Política

MPF recomenda ao governo a reinstalação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos em prazo de 60 dias

A comissão, extinta no fim de 2022, foi criada com o objetivo de reconhecer e localizar mortos e desaparecidos pelo regime militar

Agência O Globo - 07/03/2024
MPF recomenda ao governo a reinstalação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos em prazo de 60 dias
MPF - Foto: Antonio Augusto/Secom/MPF

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou ao governo federal a reinstalação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos (CEMDP) no prazo máximo de 60 dias. A solicitação foi enviada diretamente ao Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. A comissão foi criada em 1995 e extinta no final de 2022, no fim do governo de Jair Bolsonaro (PL), e trata de desaparecimentos e mortes de pessoas por suas atividades políticas no período da Ditadura Militar.

O MPF defende que os trabalhos da Comissão devem prosseguir para possibilitar a execução das condenações impostas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) ao Brasil, como no caso do julgamento do caso Gomes Lund, da Guerrilha do Araguaia, no qual o Estado brasileiro foi obrigado a "realizar esforços para determinar o paradeiro das vítimas, e identificar e entregar os restos mortais a seus familiares".

A condenação no caso Vladimir Herzog é outro exemplo. A Corte estabeleceu que o Brasil deve adotar medidas para reconhecer que as ações de crimes contra a humanidade e internacionais não possam prescrever, o que impediria a condenação dos responsáveis.

O documento recomenda a continuidade dos trabalhos especialmente em relação ao reconhecimento de vítimas, busca de restos mortais e registros de óbito. A orientação é de que sejam destinados recursos humanos e financeiros para o adequado funcionamento da comissão, além de medidas que garantam a permanência da instância colegiada até que todas suas competências legais sejam finalizadas.

Para o MPF, a extinção da comissão ocorreu de forma prematura, pois ainda existem casos pendentes que precisam de medidas administrativas, como reconhecimento de vítimas e registros de óbito. Nessas pendências estão incluídos os casos dos desaparecimentos na Guerrilha do Araguaia, na Vala Perus e no Cemitério Ricardo Albuquerque.

O governo é acusado de colocar em banho-maria a recriação da comissão. Desde março de 2023, Lula tem pronta uma minuta de decreto para reinstalar o colegiado, mas ainda não bateu o martelo sobre quando isso ocorrerá. A questão enfrenta forte resistência nas Forças Armadas, ao ponto de o presidente do Superior Tribunal Militar (STM), Joseli Parente Camelo, declarar que o retorno do colegiado é “completamente desnecessário” e falar que não se pode “olhar o país pelo retrovisor”.

No fim do ano passado, o ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, respondeu ao comentário de Camelo, afirmando que “os trabalhos da comissão não foram finalizados”.

— Diversas famílias ainda aguardam respostas sobre o destino de seus entes desaparecidos. Desnecessário é achar que podemos virar a página da história de um passado de dor, simplesmente varrendo a ‘sujeira’ para debaixo do tapete — afirmou Almeida.

A criação e as atribuições da CEMDP estão previstas na Lei 9.140/95. Para o MPF, além de ferir a norma criadora da comissão, a extinção do grupo também descumpre as recomendações do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade (CNV). Entre as medidas descritas no relatório estão a retificação da anotação da causa morte no registro de óbito de pessoas mortas em decorrência de graves violações de direitos humanos, além do prosseguimento de atividades voltadas à localização, identificação e entrega aos familiares dos restos mortais dos desaparecidos políticos.

Em 2014, a Comissão Nacional da Verdade registrou 191 mortos e o desaparecimento de 210 pessoas durante a ditadura. Outros 33 desaparecidos tiveram seus corpos localizados posteriormente, totalizando 434 pessoas.