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Pioneiro dos psicodélicos prevê mundo 'sem trauma' com uso terapêutico do MDMA; entenda
O pesquisador Rick Doblin aguarda da FDA a aprovação de seu tratamento com o psicodélico

Rick Doblin fundou há 38 anos a Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos, que deve ser a primeira a ter um tratamento assistido com MDMA aprovado nos EUA. Para ele, a psicodelia é uma saída também tratar traumas coletivos
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A terapia com psicodélicos não elimina o trauma, mas pode ajudar na abordagem social para o problema e também na prevenção dos efeitos incapacitantes gerados por experiências humanas perturbadoras. É com essa premissa que o pesquisador e ativista Rick Doblin levou ao South By Southwest, maior festival de inovação do mundo, a previsão provocativa de que criar "um mundo sem trauma" até 2070.
A previsão ambiciosa não pressupõe o fim de eventos perturbadores ao redor do globo, é claro, e nem a eliminação de seus efeitos sobre o ser humano. Mas seria uma saída para que o trauma, como conhecemos, fosse significativamente mitigado com ajuda de terapias com o MDMA. É o que ele chama de "Net Zero Trauma" - termo que é uma adaptação das metas climáticas envolvidas no "Net Zero", que preveem o equilíbrio entre a quantidade de poluentes emitida com a quantidade removida.
— O "Net Zero Trauma" não significa que não haverá trauma, mas que não estamos adicionando novas camadas de fardo ao trauma existente.— pontua Doblin — A abordagem terapêutica com o MDMA ajuda a reduzir o medo das memórias. As pessoas passam a ser capazes de processar o medo de uma maneira diferente e mais produtiva.
Psicodélicos para tratar o trauma
Rick Doblin fundou a Associação Multidisciplinar de Estudos Psicodélicos (MAPS), nos Estados Unidos, em 1986, um período em que substâncias como MDMA e LSD já eram alvo da repressiva política americana de guerra às drogas. O pesquisador e ativista foi um dos principais nomes do South by Southwest na programação dedicada aos psicodélicos, e deu detalhes sobre os resultados de sua principal pesquisa sobre o MDMA.
No SXSW, Doblin destacou a possibilidade de uso terapêutico do MDMA voltado para grupos que sofrem com traumas coletivos, como veteranos de guerra, refugiados deslocados pelo clima e civis atingidos por conflitos armados e falou de uma abordagem do MAPS para "saúde mental em massa". Em seu vislumbre do futuro pós "renascença psicodélica", o pesquisador citou ainda a criação de um indicador que pudesse mensurar o trauma de maneira coletiva.
— O que propomos não é que o MDMA seja remédio para as pessoas tomarem em casa ou para se tratarem depois de uma consulta por telemedicina. É uma abordagem com feita em sala, com terapeutas. Até porque os psicodélicos são ferramentas, eles não são necessariamente terapêuticos por si só. É tudo uma questão de como eles são usados.
Aprovação no FDA
Há quase quatro décadas, Doblin estuda as possibilidades de uso terapêutico do MDMA. Com o MAPS e o seu braço farmacêutico, a Lykos, ele submeteu em dezembro do ano passado ao Food and Drug Administration (FDA, equivalente à Anvisa no Brasil) os resultados de um estudo clínico de fase 3, com testes em grupos de controle, em que o psicodélico é usado no tratamento para Transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). A expectativa é que a terapia seja aprovada até agosto, que faria a primeira terapia assistida com MDMA com crivo da agência:
— É quando o FDA irá nos dizer se aprova ou não o medicamento para uso sob prescrição médica. Esperamos no final deste ano ou no início do próximo as prescrições para uso terapêutico de MDMA com terapia assistida possam começar nos EUA — afirmou o doutor em Políticas Públicas pela Kennedy School of Government de Harvard, no SXSW.
Esse seria o passo mais importante dado pelo FDA em direção à medicina psicodélica desde a aprovação do uso da cetamina, em 2019, para o tratamento de depressão. Em junho, diante da explosão de pesquisas sobre uso terapêutico de psicodélicos, a agência publicou um documento com diretrizes para a realização de ensaios clínicos para esses medicamentos. Semanas depois, a Austrália se tornou o primeiro país do mundo a aprovar o uso terapêutico de psicodélicos, com a psilocibina.
Terapia psicodélica na guerra
O tratamento submetido pela Lykos prevê 42 horas de sessões terapêuticas, incluindo três sessões de terapia assistida por MDMA de oito horas cada.Há também sessões de psicoterapia não medicamentosa antes e depois das sessões de MDMA Os resultados submetidos ao FDA indicam que 67% dos participantes da fase 3 tiveram melhora significativa a ponto de não serem mais considerados como tendo estresse pós-traumático.
Estudos com o uso de psicodélicos já têm chegado também à parte dos grupos que Doblin vislumbra como possíveis beneficiários de um mundo com "net zero trauma".
No início deste ano, o Departamento de Assuntos de Veteranos dos Estados Unidos (VA, na sigla em inglês) aprovou o financiamento para que pesquisadores do órgão estudem o uso psicodélicos para o tratamento do transtorno de estresse pós-traumático (TEPT) e depressão. Em fevereiro, uma comissão parlamentar especial da Ucrânia, responsável pelo cuidado médico de veteranos e soldados, aprovou a criação de um grupo para avaliar a a eficácia da terapia assistida por MDMA no TEPT. Desde 2021, ao menos dois grupos de pesquisadores trabalharam com israelenses e palestinos com aplicação de MDMA e ayahuasca.
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