, Shinzo Abe, assassinado em 2022, fez, há cerca de uma década. Uma mostra da importância que Biden e seu governo dão não só à presença do líder japonês no país, mas também a uma aliança que ganhado novas feições, especialmente por fatores externos.

— Essa aliança é a base da paz, segurança e prosperidade na região Indo-Pacífica e ao redor do mundo. Essa é uma parceria verdadeiramente global — disse Biden, sem mencionar aquela que promete ser uma protagonista velada da reunião, a China, descrita por ele como a única potência rival dos EUA que tem "a intenção de moldar a ordem internacional e tem, cada vez mais, o poder econômico, diplomático, militar e tecnológico para alcançar esse objetivo".

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Aliados cruciais na Ásia, Japão e EUA têm estreitado as relações nos últimos anos, especialmente no setor de segurança, em um processo impulsionado por Biden. Em 2021, EUA e Japão, ao lado de Coreia do Sul e Índia, "repaginaram" o chamado Diálogo de Segurança Quadrilateral, ou Quarteto, com o objetivo central de "garantir a liberdade da região da Ásia e Pacífico".

Quebrando velhos paradigmas nacionais, Kishida — que é extremamente impopular no país — incrementou os gastos militares, que devem chegar a 2% do PIB em 2027, renovou seus arsenais e autorizou a exportação de armas. Na visita desta semana, ao lado de Biden, o premier deve anunciar a maior reforma no pacto bilateral de segurança em mais de seis décadas, com a criação de um comando militar conjunto, ligado à frota americana no Oceano Pacífico. Essa iniciativa também prevê o apoio à exportação de equipamentos militares produzidos pelos japoneses;

— O sistema de alianças americanas ajudou a levar paz e estabilidade à região Indo-Pacífica por décadas, e agora precisamos atualizar e melhorar essa rede de alianças para a era moderna — disse, na terça-feira, o conselheiro de Segurança Nacional da Casa Branca, Jake Sullivan, em entrevista coletiva. — Vai além da segurança. Diz respeito a economia, a tecnologia, a desenvolvimento de infraestruturas, e diz respeito a diplomacia.

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Em novembro do ano passado, Kishida e o presidente da China, Xi Jinping, se encontraram durante a reunião de cúpula da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico, em São Francisco, nos EUA, e na época declararam que os dois países deveriam "focar em interesses conjuntos", e "reafirmar uma relação estratégica de benefícios mútuos, e lhe dar um novo significado". Mas entre as palavras e as ações podem haver diferenças difíceis de resolver.

Questões territoriais, econômicas — em agosto do ano passado, Pequim baniu as exportações de frutos do mar japoneses após o despejo de água da usina nuclear de Fukushima no mar — e especialmente de segurança pressionam, na visão de analistas, Tóquio em direção a Washington.

O discurso considerado mais duro de Pequim em relação a Taiwan, considerada uma província rebelde pelos chineses, e o estreitamento da parceria com a Rússia após a invasão da Ucrânia alimentam essa desconfiança — em várias ocasiões, Kishida chegou a dizer que "a Ucrânia hoje pode ser o Leste da Ásia amanhã". No ano passado, durante uma reunião de cúpula da Otan, a principal aliança militar do Ocidente, ouviu do secretário-geral da organização, Jens Stoltenberg, que "não há um parceiro mais próximo" do que o Japão.

— A fim de manter e reforçar uma ordem internacional livre e aberta baseada no Estado de direito no meio de sérios desafios à ordem internacional, é importante cooperar não só com aliados e países com ideias semelhantes no Indo-Pacífico, mas também com países europeus como e instituições como a Otan — disse Kishida, em entrevista à TV estatal da Lituânia, no ano passado. — Essa cooperação não é algo que aumentará as tensões na região, mas contribuirá para a paz e a estabilidade na comunidade internacional como um todo.

Na quinta-feira, Kishida participará de uma reunião com Biden e com o presidente das Filipinas, Ferdinando Marcos Jr., outro líder que tem mantido uma relação tensa com Pequim, que inclui disputas territoriais no Mar do Sul da China e encontros entre embarcações que por pouco não levaram a um enfrentamento direto. Recentemente, ele permitiu que militares americanos usassem um número maior de bases no país, e um acerto semelhante pode ser firmado com o Japão.

— O maior objetivo desse acordo trilateral [com EUA e Japão] é permitir que continuemos a avançar, a nos ajudar, e, claro, manter a paz do Mar do Sul da China e a liberdade de navegação — disse Marcos, em declarações feitas antes de embarcar para Washington. Para ele, a reunião trilateral trará "mais detalhes sobre como a cooperação será implementada" na região, e que planeja expandir esse trabalho conjunto para outras áreas, como tecnologia e cadeias de suprimentos.