Internacional
Após quase 20 mil prisões em atos contra a guerra, porta-voz do Kremlin diz que Rússia tem a 'melhor democracia'
Dmitry Peskov afirmou que 'não vai tolerar' críticas à democracia russa, no momento em que organizações de defesa dos direitos humanos apontam para aumento da repressão
O secretário de Imprensa do Kremlin, Dmitry Peskov, afirmou nesta quarta-feira que a Rússia "tem a melhor democracia", e que não vai mais tolerar críticas a ela. As declarações vêm às vésperas da eleição presidencial na Rússia, na qual Vladimir Putin deve se eleger pela quinta vez desde 2000, e em meio a uma onda de prisões relacionadas à guerra e a vozes dissonantes do governo.
— Não vamos mais tolerar críticas à nossa democracia e acusações de que ela não é do tipo que deveria ser — disse Peskov durante o Festival Mundial da Juventude, realizado na região de Krasnodar (Sul). — Nossa democracia é a melhor, e nós continuaremos a construí-la.
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As palavras de Peskov vieram pouco mais de uma semana antes da abertura das seções eleitorais ao redor da Rússia para a votação que deve dar a Vladimir Putin seu quinto mandato presidencial desde 2000 (sem contar o período que, por limitações constitucionais, comandou na prática o país com o cargo de primeiro-ministro). Apenas quatro candidatos, incluindo Putin, foram autorizados, e nomes de oposição, como Yekaterina Duntsova e Boris Nadejdin, foram vetados por alegações de falhas na apresentação de documentos e assinaturas de apoio, um enredo conhecido das votações na Rússia.
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Desde o começo da década passada, quando eclodiram protestos contra o governo e contra fraudes eleitorais nas eleições de 2012, o Kremlin tem adotado uma postura mais dura do que a de hábito contra vozes dissonantes. Políticos de oposição, como Boris Nemtsov e Alexei Navalny, visitaram tribunais com certa frequência, e acabaram mortos em circunstâncias até hoje nebulosas — Nemtsov em 2015, a poucos metros do Kremlin, e Navalny no mês passado, em uma prisão no Ártico. Leis para criminalizar empresas de mídia, organizações de defesa dos direitos humanos e de minorias vulneráveis levaram ao fechamento de centenas delas, e à prisão de alguns de seus responsáveis.
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Com a invasão russa da Ucrânia, protestos contra a guerra foram duramente reprimidos e seus participantes presos em grandes números — segundo a ONG OVD-Info, que monitora abusos cometidos dentro da Federação Russa pelas autoridades, desde 24 de fevereiro de 2022 foram realizadas 19.855 detenções por "postura antiguerra", e quase 900 pessoas estão sendo processadas por crimes como "desacreditar as Forças Armadas", que podem levar a penas pesadas.
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No mesmo dia em que Peskov fazia elogios à democracia russa, a viúva de Alexey Navalny, Yulia Navalnaya, lançou um vídeo incentivando os russos a irem às urnas ao meio-dia, no domingo, como forma de protesto contra Vladimir Putin. O "Meio-Dia Contra Putin" foi uma das últimas convocações feitas por Navalny antes de morrer, e tem o objetivo de tumultuar o processo eleitoral.
— É uma ação muito simples e segura, não pode ser proibida, e vamos ajudar milhões de pessoas que pensam de maneira semelhante a perceberem que não estão sós. Estamos cercados por pessoas que também são contra a guerra, a corrupção e a impunidade — disse Navalnaya no vídeo. — Olhando para vocês, estou convencida de que nada é em vão, e esse pensamento me dá força. Agora eu sei que somos muitos, todos que amam e apoiam Alexei, que compartilham de suas ideias, e enquanto nos amarmos, não está terminado.
Na semana passada, longas filas se formaram no cemitério onde Alexei Navalny foi enterrado, em Moscou, e memoriais foram montados na capital russa e em cidades ao redor do país, mesmo diante do risco de prisões, que ocorreram, mas em número considerado pequeno. Resta saber se Putin tomará alguma medida para impedir os atos no dia de uma eleição que, para o Kremlin, servirá como um sinal de força e de apoio dentro da Federação Russa.
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