Internacional
Xenofobia contra imigrantes da Ásia Central cresce na Rússia após ataque terrorista em Moscou
Ao menos 64 pessoas foram deportadas desde quinta-feira, afirma ONG; crescem relatos de atos de violência e discriminação principalmente contra tajiques, ligados ao atentado há uma semana
Uma semana depois de o ataque terrorista contra o Crocus City Hall, um centro comercial nos arredores de Moscou, deixar 144 mortos e dezenas de feridos, as autoridades russas deram início ao que parece ser uma nova onda de deportações de imigrantes da Ásia Central, ligada diretamente ao atentado. Ao menos quatro dos detidos após o massacre são cidadãos do Tajiquistão, e atos de xenofobia, comuns mesmo antes do ataque, começaram a se multiplicar ao redor da Rússia.
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De acordo com a ONG Primeiro Departamento, que trabalha com imigrantes dentro da Federação Russa, ao menos 64 pessoas foram deportadas a partir do aeroporto Pulkovo, em São Petersburgo, segunda maior cidade da Rússia, desde quinta-feira.
— Ninguém pode chegar perto dos centros de detenção temporária de cidadãos estrangeiros. Há muitos veículos para levar as pessoas ao aeroporto, e há operações em dormitórios e apartamentos. Todos os centros de detenção estão superlotados — disse à ONG um advogado que representa alguns dos estrangeiros detidos, citado pelo portal de notícias Meduza.
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Apesar de oficialmente as autoridades negarem qualquer tipo de ação direcionada, operações similares foram registradas em outras cidades russas, diz a ONG, e o destino dos imigrantes não foi revelado. Na maior parte dos casos, são cidadãos de países da Ásia Central, de onde vem a maior parte dos imigrantes que tentam uma vida melhor no país. Segundo dados de 2022, há quase 3 milhões de pessoas do Uzbequistão e Tajiquistão, muitas vezes submetidas a empregos irregulares com baixos salários e sob ameaça constante de prisão, violência e deportação.
Cidadãos de segunda classe
“Paradoxalmente, a Rússia precisa muito dos imigrantes da Ásia Central. Por um lado, eles oferecem à Rússia uma mão de obra necessária. Por outro, ampliam a dependência desses países da Ásia Central do Kremlin, facilitando a capacidade de Moscou de ampliar sua influência na região”, afirmou, em artigo no Moscow Times, Bektour Iskender, pesquisador e jornalista do Quirguistão. “Mas as políticas da Rússia para a Ásia Central são cheias de contradições. Enquanto as pessoas da região podem facilmente se alocar na Rússia, o Estado russo invariavelmente os relega a um status de cidadãos de segunda classe através da discriminação sistêmica e perfilamento racial.”
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No fim do ano passado, mais de 3 mil estrangeiros foram detidos em uma batida policial em São Petersburgo, sendo que, dos 600 que foram presos por “violações migratórias”,100 acabaram deportados. Entre os detidos estava um homem do Tajiquistão que trabalhava como Papai Noel na hora em que foi abordado. Não raro as autoridades russas mencionam a presença de alguns tajiques em atentados cometidos por grupos extremistas como o Estado Islâmico, incluindo contra o Crocus City Hall e no que deixou quase 100 mortos em Kerman, no Irã, em janeiro.
Nesta sexta-feira, o serviço de segurança russo afirmou que prendeu três pessoas procedentes de um país da Ásia Central suspeitas de planejar um atentado com explosivos no sul da Rússia. Aliadas às detenções ligadas ao atentado da semana passada, as operações servem para incendiar ainda mais o sentimento xenófobo. Em relatos a jornalistas do projeto Migrant Media, alguns estrangeiros já relataram uma maior vigilância por parte das autoridades, além de agressões direcionadas.
— Fomos detidos e levados à delegacia. Eles tiraram impressões digitais, verificaram nossos passaportes, tiraram fotos, analisaram todos os números do meu telefone, todo mundo com quem falei — disse o uzbeque Shukhrat, afirmando que, após 10 horas, ele foi solto com alguns de seus compatriotas, mas que os tajiques ficaram para trás. — Eles os agarraram e espancaram com cassetetes. Um deles disse: “Eles nos bateram, a perna dele está doendo”. Mas isso não aconteceu com os uzbeques, eles apenas falaram rudemente e nos insultaram.
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Denúncias de violência
Segundo a Radio Ozodi, financiada pelo governo dos EUA, há denúncias de violência ligada à xenofobia em várias cidades russas desde o atentado da semana passada. Em Blagoveshchensk, na Sibéria, um galpão mantido por imigrantes foi incendiado, e o prefeito da cidade disse que foi um ato “obviamente” realizado por motivos étnicos. Em Kaluga, três tajiques foram espancados na rua. Motoristas de táxi também relatam cancelamento de corridas pelos passageiros após descobrirem suas nacionalidades.
"Olá, qual sua nacionalidade? Se for do Tajiquistão, pode cancelar a viagem", diz uma mensagem de um passageiro a um motorista de um serviço de táxi, publicada na terça-feira por uma página de notícias de Novosibirsk, na Sibéria. E há prisões de pessoas cujos paradeiros são desconhecidos.
— Eles estavam reformando apartamentos, meu filho é o único ganha-pão da família. Nós sabemos que eles foram detidos juntamente com vários outros tajiques. Não sabemos para onde foram levados ou o que aconteceu com eles — afirmou um homem que vive no Tajiquistão, referindo-se a dois irmãos e ao filho que foram presos na Rússia.
À Radio Ozodi, muitos tajiques afirmaram que querem voltar a seu país apesar de todas as dificuldades econômicas e políticas. Contudo, muitos já obtiveram a cidadania russa e querem permanecer mesmo diante de tantas dificuldades — um possível êxodo também poderia ter efeitos catastróficos ao Tajiquistão: segundo o Banco Mundial, 48% do PIB do país correspondem ao envio de dinheiro por parte de seus cidadãos no exterior, com uma parcela considerável vinda da Rússia.
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